Direito empresárial

Títulos de Crédito: o guia prático das características essenciais

O que são títulos de crédito: características essenciais

Os títulos de crédito são documentos (hoje também em forma eletrônica) que incorporam um direito literal e autônomo de receber determinada quantia em dinheiro em favor de alguém. Eles servem para facilitar a circulação do crédito, permitindo que um direito de receber seja transferido com rapidez, segurança e previsibilidade. No Brasil, a matéria é regida por diversas leis especiais — como a Lei Uniforme de Genebra (promulgada pelo Decreto nº 57.663/1966, aplicável à letra de câmbio e à nota promissória), a Lei do Cheque (Lei nº 7.357/1985), a Lei da Duplicata (Lei nº 5.474/1968, com a duplicata escritural pela Lei nº 13.775/2018), entre outras.

Essência em uma frase: um título de crédito transforma uma promessa/ordem de pagar em um papel (ou registro eletrônico) com valor próprio, capaz de circular e ser cobrado com rito mais rápido, desde que respeitados seus requisitos formais.

Princípios cambiários fundamentais

1) Literalidade

O direito do portador é exatamente o que está escrito no título: valor, vencimento, local e demais declarações. O que não constar do documento (ou do registro eletrônico) não integra o direito exigível.

2) Autonomia (ou independência das obrigações)

Cada assinatura gera uma obrigação própria e autônoma. Assim, quem endossa ou avaliza responde independentemente das relações entre os demais signatários. A autonomia viabiliza a circulação segura: quem adquire o título não precisa investigar toda a cadeia anterior.

3) Abstração

Após emitido e posto em circulação, o título tende a desvincular-se da causa (contrato subjacente). Em regra, o devedor não pode opor ao portador de boa-fé defesas baseadas em problemas do negócio original (são as chamadas exceções pessoais). Há espécies menos abstratas, como a duplicata, que mantém ligação com a compra e venda ou prestação de serviços — mas, ainda assim, preserva a lógica de circulação e cobrança rápida.

4) Cartularidade / Materialidade (mitigada na era digital)

Tradicionalmente, o direito está incorporado ao documento: quem detém o título detém o crédito (salvo prova de má-fé). Nos títulos eletrônicos, essa “cartularidade” é substituída por registro escritural em entidade autorizada (registradora/escrituradora), que confere unicidade e legitimidade.

5) Circulação por endosso e tradição

A transferência se dá, via de regra, por endosso (declaração de transferência no próprio título/registro) e tradição (entrega ao novo portador). Pode haver cláusula “não à ordem”, caso em que a cessão segue as regras civis (com mais defesas oponíveis ao cessionário).

6) Legitimidade

Presume-se legítimo o portador de título endossado regularmente (ou, nos eletrônicos, quem consta como titular no sistema). Essa presunção reforça a segurança da circulação.

7) Cambialidade das assinaturas

Cada assinatura (emissor, aceitante, endossante, avalista) é cambial, com presunções e responsabilidades próprias, o que sustenta a executividade e a eficácia do título.

Requisitos essenciais e formais (visão geral)

Cada espécie tem seus requisitos, mas há traços comuns: promessa ou ordem incondicionada de pagar quantia em dinheiro, identificação das partes, vencimento (ou regra de vencimento), local de pagamento, lugar e data de emissão, e assinatura do devedor principal. A ausência de requisito essencial costuma descaracterizar o título ou gerar regras supletivas previstas em lei (por exemplo, se não indicado o lugar de pagamento, valem presunções legais).

Alerta prático: títulos “montados” sem cuidado — valores indeterminados, assinaturas ilegíveis, cláusulas condicionais, alterações sem ressalva — tendem a perder força executiva e exigem vias mais lentas de cobrança.

Espécies principais e seus requisitos

Nota Promissória (promessa de pagar)

  • Promessa pura e simples de pagar quantia determinada.
  • Nome do beneficiário (ou cláusula “ao portador”, se a lei admitir).
  • Vencimento (ou regras legais de vencimento se omisso).
  • Lugar de pagamento e lugar/data de emissão (com presunções legais em caso de lacuna).
  • Assinatura do emitente (de próprio punho ou assinatura eletrônica qualificada, conforme o caso).

Letra de Câmbio (ordem de pagar)

  • Ordem incondicionada do sacador para que o sacado pague ao tomador.
  • Indicação do sacado (quem receberá a ordem) e do tomador.
  • Vencimento, lugar/data de emissão, lugar de pagamento.
  • Assinatura do sacador. A eficácia plena depende do aceite do sacado (assinatura concordando em pagar).

Cheque

  • Ordem de pagamento à vista contra banco sacado.
  • Indicação do banco, data e lugar da emissão, assinatura do emitente.
  • É pagável à vista (não comporta vencimento futuro válido como cambial).
  • Circula por endosso; admite avaliação de fundos pelo banco no momento da apresentação.

Duplicata (mercantil e de serviços) — inclusive escritural

  • Vinculada a compra e venda mercantil ou prestação de serviços.
  • Emissão com base em fatura; pode ser escritural, registrada em entidade autorizada.
  • Possui aceite (expresso ou tácito, conforme hipóteses legais).
  • Circula por endosso e pode ser cobrada por execução (título executivo extrajudicial, nos termos do CPC).
Quadro rápido — quem “promete” e quem “ordena”?

  • Nota promissória: o emitente promete pagar ao beneficiário.
  • Letra de câmbio: o sacador ordena ao sacado que pague ao tomador; o sacado se torna devedor principal ao aceitar.
  • Cheque: o correntista ordena ao banco o pagamento à vista.
  • Duplicata: o vendedor/prestador emite com base na fatura e o comprador/contratante aceita.

Circulação: endosso, cláusulas e riscos

Endosso

É a declaração, normalmente no verso, transferindo a titularidade do título. Pode ser:

  • Em branco: sem indicar o novo beneficiário; basta a tradição para transferir.
  • Em preto: indica o nome do endossatário (mais seguro para a cadeia).
  • Mandato: confere poderes de cobrança, sem transferir a titularidade.
  • Caução: dá o título em garantia.

Se constar a cláusula “não à ordem”, a transferência ocorrerá por cessão civil, permitindo ao devedor opor ao cessionário defesas que teria contra o cedente (perde-se a proteção típica do endosso).

Aval

É a garantia cambial autônoma. O avalista responde como coobrigado, normalmente de forma solidária, e sua obrigação é independente da do avalizado. Exige assinatura e indicação de quem está sendo avalizado (na dúvida, vale como aval ao devedor principal). Diferencia-se da fiança (que é acessória e sujeita às exceções do contrato principal).

Títulos eletrônicos e a “desmaterialização”

A prática já consagrou várias espécies em formato eletrônico: duplicata escritural, CPR/CRA/CRI em sistemas autorizados, CCB digital com assinaturas eletrônicas. Nesses casos, a “cartularidade” é substituída por registro em entidade escrituradora/registradora, que controla a unicidade, os endossos eletrônicos e a legitimação do portador. Os princípios da literalidade, autonomia e circulação permanecem — apenas o suporte mudou.

Boas práticas no eletrônico: utilizar assinatura eletrônica qualificada quando exigida, registrar imediatamente a emissão e os endossos, e guardar logs e certificados para fins de prova e executividade.

Apresentação, protesto e cobrança

Apresentação

O título deve ser apresentado ao pagamento conforme os prazos de sua lei específica (ex.: cheque tem prazos curtos de apresentação conforme praça). O descumprimento pode afetar direitos de regresso contra endossantes e avalistas.

Protesto

O protesto é o ato formal, feito em cartório, que comprova o não pagamento ou a falta de aceite. Ele preserva direitos de regresso e reforça a prova do inadimplemento. Em algumas hipóteses, admite-se comunicação equivalente (p. ex., para duplicata eletrônica), conforme a lei da espécie.

Prazo prescricional (panorama objetivo)

  • Letra de câmbio/nota promissória: regra clássica da LUG: ação contra o devedor principal em até 3 anos do vencimento; contra sacador/ endossantes em prazos menores (em geral, 1 ano do protesto ou vencimento).
  • Cheque: 6 meses contados do término do prazo de apresentação, para ação cambial contra o emitente e endossantes; depois, pode subsistir ação de enriquecimento (prazo civil).
  • Duplicata: usualmente 3 anos para a ação executiva (contados do vencimento), observadas as regras específicas e a jurisprudência.

Importante: prazos podem sofrer interpretações específicas e interferência do Código Civil e de leis especiais; o controle de datas (emissão, apresentação, protesto) é crítico.

Via de cobrança

Atendidos os requisitos, os títulos são títulos executivos extrajudiciais (CPC, art. 784, I e outros incisos), permitindo a execução direta (penhora) sem fase cognitiva plena. Em títulos eletrônicos, a executividade costuma ser comprovada por certidões/relatórios da registradora/escrituradora.

Exceções oponíveis: o que o devedor pode alegar?

Em linha com a autonomia e abstração, o devedor pode opor ao portador de boa-fé apenas as chamadas exceções reais (nulidades do próprio título: falsidade, falta de requisito essencial, incapacidade absoluta, assinatura falsificada, pagamento já realizado ao portador legítimo etc.). As exceções pessoais (vícios do contrato subjacente: defeito do produto, inadimplemento de contraprestação) não alcançam o portador de boa-fé — salvo títulos causalizados, como a duplicata, em que a prova de inexistência da causa pode ser admitida contra todos, sem prejuízo da proteção de terceiros de boa-fé nos registros eletrônicos.

Riscos práticos e cuidados na emissão

  • Evite condições (pagamento “se” acontecer algo). Título deve conter ordem/promessa incondicionada.
  • Preencha integralmente (valor numérico e por extenso, datas, local, identificação). Rasuras exigem ressalva firmada pelo signatário.
  • Controle de prazos de apresentação, protesto e prescrição.
  • Endossos encadeados e legíveis; prefira endosso em preto quando quiser mais rastreabilidade.
  • Em duplicata, mantenha lastro (nota fiscal, comprovante de entrega/serviço) e, se escritural, registre eventos (aceite, endosso, pagamentos) no sistema.
  • Para aval, identifique o avalizado e colete assinatura válida do avalista; evite confundir com fiança.
Erros que tiram a força executiva: valor ilíquido/indeterminado; ausência de assinatura do devedor principal; condição suspensiva; títulos “ad futurum” (ex.: cheque pós-datado como cambial); endosso ou aval por pessoa sem poderes.

Quadro informativo — comparação rápida

Espécie Natureza Ponto-chave Circulação Cobrança
Nota promissória Promessa de pagar Devedor principal é o emitente Endosso + tradição Execução (CPC), prescrição cambial própria
Letra de câmbio Ordem de pagar Depende de aceite do sacado Endosso + tradição Execução; protesto preserva regresso
Cheque Ordem à vista contra banco Pagável à vista; prazos curtos Endosso Execução; prescrição de 6 meses
Duplicata Causal (venda/serviço) Pode ser escritural; aceite expresso/tácito Endosso (ou cessão, se “não à ordem”) Execução com lastro/protesto

Como escolher e usar a espécie certa

  • Vendas a prazo: duplicata (mercantil/serviços), preferindo a modalidade escritural para reduzir fraudes e facilitar endossos e protestos eletrônicos.
  • Financiamentos e contratos bilaterais: nota promissória (ou CCB no sistema financeiro), com eventuais avales adicionais.
  • Operações comerciais com aceite de terceiro: letra de câmbio pode ser útil para estruturar a obrigação do sacado.
  • Pagamentos à vista/rotina: cheque perdeu espaço para meios eletrônicos, mas ainda existe em nichos e para fins de garantia (com cautela quanto à executividade).

Conclusão

Títulos de crédito são ferramentas jurídicas desenhadas para dar liquidez e segurança às relações econômicas. Seus pilares — literalidade, autonomia, abstração, cartularidade/materialidade e circulação — criam um regime que presume a validade do que está no documento/registro e protege o portador de boa-fé. Em contrapartida, exigem formalismo: requisitos bem preenchidos, assinaturas válidas, observância de prazos de apresentação/protesto e cadeia de endossos clara.

Na prática, quem emite ou recebe um título deve: (i) escolher a espécie adequada ao negócio; (ii) preencher corretamente todos os campos essenciais; (iii) documentar a causa (especialmente nas espécies causalizadas, como a duplicata); (iv) controlar prazos de apresentação, protesto e prescrição; e (v) em títulos eletrônicos, registrar e atualizar os eventos na entidade competente. Feito isso, o título cumpre sua vocação: facilitar o crédito, reduzir riscos e permitir cobrança célere quando necessário.

PRE-FAQ — Títulos de Crédito: guia rápido antes das perguntas

Use este guia para entender, em poucos minutos, o que são títulos de crédito, por que eles existem e como utilizá-los com segurança. Depois, você parte para a FAQ detalhada.

1) Conceito essencial em 1 linha

Título de crédito é um documento (ou registro eletrônico) que incorpora um direito literal e autônomo de receber quantia em dinheiro, com circulação rápida por endosso e cobrança mais célere.

2) Por que usar (benefícios práticos)

  • Liquidez: facilita antecipação/cessão do recebível.
  • Segurança jurídica: regime próprio de cobrança (título executivo extrajudicial).
  • Padronização: requisitos claros reduzem litígios.
  • Circulação: transferência simples por endosso (salvo “não à ordem”).

3) Princípios que mandam no jogo

  • Literalidade: vale o que está escrito no título/registro.
  • Autonomia: cada assinatura cria obrigação própria.
  • Abstração: a causa do negócio não atinge o portador de boa-fé (com ressalvas na duplicata).
  • Cartularidade/Materialidade: posse do documento ou titularidade no registro escritural legitima a cobrança.

4) Espécies mais usadas (quando escolher cada uma)

  • Nota Promissória: promessa direta de pagar — comum em financiamentos e ajustes bilaterais.
  • Letra de Câmbio: ordem para terceiro pagar — útil quando há aceite do sacado.
  • Cheque: ordem à vista contra banco — hoje residual; atenção a prazos curtíssimos.
  • Duplicata (mercantil/serviços): vinculada à fatura; pode ser escritural, com fluxo 100% digital.

5) Checklist de validade (não pule nada)

  • Valor certo (numérico e, preferencialmente, por extenso).
  • Data e lugar de emissão; lugar de pagamento e vencimento (ou regras legais).
  • Identificação das partes (emitente/sacado/beneficiário).
  • Assinatura válida do devedor principal (ou assinatura eletrônica exigida para o título eletrônico).
  • Sem condições (“pago se acontecer X”) e sem rasuras não ressalvadas.

6) Como circula

Pelo endosso (em branco ou em preto) + tradição. Com a cláusula “não à ordem”, a transferência vira cessão civil (devedor pode opor mais defesas).

7) Garantia cambial

Use aval (não confundir com fiança). O avalista responde de forma autônoma e, em regra, solidária com o avalizado.

8) Prazos que doem no bolso

  • Apresentação: varia por espécie (cheque é curtíssimo).
  • Protesto: preserva direito de regresso contra endossantes/avalistas.
  • Prescrição: regra geral entre 6 meses (cheque) e 3 anos (duplicata/nota promissória/ação contra devedor principal), observadas as leis específicas.

9) Erros que derrubam a executividade

  • Condição suspensiva no texto; valor ilíquido.
  • Falta de assinatura do devedor principal.
  • Rasuras sem ressalva; lacunas essenciais.
  • Perda de prazos de apresentação/protesto.

10) Títulos eletrônicos (o novo normal)

Preferir a emissão escritural quando disponível (p. ex., duplicata). Registre emissão, endossos e pagamentos na registradora/escrituradora; utilize assinatura eletrônica qualificada quando exigida; guarde logs/certidões para execução.

11) Documentos de apoio para a cobrança

  • Original do título ou certidão eletrônica da registradora.
  • Comprovantes da causa (fatura, entrega, contrato) — especialmente na duplicata.
  • Instrumentos de protesto e notificações.

12) Quando chamar um advogado

Na montagem do modelo padrão da empresa, em operações grandes (com aval/garantias cruzadas), diante de inadimplemento relevante, necessidade de protesto e para execução imediata.

Resumo executivo: preencha bem, controle prazos, endosse corretamente e, no eletrônico, mantenha o registro sempre atualizado. Assim, o título entrega o que promete: crédito que circula e cobra rápido.

FAQ — Títulos de Crédito (características essenciais)

1) O que é um título de crédito?

É um documento (ou registro eletrônico) que incorpora um direito literal e autônomo de receber quantia em dinheiro. A posse/titularidade legitima a cobrança e a circulação é simplificada por endosso. Em regra, é título executivo extrajudicial, permitindo execução mais rápida.

2) Quais são os princípios que regem?
  • Literalidade: vale o que está escrito/registrado.
  • Autonomia: cada assinatura cria obrigação própria.
  • Cartularidade/Materialidade: documento/registro legitima o crédito.
  • Abstração: a causa do negócio não atinge o portador de boa-fé (com ressalvas, p.ex., duplicata).
3) Quais as espécies mais comuns e quando usar?
  • Nota Promissória: promessa direta de pagar; típica em financiamentos e ajustes bilaterais.
  • Letra de Câmbio: ordem para terceiro pagar; exige aceite do sacado.
  • Cheque: ordem à vista contra banco; uso mais restrito hoje, prazos curtíssimos.
  • Duplicata (mercantil/serviços): vinculada à fatura; pode ser escritural (100% digital).
  • Cédulas de crédito (rural, industrial, bancária etc.): títulos com regime próprio de garantias e circulação.
4) Quais são os requisitos essenciais de validade?
  • Valor certo (numérico e, preferencialmente, por extenso).
  • Data e lugar de emissão; vencimento e lugar de pagamento.
  • Identificação das partes (emitente/sacado/beneficiário).
  • Assinatura válida do devedor principal (ou assinatura eletrônica qualificada no eletrônico).
  • Ausência de condições (“pago se X acontecer”) e de rasuras não ressalvadas.
  • No eletrônico: emissão e circulação registradas em entidade autorizada.
5) Como funciona a circulação (endosso)?

Transfere-se por endosso (em branco ou em preto) + tradição/registro. O endosso pode ser:

  • Translativo: transfere a titularidade.
  • Mandato: outorga poderes para cobrança.
  • Caução: garante outra obrigação.

Se o título contiver “não à ordem”, a transferência será por cessão civil (o devedor pode opor mais defesas).

6) O que é aval e como difere de fiança?

Aval é garantia cambial: o avalista responde de forma autônoma e, via de regra, solidária com o avalizado, sem benefícios de ordem típicos da fiança. Deve indicar o avalizado e conter assinatura válida (no eletrônico, assinatura qualificada/registro).

7) Protesto: quando é necessário e para quê?

O protesto comprova o inadimplemento e preserva o direito de regresso contra endossantes/avalistas. Na duplicata admite-se protesto por indicação (sem apresentação física). Pode ser eletrônico e convém observar prazos de apresentação de cada espécie.

8) Quais são os prazos de apresentação e prescrição?
  • Cheque: apresentação 30 dias (mesma praça) ou 60 dias (praças distintas); prescrição 6 meses contra emitente/avalista a contar do fim do prazo de apresentação.
  • Nota Promissória / Letra: em regra, 3 anos contra devedor principal contados do vencimento; prazos regressivos menores contra endossantes/sacador.
  • Duplicata: cobrança em 3 anos a partir do vencimento (regra geral aplicada pela jurisprudência).

Perder prazos pode extinguir a execução cambial, restando vias comuns (monitória/cobrança).

9) Como executar judicialmente um título?

Títulos de crédito são, em regra, títulos executivos extrajudiciais. Junte o original (ou certidão eletrônica do registro), comprovantes pertinentes (p.ex., fatura na duplicata) e eventual protesto. Perdeu o original? Em muitos casos cabe ação monitória com prova escrita.

10) Quais erros comuns tiram a força executiva?
  • Falta de assinatura do devedor principal.
  • Condição no texto (“pago se…”), tornando o valor ilíquido.
  • Rasuras ou divergência entre valor numérico e por extenso sem ressalva.
  • Endosso/aval com vícios formais ou ausência de registro no eletrônico.
  • Perda de prazos de apresentação/protesto/prescrição.

Bases legais usuais: Código Civil (arts. 887–926); Decreto n.º 57.663/1966 (LUG – letra/nota); Lei n.º 7.357/1985 (cheque); Lei n.º 5.474/1968 e Lei n.º 13.775/2018 (duplicata e duplicata escritural); Lei n.º 9.492/1997 (protesto); CPC, art. 784 (títulos executivos). Este material é educativo e não substitui análise jurídica do caso concreto.

Fundamentação técnica — Títulos de crédito e suas características essenciais

1) Conceito jurídico e natureza

Os títulos de crédito são instrumentos que incorporam um direito de crédito e permitem sua circulação com segurança e simplicidade. A doutrina e a legislação brasileira consagram os princípios da literalidade (vale o que está no título/registro), autonomia (cada assinatura cria obrigação própria) e materialidade/cartularidade (a posse do documento — ou do registro escritural equivalente — legitima a cobrança). Em regra, configuram títulos executivos extrajudiciais, aptos à execução imediata.

2) Fontes legais essenciais (núcleo normativo)

  • Código Civil, arts. 887 a 926 — disposições gerais sobre títulos de crédito (conceito, circulação, endosso, aval, prescrição etc.).
  • LUG (Lei Uniforme de Genebra — Decreto n.º 57.663/1966) — letra de câmbio e nota promissória (emitidas ou aceitas no Brasil).
  • Lei do Cheque (Lei n.º 7.357/1985) — regime próprio, prazos de apresentação e prescrição.
  • Lei da Duplicata (Lei n.º 5.474/1968) e Lei n.º 13.775/2018 — duplicata escritural (emissão, circulação e protesto eletrônicos).
  • Lei do Protesto (Lei n.º 9.492/1997) — procedimentos de protesto, inclusive eletrônico e por indicação.
  • CPC, art. 784 — enumeração dos títulos executivos extrajudiciais.
  • Lei n.º 10.931/2004Cédula de Crédito Bancário (CCB) e outras garantias reais/fidejussórias correlatas.
  • Decreto-Lei n.º 167/1967Cédulas de Crédito Rural e notas de crédito rural.
  • Decreto-Lei n.º 413/1969 e Lei n.º 6.840/1980Cédula de Crédito Industrial e Comercial (regimes específicos).
Ideia-força: a força executiva nasce do próprio título (ou do registro escritural) e de seus requisitos formais. Quanto mais “abstrato” o título (v.g., nota promissória), menor a interferência da causa debendi contra o portador de boa-fé.

3) Requisitos formais e vícios que comprometem a executividade

  • Valor expresso (preferencialmente numérico e por extenso, prevalecendo o por extenso em divergência).
  • Data e lugar de emissão; vencimento e lugar de pagamento (supríveis conforme a lei da espécie).
  • Identificação das partes (emitente/sacador, sacado/aceitante, beneficiário/portador).
  • Assinatura válida do devedor principal (ou assinatura eletrônica qualificada nos títulos escriturais, com registro em entidade autorizada).
  • Ausência de condições (“pago se…”) — torna a obrigação ilíquida e atinge a executividade.
  • Endosso e aval com forma legal; apontar o avalizado e observar as regras da espécie.

Vícios materiais (rasuras não ressalvadas, valor ilíquido, ausência de assinatura do devedor principal, emissão por quem não detém representação) usualmente inviabilizam a execução cambial, restando a via comum (ação de cobrança/monitória).

4) Circulação e garantias — endosso, cessão e aval

O crédito circula por endosso (em branco ou em preto) e tradição, com variações: translativo (transfere a titularidade), mandato (apenas poderes de cobrança) e caução (garantia). Se o título trouxer a cláusula “não à ordem”, sua transferência se dá por cessão civil, sujeita a defesas oponíveis ao cedente.

O aval é garantia cambial autônoma, em regra solidária e sem benefício de ordem, distinta da fiança civil. No meio eletrônico, o aval deve constar do próprio registro escritural com assinatura eletrônica válida segundo a lei aplicável.

5) Protesto e conservação dos direitos de regresso

O protesto tem dupla função: comprovar o inadimplemento e preservar o direito de regresso contra endossantes/avalistas. Em duplicatas, admite-se o protesto por indicação e, na modalidade escritural, o protesto eletrônico. A ausência de protesto dentro dos prazos legais pode não afetar a ação contra o devedor principal, mas prejudica o regresso contra coobrigados de circulação.

6) Prazos de apresentação e prescrição (síntese prática)

Espécie Apresentação Prescrição (regra) Observações
Cheque 30 dias (mesma praça) / 60 dias (praças diversas) 6 meses do término do prazo de apresentação Execução contra emitente/avalista; regras específicas para banco sacado.
Nota promissória Conforme vencimento 3 anos contra devedor principal (do vencimento) Prazos regressivos menores para endossantes e avalistas.
Letra de câmbio Exige aceite do sacado 3 anos contra aceitante (do vencimento) Regra LUG; prazos regressivos se contam do protesto.
Duplicata (mercantil/serviços) Apresentação para aceite; protesto por indicação possível 3 anos do vencimento (regra aplicada pela jurisprudência) Sem aceite: executável com comprovação de entrega e protesto.
CCB / Cédulas Conforme título/registro Prazos do CC e leis especiais Titularidade e garantias constam do registro.

7) Duplicata escritural e desmaterialização

A Lei n.º 13.775/2018 instituiu a duplicata escritural, emitida, aceita, endossada e protestada em ambiente eletrônico por entidades registradoras autorizadas. Nessa modalidade, a cartularidade é substituída pelo registro, que cumpre função de publicidade e unicidade do crédito (evita duplicidades, facilita a verificação de ônus e restrições). A execução passa a admitir certidão eletrônica do registro como prova do título, dispensando-se o papel.

8) Colisão com a relação de consumo e exceções oponíveis

Embora títulos sejam regidos por princípios cambiais, situações envolvendo consumidores e má-fé do credor podem autorizar controle judicial (v.g., abusividade de encargos na CCB; vício na entrega de mercadorias em duplicata). Entre empresários, prevalece a abstração e a proteção ao terceiro de boa-fé; já nas relações com consumidores, o exame da causa debendi é mais permeável, sem desnaturar a literalidade do título contra coobrigados de circulação.

9) Execução, monitória e estratégias probatórias

  • Execução cambial: junte o original (ou certidão eletrônica), eventuais comprovantes de entrega (duplicata) e protesto.
  • Perda do original (ou vício que impede execução): via de regra, cabe ação monitória com prova escrita do crédito (contratos, faturas, registros).
  • Defesas usuais: exceções pessoais (apenas contra credor imediato), falsidade de assinatura, pagamento, nulidade formal, prescrição, vício de representação.
  • Compliance cambial: políticas internas para emissão, aceite e arquivamento (físico/digital) reduzem riscos e encurtam litígios.
Checklist rápido (antes de executar)

  1. Conferir requisitos formais e assinaturas (ou assinaturas eletrônicas qualificadas).
  2. Checar prazos de apresentação e prescrição; avaliar necessidade/utilidade do protesto.
  3. Na duplicata sem aceite, reunir comprovantes de entrega + protesto por indicação.
  4. Identificar coobrigados (endossantes/avalistas) e preservar o regresso.
  5. Para títulos escriturais, emitir certidão do registro e validá-la junto à registradora.

10) Boas práticas contratuais e de gestão

  • Padronização de modelos (físicos e eletrônicos), com campos obrigatórios e validações.
  • Governança de assinaturas: certificados/credenciais, logs de aceite e trilhas de auditoria.
  • Integração com registradoras para títulos escriturais e com cartórios para protestos eletrônicos.
  • Cláusulas de reforço: aval, garantias reais, cláusula de não à ordem (quando desejável limitar riscos de circulação).
  • Gestão de prazos: agendas automáticas para apresentação, aceite, vencimento e prescrição.

11) Fontes legais e normativas — citação organizada

  • CC/2002 arts. 887–926 (disposições gerais; endosso, aval, prescrição).
  • Decreto 57.663/1966 (LUG — letra de câmbio e nota promissória).
  • Lei 7.357/1985 (cheque).
  • Lei 5.474/1968 + Lei 13.775/2018 (duplicata mercantil/serviços e duplicata escritural).
  • Lei 9.492/1997 (protesto de títulos e outros documentos de dívida).
  • CPC/2015 art. 784 (títulos executivos extrajudiciais).
  • Lei 10.931/2004 (CCB e regime de garantias).
  • DL 167/1967 (cédula de crédito rural); DL 413/1969 e Lei 6.840/1980 (cédulas industrial/comercial).

Encerramento — síntese aplicável

Em síntese: a execução eficiente de títulos de crédito depende de três pilares: (i) forma irrepreensível (ou registro eletrónico válido), (ii) prazos respeitados (apresentação/protesto/prescrição) e (iii) documentação de suporte quando a espécie exigir (duplicata sem aceite, por exemplo). A adoção de títulos escriturais e a integração a registradoras e protesto eletrônico reduzem contestações e aceleram o fluxo de recebimento. No contencioso, a chave é alinhar a literalidade e a autonomia cambiais com as salvaguardas próprias das relações de consumo e com o controle de boa-fé na circulação.

Material técnico para fins educativos. A aplicação ao caso concreto pode exigir análise de contratos, registros e prazos específicos.

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