Direito médico e da saúde

Médico e Hospital Solidários: quando os dois pagam — e como evitar

Guia completo, em linguagem direta, sobre responsabilidade solidária entre médico e hospital. Explica fundamentos legais, quando a solidariedade se forma (e quando não), como o juiz examina culpa, nexo e defeito do serviço, e traz matrizes práticas, exemplos, cláusulas úteis e um roteiro de prevenção e de regresso.

1) O que significa responsabilidade solidária entre médico e hospital

No processo cível, solidariedade quer dizer que qualquer um dos réus (médico, hospital ou ambos) pode ser compelido a pagar toda a indenização ao paciente, cabendo depois buscar direito de regresso internamente. A solidariedade não transforma todas as condutas em iguais: ela organiza quem paga primeiro perante o paciente; a divisão final depende de culpa, de contratos e das provas.

2) Fundamentos legais que autorizam a solidariedade

  • CDC — Código de Defesa do Consumidor
    • Art. 14: fornecedor responde por defeito do serviço independentemente de culpa; §4º: profissional liberal (médico) responde mediante culpa.
    • Art. 7º, parágrafo único e art. 25, §1º: todos os envolvidos na cadeia de prestação podem responder solidariamente perante o consumidor; é nula cláusula que exclua essa responsabilidade.
  • Código Civil
    • Art. 186 e 927: ato ilícito e dever de indenizar (base da culpa do profissional).
    • Art. 932, III e 933: responsabilidade do empregador/estabelecimento pelos atos culposos de seus prepostos (médicos empregados ou sob direção).
    • Art. 942: autores de um mesmo ilícito respondem de forma solidária.
  • Normas sanitárias e de segurança do paciente (PNSP, protocolos de cirurgia segura, medicação, identificação, prevenção de quedas, IRAS): definem o padrão de serviço adequado que, se descumprido, caracteriza defeito do serviço do hospital.
  • Ética médica e resoluções do CFM: informam a lex artis (parâmetro da culpa individual), inclusive em telemedicina.
Mensagem-chave: a solidariedade nasce do CDC (cadeia de fornecimento) e/ou da preposição (médico atua como empregado/coligado). Mesmo quando o ato técnico é do médico (culpa subjetiva), o hospital pode ser solidário se o atendimento ocorreu em seu serviço ou se houve falha sistêmica.

3) Três portas de entrada para a solidariedade

3.1 Preposição/emprego

Quando o médico é empregado, plantonista contratado ou atua sob direção do hospital/da clínica, se houver culpa do profissional, o hospital responde solidariamente perante o paciente (e poderá buscar regresso de quem errou).

3.2 Cadeia de fornecimento (CDC)

Mesmo para médicos autônomos que integram o corpo clínico ou atendem nas dependências do hospital, é usual reconhecer solidariedade com base no CDC: para o paciente, hospital e médico compõem um mesmo serviço de saúde. A instituição aproveita-se da marca, da estrutura e do fluxo para ofertar o atendimento; por isso, responde com o médico pelo resultado jurídico (indenização), sem prejuízo do regresso.

3.3 Defeito do serviço

Quando o dano decorre de falhas sistêmicas (enfermagem, medicação, identificação, manutenção, prontuário/ti, fluxos, hotelaria, IRAS), a responsabilidade do hospital é objetiva e pode coexistir com a culpa do médico. Nesses casos, a solidariedade é praticamente a regra.

4) Onde a solidariedade costuma ser recusada

  • Atos exclusivamente técnicos praticados por médico autônomo fora da esfera de controle do hospital (ex.: consultório próprio; uso eventual do centro cirúrgico sem vínculo com o serviço), sem indício de defeito organizacional.
  • Casos com culpa exclusiva da vítima (descumprimento grave e comprovado de orientações essenciais) ou fato de terceiro inevitável.
  • Quando o hospital prova que não integrou a cadeia ou que o evento não mantém nexo com seu serviço (ex.: intercorrência domiciliar alheia ao cuidado prestado).

5) Matriz prática — cenários e como os juízes analisam

Cenário Regra para o médico Regra para o hospital/clínica Solidariedade? Provas decisivas
Médico empregado/preposto Culpa (imperícia, imprudência, negligência) Objetiva por preposição e por defeito do serviço Sim, usualmente Contrato/escala; prontuário; protocolos; laudo pericial
Médico autônomo no corpo clínico Culpa CDC (cadeia de fornecimento); defeito do serviço se houver Frequente Regras de credenciamento; uso de estrutura; marketing/agenda integrada
Falha de enfermagem/farmácia/TI Pode não haver culpa médica Objetiva por defeito do serviço Sim, se o médico também concorreu Checklists, logs, manutenção, POPs, auditorias
Procedimento em consultório próprio Culpa Não integra o serviço hospitalar Rara Comprovantes de local, contratos, notas

6) Linha do tempo probatória — como o caso é decidido

  1. Dano (material, moral, estético ou perda de uma chance).
  2. Conduta do médico e do serviço comparada à lex artis e aos protocolos.
  3. Nexo causal (causa adequada ou concausas).
  4. Tipo de responsabilidade: culpa do médico; objetiva do hospital por defeito do serviço; preposição e cadeia (CDC) → solidariedade.
  5. Excludentes: culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro inevitável, caso fortuito/força maior, inexigibilidade de conduta diversa.
Regra prática: o que costuma decidir a solidariedade é prova documental de que o médico atuava dentro do serviço (escalas, corpo clínico, uso de marca/agenda), somada a indícios de falha organizacional ou de preposição.

7) Estudos de caso (curtos e reais do dia a dia)

7.1 Erro de medicação em plantão

Enfermagem administra dose 10x maior por ampola LASA sem etiqueta auxiliar; sistema sem dupla checagem. Médico prescreveu corretamente. Resultado: hospital responde objetivamente por defeito do serviço; sem culpa médica. Se o médico não interveio após alerta, pode haver concausa e solidariedade.

7.2 Cirurgia em lado errado

Equipe realiza procedimento sem time-out e sem marcação. Médico concentrou decisão; protocolo institucional falhou. Resultado: solidariedade entre médico (culpa) e hospital (protocolo quebrado).

7.3 Autônomo credenciado em sala do hospital

Profissional do corpo clínico agenda paciente pelo call center do hospital, usa centro cirúrgico e recuperação; complicação por técnica negligente. Resultado: solidariedade em razão da cadeia de fornecimento e da preposição funcional (uso integrado de estrutura e marca), com posterior regresso contra o médico.

7.4 Diagnóstico difícil, protocolo seguido

Paciente com quadro atípico; equipe segue diretrizes, registra raciocínio e orienta sinais de alarme. Piora tardia, retorna com gravidade. Resultado: sem culpa médica; sem defeito do serviço — inexistência de solidariedade.

8) Roteiro de prevenção e de defesa (médico e hospital)

8.1 Para o hospital/clínica

  1. Governaça de segurança: Núcleo de Segurança do Paciente, CCIH, comissões e auditorias com PDCA e indicadores.
  2. Protocolos críticos: cirurgia segura, medicação (LASA, dupla checagem), hemoterapia, identificação, prevenção de quedas, sepse/AVC/IAM com tempos-alvo.
  3. Manutenção/calibração com rastreabilidade e plano de contingência para TI/prontuário.
  4. Treinamentos periódicos (listas de presença, avaliação) e simulações de eventos.
  5. Prontuário eletrônico íntegro, completo e disponível; logs e controle de acesso (LGPD).
  6. TCLE específico, armazenado no prontuário; proibir promessas de resultado em publicidade.
  7. Contratos com corpo clínico e terceiros: SLAs de qualidade, obrigação de seguir protocolos, cooperação pericial, seguro de RC e cláusula de regresso.
  8. Gestão de eventos adversos: cuidar, notificar, investigar (RCA), aprender e comunicar.

8.2 Para o médico

  1. Documentação do raciocínio clínico (hipóteses, risco–benefício, alternativas), orientações e retorno.
  2. TCLE claro, específico por procedimento (riscos frequentes e graves, alternativas, revogabilidade).
  3. Adesão a protocolos e registro da eventual exceção justificada.
  4. Comunicação empática e sem promessas; registro de contatos com o paciente/família.
  5. Seguro de responsabilidade civil compatível com a atividade.

9) Claúsulas úteis (modelo para contratos com corpo clínico/terceiros)

  • Qualidade e conformidade: obrigação de cumprir legislação sanitária, CEM/CFM, políticas da instituição e PNSP; sujeição a auditorias.
  • Regresso: pagamento ao paciente não implica assunção de culpa; quem der causa arcará com o reembolso proporcional.
  • Cooperação pericial: dever de fornecer prontuário, relatórios e comparecer como informante.
  • LGPD: papéis (controlador/operador), medidas de segurança, notificação de incidentes e multas contratuais.
  • Seguro RC: valor mínimo, comprovação periódica, manutenção por todo o vínculo.

10) Mini-gráfico — “peso” probatório usual

Prontuário & TCLE
Protocolos & checklists
Manutenção & rastreabilidade
Testemunhos

11) Perguntas de ouro para qualificar o caso (checklist decisório)

  1. Onde o ato aconteceu? Dentro do serviço do hospital? Houve uso de marca, agenda, centro cirúrgico, recuperação?
  2. Quem era o médico perante o hospital? Empregado, plantonista, credenciado do corpo clínico, terceiro eventual?
  3. Houve falha de processo/estrutura? (cirurgia segura, medicação, identificação, equipamentos, TI, IRAS).
  4. O prontuário está completo? Há TCLE específico? Há registros de orientação e retorno?
  5. Quais excludentes existem? Culpa exclusiva da vítima? Fato de terceiro inevitável? Emergência sem alternativa?
  6. Como dividir o regresso? Percentual conforme culpa evidenciada; prever em contrato.
Resumo executivo: No atendimento dentro do hospital, com corpo clínico e processos integrados, a solidariedade entre médico e instituição é a solução padrão. Para afastá-la, o hospital precisa provar ausência de defeito e de nexo com seu serviço; o médico, por sua vez, a aderência à lex artis e um prontuário robusto.

Conclusão

A responsabilidade solidária entre médico e hospital não é um rótulo automático, mas resulta da combinação de três vetores: (i) atuação integrada no serviço (cadeia de consumo), (ii) preposição e organização do trabalho médico e (iii) defeito do serviço (falha estrutural/processual). Em grande parte dos litígios, pelo menos um desses vetores está presente, o que explica por que as sentenças frequentemente impõem solidariedade perante o paciente, deixando a repartição final para o regresso. Para reduzir riscos e litígios, o caminho seguro é fortalecer o tripé de governança (Núcleo de Segurança, CCIH, qualidade), documentação (prontuário/TCLE) e conformidade (protocolos auditados, contratos claros, LGPD). Alinhados clínica, gestão e Direito, a instituição entrega cuidado mais seguro e mantém uma posição juridicamente sustentável.

Nota: antes de aplicar, confirme versões atualizadas de leis, RDCs e resoluções. Este material é informativo e não substitui parecer jurídico formal.

Guia rápido — Responsabilidade solidária entre médico e hospital

Use este “esquenta” para entender, em minutos, quando médico e hospital podem ser condenados juntos a indenizar o paciente e como se preparar para prevenir e defender. Solidariedade significa: qualquer um pode ser cobrado pelo todo perante o paciente; depois, entre si, fazem regresso conforme a culpa e os contratos.

Ideia central

  • O hospital é fornecedor de serviços e responde objetivamente por defeito do serviço (estrutura, processos, equipe de apoio).
  • O médico, como profissional liberal, em regra responde por culpa (imperícia, imprudência, negligência), pois sua obrigação é de meios.
  • Quando o atendimento é prestado dentro do serviço do hospital (ou com sua marca/fluxo), a relação de consumo forma uma cadeia de fornecedores. O resultado prático é a responsabilidade solidária perante o paciente, sem prejuízo do regresso.

Três portas de entrada para a solidariedade

  1. Preposição/emprego: médico empregado, plantonista ou sob direção da instituição → havendo culpa do profissional, o hospital é solidário.
  2. Cadeia de fornecimento: médico autônomo do corpo clínico que agenda, atende e opera na estrutura do hospital → costuma haver solidariedade, pois o paciente percebe um único serviço.
  3. Defeito do serviço: falhas sistêmicas (enfermagem, medicação, identificação, manutenção, TI/prontuário, IRAS, fluxos) → hospital responde objetivamente; se o médico concorreu com culpa, ambos são solidários.

Onde a solidariedade tende a não se formar

  • Ato exclusivamente técnico de médico autônomo em consultório próprio, sem uso relevante da estrutura do hospital e sem falha organizacional.
  • Culpa exclusiva da vítima (descumprimento grave de orientações), fato de terceiro inevitável ou inexigibilidade de conduta diversa em emergência comprovada.

Prova que decide

  • Prontuário completo (linha do tempo, hipóteses, risco–benefício, orientações e retorno) e TCLE específico.
  • Checklists e protocolos (cirurgia segura, medicação, hemoterapia, identificação, prevenção de quedas, sepse/AVC/IAM) com evidência de adesão.
  • Manutenção/calibração de equipamentos e planos de contingência de TI/prontuário com logs.
  • Vínculo do médico com o hospital (contratos, escalas, credenciamento, uso de marca/agenda, normas do corpo clínico).
  • LGPD: controles de segurança e resposta a incidentes (vazamento/indisponibilidade podem caracterizar defeito do serviço).

Mini-matriz para classificação do caso

Situação Regra Solidariedade
Erro de medicação por falha de dupla checagem Defeito do serviço (objetiva); médico solidário se concorrer Provável
Cirurgia sem time-out e marcação Protocolo quebrado + culpa técnica Quase certa
Autônomo em consultório próprio Ato técnico isolado, sem nexo com o serviço hospitalar Incomum

Passo a passo para prevenir e para se defender

  1. Mapeie riscos: cirurgia segura, medicação (LASA), hemoterapia, identificação, quedas, sepse/AVC/IAM, IRAS, TI/PEP.
  2. Audite adesão a protocolos e registre checklists assinados; treine periodicamente e guarde evidências.
  3. Mantenha manutenção e calibração rastreáveis, com SLA e contingência.
  4. Exija TCLE específico e prontuário robusto com raciocínio e orientações.
  5. Adeque contratos com corpo clínico/terceiros: SLAs, obrigação de seguir protocolos, seguro RC, cooperação pericial e cláusula de regresso.
  6. Implemente LGPD (papéis, controles, incidentes) e telemedicina com consentimento e trilha de auditoria.
  7. Em evento adverso, cuidar–notificar–investigar (RCA)–aprender; preserve evidências e comunique com empatia.
Resumo executivo: dentro do hospital, a soma ato técnico + serviço quase sempre resulta em solidariedade perante o paciente. Proteja-se com governança de segurança, documentação impecável, contratos claros e conformidade de dados.

FAQ — Responsabilidade solidária entre médico e hospital

1) O que significa “responsabilidade solidária” no contexto médico-hospitalar?

É a situação em que médico e hospital podem ser condenados a pagar integralmente a indenização ao paciente, independentemente da parcela de participação de cada um. Após o pagamento, quem arcou pode buscar regresso contra o outro, na proporção da culpa e conforme contratos.

2) Quando a solidariedade geralmente se forma?

Quando o atendimento ocorre dentro do serviço do hospital (estrutura, protocolos, equipe de apoio) e o paciente percebe um serviço único. Nessa cadeia de consumo, o hospital responde por defeito do serviço e o médico por culpa no ato técnico; se ambos concorrem para o dano, a condenação costuma ser solidária.

3) Hospital responde objetivamente e médico subjetivamente? Como isso conversa com a solidariedade?

Sim. O hospital, como fornecedor, responde objetivamente por falhas de estrutura/processos (defeito do serviço). O médico, como profissional liberal, responde por culpa (imperícia, imprudência, negligência). A solidariedade decorre do atendimento integrado: mesmo com títulos de responsabilidade distintos, ambos podem ser condenados juntos perante o paciente.

4) Médico autônomo do corpo clínico também pode ser solidário com o hospital?

Frequentemente, sim. Se o autônomo agenda, atende e opera na estrutura do hospital (marca, call center, centro cirúrgico, recuperação), forma-se uma cadeia de fornecedores. Havendo falha técnica ou de serviço, é usual reconhecer solidariedade entre ambos perante o paciente.

5) E se o procedimento foi em consultório próprio, fora do hospital?

Nesse caso a solidariedade é incomum. Sem uso relevante da estrutura do hospital e sem nexo com o serviço hospitalar, a análise recai sobre a culpa exclusiva do médico. O hospital tende a ficar fora, salvo se houver outro vínculo causal (ex.: material/sterilização fornecido pelo hospital com defeito).

6) Que provas costumam definir a solidariedade no processo?

Prontuário completo com linha do tempo; TCLE específico; checklists e protocolos (cirurgia segura, medicação, hemoterapia, identificação, prevenção de queda); manutenção/calibração de equipamentos e logs de TI; documentos de vínculo (contratos, credenciamento, escalas, uso de marca e agenda). Sem documentação, a defesa fica fragilizada.

7) Como funciona o direito de regresso entre médico e hospital?

Quem pagar ao paciente pode reaver do outro a parte correspondente à culpa demonstrada. Contratos com corpo clínico e terceiros devem prever cooperação pericial, SLAs, seguro de RC, obrigação de seguir protocolos e cláusula de regresso clara para facilitar a repartição.

8) Quais fatos podem afastar ou reduzir a solidariedade?

Culpa exclusiva da vítima (descumprimento grave e comprovado de orientações), fato de terceiro inevitável, caso fortuito/força maior e inexigibilidade de conduta diversa em emergências. Ainda assim, o hospital deve provar aderência a protocolos e o médico à lex artis.

9) Telemedicina e LGPD influenciam a solidariedade?

Sim. Plataformas/clinicas devem garantir identificação, registro no prontuário, consentimento específico, segurança da informação e rastreabilidade. Vazamento de dados, indisponibilidade sem contingência ou comunicação inadequada podem caracterizar defeito do serviço do hospital/clínica e gerar solidariedade com o médico, se houver culpa técnica associada.

10) Como prevenir a solidariedade (ou, ao menos, reduzir o risco de condenação)?

Fortaleça o tripé: governança de segurança (Núcleo do Paciente, CCIH, auditorias, PDCA), documentação impecável (prontuário/TCLE; checklists assinados; manutenção rastreável; logs de TI) e conformidade (protocolos críticos, contratos com SLAs e regresso, LGPD/telemedicina). Comunicação clara e pós-alta com sinais de alarme fecham o ciclo.

Lastro jurídico & aplicação prática — responsabilidade solidária entre médico e hospital

Este bloco reúne as principais fontes legais e mostra como elas são usadas para reconhecer (ou afastar) a solidariedade entre médico e hospital, sem citar casos específicos. Use como checklist para políticas internas, auditorias e peças processuais.

1) Constituição Federal

  • Art. 5º, X — proteção da intimidade, vida privada, honra e imagem (base do sigilo e da reparação por danos).
  • Art. 37, §6º — responsabilidade objetiva do Estado (hospitais públicos/contratualizados).
  • Art. 196 — saúde como direito de todos e dever do Estado (organização do SUS e políticas de segurança).

2) Código Civil

  • Art. 186 e 927 — ato ilícito e dever de indenizar (base da culpa do profissional liberal).
  • Art. 932, III e 933 — responsabilidade do empregador/estabelecimento pelos atos culposos de seus prepostos (médicos empregados/plantonistas).
  • Art. 942 — coautores respondem de forma solidária.

3) CDC — Código de Defesa do Consumidor

  • Art. 14 — hospital/clínica responde objetivamente por defeito do serviço; §4ºprofissional liberal responde mediante culpa.
  • Art. 7º, parágrafo único e art. 25, §1ºsolidariedade na cadeia de fornecedores (médico + hospital + terceiros).
  • Art. 6º, III e VIII — direito à informação e inversão do ônus da prova (impacto direto em prontuário/TCLE).

4) LGPD — Lei 13.709/2018

  • Dados de saúde são sensíveis: exigem base legal, segurança, minimização e resposta a incidentes. Vazamento/indisponibilidade com dano pode caracterizar defeito do serviço e gerar solidariedade com o médico se houver concausa clínica.

5) Ética e normas sanitárias

  • Código de Ética Médica (Res. CFM 2.217/2018 e atualizações) — deveres de diligência, sigilo, registro e publicidade responsável.
  • Telemedicina (Res. CFM 2.314/2022) — identificação, registro, consentimento específico, critérios de encaminhamento e segurança da informação.
  • PNSP (Portaria MS 529/2013) e RDC Anvisa 36/2013 — protocolos de cirurgia segura, medicação, identificação, prevenção de quedas, IRAS e governança do Núcleo de Segurança do Paciente.

6) Como as fontes operam no caso concreto

Eixo analisado Pergunta-chave Base jurídica Efeito
Defeito do serviço (enfermagem, fluxos, TI, manutenção, IRAS) O sistema falhou e gerou dano? CDC art. 14; PNSP; RDC 36 Objetiva p/ hospital; pode somar à culpa médica; solidariedade provável
Ato técnico do médico Houve violação da lex artis? CC 186/927; CEM; diretrizes clínicas Responsabilidade subjetiva (culpa)
Vínculo/Preposição O médico atuou como empregado/preposto? CC 932 III; 933; CDC (cadeia) Solidariedade perante o paciente; regresso depois
LGPD/Telemedicina Houve vazamento/indisponibilidade/uso indevido? LGPD; Res. CFM 2.314/2022 Defeito do serviço + possíveis sanções administrativas

7) Teste rápido de enquadramento (5 perguntas)

  1. Onde ocorreu o ato? Dentro da estrutura do hospital (marca, agenda, centro cirúrgico, recuperação)?
  2. Houve falha sistêmica? (checklists ausentes, dupla checagem falhou, equipamento sem manutenção, TI sem contingência)
  3. O médico seguiu a lex artis? Documentou hipóteses, risco–benefício, alternativas e orientações (TCLE)?
  4. Qual o nexo causal? A falha (serviço/ato) é causa adequada do dano?
  5. Existem excludentes? Culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro inevitável, caso fortuito/força maior, emergência sem alternativa?
Boas práticas: governança de Segurança do Paciente, protocolos auditados (cirurgia segura, medicação, hemoterapia, identificação, quedas, sepse/AVC/IAM), manutenção/calibração rastreável, prontuário + TCLE robustos, LGPD implementada e contratos com SLA, cooperação pericial e cláusula de regresso.

Encerramento

A solidariedade entre médico e hospital emerge quando há atendimento integrado ao consumidor, preposição e/ou defeito do serviço. Na prática, muitos litígios combinam culpa técnica e falha organizacional, razão pela qual as sentenças frequentemente impõem condenação solidária perante o paciente, deixando a divisão ao regresso. O caminho seguro é provar diligência com documentação impecável e uma governança de segurança que efetivamente funcione — o que reduz eventos, riscos jurídicos e melhora o cuidado.

Confirme sempre versões atualizadas de leis, RDCs e resoluções antes de aplicar ao caso concreto.

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