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Entenda a lei com clareza – Understand the Law with Clarity

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Direito empresárial

Recuperação Extrajudicial: como funciona o acordo direto entre empresas e credores

Recuperação extrajudicial: visão geral e propósito

A recuperação extrajudicial é um mecanismo de reestruturação negociada previsto na Lei nº 11.101/2005 (com alterações da Lei nº 14.112/2020) que permite ao devedor viável, porém financeiramente tensionado, renegociar dívidas diretamente com seus credores e, após obter os quóruns legais, submeter o plano à homologação judicial para torná-lo título executivo judicial e vincular dissidentes. Diferentemente da recuperação judicial, é um procedimento menos intrusivo, preserva a autonomia negocial e reduz custos e prazos, servindo como “ponte” para empresas que precisam de alívio de caixa e reperfilamento de passivos sem a complexidade de um processo coletivo amplo.

Quando usar?

  • Empresa com atividade operacional viável e governança minimamente organizada;
  • Passivos concentrados em determinadas classes (p.ex., fornecedores ou financeiros) passíveis de acordo;
  • Necessidade de celeridade e redução de custos processuais em relação à recuperação judicial.

Base legal e escopo

Os arts. 161 a 167 da Lei nº 11.101/2005 disciplinam a recuperação extrajudicial. O plano pode atingir apenas parte dos credores (segmentos ou classes) e não precisa abranger a totalidade do passivo. A lei veda a inclusão de créditos tributários e, em regra, créditos trabalhistas e decorrentes de acidente de trabalho (que têm tutela diferenciada). Também não se sujeitam, sem consentimento expresso, os credores titulares de propriedade fiduciária, arrendamento mercantil, venda com reserva de domínio e adiantamento a contrato de câmbio, dentre outras hipóteses com garantias reais “qualificadas”.

Com a reforma de 2020, o juiz pode conceder, mediante requisitos, suspensão de execuções por até 180 dias (medida cautelar) para viabilizar as negociações—algo que antes não era típico da via extrajudicial. A homologação judicial do plano novará as obrigações na forma pactuada e confere força de coisa julgada entre devedor e credores abrangidos.

Quem pode requerer

Podem requerer empresários e sociedades empresárias que não estejam em estado falimentar e que não tenham sido condenados por crimes falimentares. A lei também alcança ME e EPP, com simplificações possíveis. É indispensável demonstrar atividade econômica regular e capacidade de cumprimento do plano.

Créditos que podem integrar o plano

O devedor define o perímetro do plano: pode abranger, por exemplo, fornecedores quirografários, instituições financeiras (crédito sem garantia qualificada ou com renegociação das garantias), locadores e outros credores negociais. É recomendável organizar classes com critérios objetivos (p.ex., natureza do crédito, garantia, prazo), alinhadas às diretrizes do art. 41 (por analogia) para a adequada verificação de quóruns e tratamento isonômico dentro de cada grupo.

Não sujeitam-se por imposição legal:

  • Tributários (negociados em regimes próprios com a Fazenda);
  • Trabalhistas e de acidente de trabalho (salvo acordos individuais, sem efeitos erga omnes);
  • Créditos com propriedade fiduciária, leasing, reserva de domínio e ACC, sem consentimento do credor.

Etapas práticas do procedimento

1) Diagnóstico econômico-financeiro

Mapeamento de fluxo de caixa, perfil de endividamento, garantias e cronograma de vencimentos. Aqui se define o perímetro do plano (quem entra e quem fica fora) e as metas de sustentabilidade (leverage, cobertura de juros, margens).

2) Term sheet e “standstill”

Negociação de um term sheet com credores âncora (maiores ou estratégicos), prevendo condições-base (prazos, carências, descontos, step-up de juros, covenants) e, se possível, um acordo de não execução temporário (standstill) enquanto se fecha o plano.

3) Coleta de adesões

Uma vez lapidado o plano, colhem-se adesões por escrito. Para que a homologação vincule credores dissidentes dentro de cada classe abrangida, exige-se o quórum legal de mais de 3/5 (60%) dos créditos de cada classe contemplada (voto por valor). Se o devedor alcançar apenas adesões individuais, o plano poderá ser homologado sem efeito erga omnes, valendo apenas entre aderentes.

4) Pedido de homologação judicial

Protocolado o plano com as provas de adesão e documentação (demonstrações financeiras, relação de credores e garantias, regularidade societária etc.). É possível requerer medidas cautelares para suspender execuções por até 180 dias, desde que demonstrados probabilidade de aprovação, boa-fé e risco de dano ao resultado útil.

5) Controle judicial e homologação

O controle do juiz é de legalidade (regularidade formal, quórum, não violação de normas cogentes, respeito à ordem pública). Atendidos os requisitos, o magistrado homologa, conferindo força de título executivo judicial. A partir daí, o plano novará os créditos e, se atingido quórum por classe, vinculará os dissidentes.

6) Implementação e compliance

O devedor passa a cumprir o cronograma de pagamentos, obrigações de fazer/não fazer e covenants. O inadimplemento relevante pode autorizar credores a executar o plano ou, em último caso, a requerer falência (nas hipóteses legais), razão pela qual a governança de monitoramento (relatórios periódicos, auditoria) é essencial.

Conteúdo típico de um plano extrajudicial

  • Perímetro: classes e credores abrangidos, critérios de elegibilidade;
  • Tratamento financeiro: carência, prazos, amortizações, juros, descontos (haircut), capitalização, cash sweep;
  • Garantias: manutenção, reforço, substituição, liberação condicionada a gatilhos;
  • Covenants: limites de endividamento, DSCR mínimo, vedação de dividendos, investimento máximo;
  • Eventos de vencimento antecipado: descumprimento de obrigações, deterioração financeira, alienações relevantes sem consentimento;
  • Mecanismos de supervisão: agente fiduciário, comitê de credores aderentes, auditorias;
  • Planos operacionais: desinvestimentos, revisão de portfólio, redução de custos, renegociação de contratos;
  • Cláusulas de “most favored creditor”: preservam isonomia intraclasse;
  • Calendário e métricas de desempenho.

Quóruns, classes e vinculação de dissidentes

O coração da via extrajudicial é o quórum. Para que o plano, uma vez homologado, vincule credores não aderentes, é preciso ter a aprovação de mais de 3/5 (60%) dos créditos de cada classe abrangida. A correta alocação de credores em classes homogêneas e o tratamento isonômico intraclasse são cruciais para evitar impugnações. Não havendo quórum, a homologação pode ocorrer apenas para aderentes, sem efeito expansivo.

Efeitos jurídicos e econômicos

  • Novação das obrigações nos termos do plano homologado;
  • Execução judicial do plano em caso de descumprimento (título executivo judicial);
  • Possibilidade de medidas cautelares de suspensão de execuções (até 180 dias) durante a tramitação;
  • Preservação da administração da empresa (sem administrador judicial, salvo eventual nomeação pontual para fiscalizações específicas);
  • Potencial redução de custos e tempo em relação à recuperação judicial, com menor estigma de mercado;
  • Risco de efeito limitado se não alcançado o quórum por classe (valerá só entre aderentes).

Boas práticas de negociação

  • Transparência informacional: compartilhar demonstrações auditadas, premissas de projeção e cenários de sensibilidade;
  • Credores âncora: construir apoio inicial com os maiores para sinalizar viabilidade aos demais;
  • Tratamento equitativo intraclasse e justificativa objetiva para diferenças entre classes;
  • Comunicação contínua e calendário claro de milestones;
  • Garantias bem calibradas a novos financiamentos (DIP-like) que viabilizem a execução do plano;
  • Cláusulas de desempenho que ajustem pagamentos à geração de caixa (cash sweep, triggers).

Indicadores para monitorar a efetividade

  • DSCR (cobertura do serviço da dívida) trimestral ≥ meta do plano;
  • Alavancagem (Dívida Líquida/EBITDA) convergindo à banda prevista;
  • Geração de caixa operacional e cumprimento de covenants;
  • Execução de desinvestimentos e metas de redução de OPEX;
  • Taxa de adesão residual de credores remanescentes.

Riscos e pontos de atenção

  • Impugnações por credores dissidentes questionando classes, quórum ou isonomia;
  • Insuficiência de liquidez no curto prazo se o plano não prevê capital de giro;
  • Cross default com contratos não abrangidos, exigindo gestão cuidadosa de cláusulas;
  • Governança: falhas em controles e compliance comprometem credibilidade e homologação;
  • Tributos fora do plano: precisam de transação tributária ou parcelamentos específicos.

Conclusão: por que a via extrajudicial pode ser a rota ótima

A recuperação extrajudicial equilibra eficiência e segurança jurídica: concentra a negociação onde há maior fricção, preserva operações e, com quóruns adequados, impõe a solução negociada aos dissidentes da mesma classe, evitando o “holdout”. É especialmente útil quando há convergência econômica entre os principais credores e viabilidade operacional clara. O êxito depende de diagnóstico honesto, plano executável e comunicação transparente, além do cumprimento rigoroso das exigências legais para homologação.

Guia rápido

  • Finalidade: Permitir ao devedor negociar diretamente com credores e homologar judicialmente o acordo.
  • Base legal: Artigos 161 a 167 da Lei nº 11.101/2005 (com alterações da Lei nº 14.112/2020).
  • Quem pode requerer: Empresários e sociedades empresárias viáveis que não estejam falidas.
  • Vantagem: Procedimento célere, sigiloso e menos oneroso que a recuperação judicial.
  • Quórum: 3/5 (60%) dos créditos de cada classe abrangida pelo plano para vincular dissidentes.
  • Limites: Não inclui créditos tributários, trabalhistas ou com garantia fiduciária sem anuência.

FAQ NORMAL

O que diferencia a recuperação extrajudicial da judicial?

Na recuperação extrajudicial, as negociações ocorrem diretamente entre devedor e credores, com mínima intervenção judicial. Já na judicial, o processo é público, amplo e envolve todas as classes de credores, com fiscalização do administrador judicial.

Todos os credores são obrigados a participar?

Não. O devedor escolhe quais classes ou grupos de credores integrarão o plano. Os não abrangidos continuam com seus direitos inalterados.

O plano extrajudicial pode suspender execuções?

Sim, desde a reforma de 2020, é possível pedir ao juiz uma suspensão de execuções por até 180 dias para viabilizar a negociação e garantir o resultado útil do processo.

O que acontece se o plano não for aprovado?

Sem atingir o quórum de 3/5 dos créditos de cada classe, o plano só valerá para os credores que aderirem voluntariamente, não podendo ser imposto aos demais.

O devedor pode apresentar outro plano após a rejeição?

Sim. É possível formular novo plano, desde que respeitados os limites legais e prazos processuais. A nova proposta pode incluir ajustes conforme a resposta dos credores.

Quais são os riscos de uma recuperação extrajudicial?

Os principais riscos são a falta de adesão suficiente dos credores, impugnações por irregularidades formais e o descumprimento do plano homologado, o que pode resultar em execução judicial ou pedido de falência.

Fundamentação normativa e técnica

Os dispositivos que regulam a recuperação extrajudicial estão previstos nos arts. 161 a 167 da Lei nº 11.101/2005, atualizados pela Lei nº 14.112/2020. A Constituição Federal, em seu art. 170, também assegura a livre iniciativa e a preservação da empresa, fundamentos que sustentam o instituto. Além disso, o art. 47 da mesma lei reforça o objetivo de viabilizar a superação da crise econômico-financeira, preservando empregos e a função social da empresa.

Considerações finais

A recuperação extrajudicial é um instrumento moderno e eficiente para empresas que buscam reestruturar suas dívidas de forma rápida e estratégica, evitando a exposição e complexidade da via judicial. Quando bem planejada e conduzida com transparência, permite preservar relações comerciais e a continuidade das atividades empresariais, com impacto positivo na economia e no ambiente de negócios.

Essas informações não substituem a análise de um advogado ou especialista em reestruturação empresarial. Cada caso deve ser avaliado individualmente conforme suas particularidades jurídicas e econômicas.

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