Reajustes abusivos em planos de saúde: descubra seus direitos e saiba como recorrer
Contexto: Os reajustes de planos de saúde são permitidos pela legislação e pelas normas da ANS, mas precisam ser justificados, proporcionais e dentro dos limites regulatórios. Quando o aumento é muito acima do mercado, sem transparência ou sem base em índice autorizado, ele pode ser considerado reajuste abusivo e o consumidor pode recorrer.
Os planos de saúde fazem parte das principais despesas das famílias brasileiras, especialmente de idosos, pessoas com doenças crônicas e profissionais autônomos que não contam com benefício empresarial. Por isso, todo aumento repentino gera insegurança. A cada ano, beneficiários são surpreendidos com boletos muito mais altos, reajustes acima de 20%, 30% ou até 70% e, em alguns casos, reajustes anuais somados a reajustes por faixa etária. O resultado é que muitas pessoas são forçadas a cancelar o plano justamente quando mais precisam dele.
Ocorre que nem todo aumento é válido. O fato de o contrato prever reajuste não significa que a operadora pode aumentar como quiser. A legislação brasileira de consumo, a regulação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e a própria jurisprudência dos tribunais criaram critérios para separar o que é reajuste regular do que é reajuste abusivo. Este guia mostra os principais tipos de reajuste, como identificar abuso e quais são os caminhos para recorrer (administrativos e judiciais).
1. Tipos de reajuste em planos de saúde
Antes de falar do abuso, é preciso entender quais são os tipos de reajuste que existem:
- Reajuste anual – é o aumento periódico, geralmente uma vez por ano. Nos planos individuais/familiares, ele é limitado pela ANS. Nos coletivos, depende do contrato, mas deve ser transparente.
- Reajuste por faixa etária – ocorre quando o beneficiário muda de grupo etário (ex.: 49 → 59 → 64 anos). A lei permite, mas estabelece limites e proíbe aumentos discriminatórios contra idosos.
- Reajuste por sinistralidade – comum em planos coletivos por adesão ou empresariais. A operadora aumenta porque o grupo usou mais o plano no ano anterior. Tem que ter memória de cálculo.
- Reajuste por mudança de contrato ou rede – quando há ampliação de cobertura, acomodação ou inclusão de dependentes.
O problema começa quando a operadora aplica mais de um tipo de reajuste ao mesmo tempo, sem explicar, ou quando o percentual fica muito acima do índice máximo da ANS.
Quadro – Sinais de possível reajuste abusivo
- Aumento acima do índice da ANS (para plano individual/familiar);
- Aumento de 20%, 30%, 40% ou mais sem justificativa técnica;
- Aplicação de reajuste anual + faixa etária + sinistralidade no mesmo período;
- Empresa não apresenta memória de cálculo ou contrato não fala do índice;
- Idoso acima de 60 anos com aumento muito elevado de uma vez só.
2. Quando o reajuste é considerado abusivo?
O reajuste será abusivo quando:
- Desrespeita a regulação da ANS – nos planos individuais/familiares criados após a Lei 9.656/1998, o aumento anual precisa seguir o índice divulgado pela ANS. Se o índice da ANS foi 6% e o plano aumentou 18%, o excesso pode ser questionado.
- Não tem previsão contratual clara – o Código de Defesa do Consumidor (CDC) exige transparência. Reajuste genérico, sem fórmula e sem índice, é cláusula abusiva.
- Usa a idade como fator de exclusão – reajuste por faixa etária que deixa o plano impagável para idosos pode ser considerado discriminatório, especialmente para consumidores com mais de 60 anos e mais de 10 anos de plano (Estatuto do Idoso).
- Não apresenta memória de cálculo – em plano coletivo com reajuste por sinistralidade, a operadora deve comprovar os custos do grupo. Se não comprovar, o consumidor pode pedir revisão.
- Fere a boa-fé objetiva – aumentos sucessivos, desproporcionais ou em momentos de grande necessidade (pessoa em tratamento, por exemplo) podem ser considerados abusivos pelos tribunais.
Gráfico (modelo texto) – Comparativo índice ANS x aumento aplicado
Ano Índice ANS Aumento aplicado pelo plano
2023 9,63% 18%
2024 6,91% 15%
Diferença - +8% a +9% por ano
*Quando o aumento aplicado é sistematicamente maior que o índice regulatório, há forte indício de abusividade.
3. Como recorrer de reajustes abusivos
O consumidor não está de mãos atadas. É possível reagir por três vias: administrativa, negocial e judicial. Veja cada uma:
3.1. Via administrativa (dentro da operadora)
O primeiro passo é pedir explicações formais à operadora ou administradora do benefício. Faça por escrito ou protocolo. Solicite:
- cópia do contrato atualizado;
- carta de reajuste com percentuais aplicados;
- memória de cálculo (no caso de plano coletivo ou por sinistralidade);
- indicação de qual regra da ANS foi usada.
Se a resposta não vier ou for insatisfatória, registre reclamação na ANS (Disque ANS 0800 701 9656 ou portal gov.br/ans) e no Procon do seu estado.
3.2. Negociação ou portabilidade
Em alguns casos, especialmente planos coletivos por adesão, vale tentar negociar com a administradora (ex.: Qualicorp, Allcare etc.). É possível solicitar migração para outro produto com preço mais acessível ou até fazer a portabilidade de carências para outro plano com valor menor.
3.3. Via judicial
Se o aumento foi muito acima do razoável e está inviabilizando o pagamento, o consumidor pode ingressar com ação judicial pedindo:
- suspensão do reajuste abusivo (pedido liminar);
- revisão do contrato para aplicar o índice correto (p.ex., o da ANS);
- devolução/compensação dos valores pagos a maior;
- manutenção do plano, sem cancelamento por inadimplência causada pelo aumento abusivo.
Os tribunais brasileiros têm reconhecido que o consumidor não é obrigado a aceitar aumento unilateral sem base técnica. Em muitos casos, o juiz manda aplicar o índice da ANS ou o índice médio de mercado.
4. Documentos que ajudam a comprovar o abuso
Quanto mais prova, mais fácil a revisão. Guarde:
- boletos antes e depois do aumento;
- comunicado de reajuste enviado pela operadora;
- contrato original (ou o que estiver disponível);
- e-mails ou protocolos de atendimento que negaram explicação;
- tabelas de reajuste da ANS (baixadas do site oficial);
- comprovantes de que o consumidor é idoso ou que está no plano há mais de 10 anos (para aplicar o Estatuto do Idoso).
5. Reajuste por faixa etária e idosos: atenção redobrada
O reajuste por mudança de faixa etária é o que mais gera ação na Justiça. A lei permite que o valor aumente conforme a idade, porque os custos médicos são maiores. Mas existem dois limites importantes:
- Resolução Normativa ANS 63/2003 – define faixas e limites;
- Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003) – proíbe aumento abusivo para quem tem 60 anos ou mais e mais de 10 anos de vínculo.
Se o plano dobrou, triplicou ou se tornou impagável ao chegar perto dos 60 anos, isso pode ser questionado. A jurisprudência costuma determinar que o aumento seja diluído ou reduzido.
Quadro – Estratégia prática para o consumidor
- Pedir por escrito a justificativa do reajuste;
- Comparar com o índice máximo da ANS do ano;
- Registrar reclamação na ANS e no Procon;
- Calcular quanto foi pago a mais;
- Se o plano se recusar a rever, ingressar com ação judicial com pedido liminar.
6. Conclusão
Reajuste de plano de saúde não é sinônimo de abuso. Mas abuso em reajuste de plano de saúde é mais comum do que deveria, principalmente em contratos antigos, coletivos por adesão e planos em que o consumidor não recebe a memória de cálculo. Como saúde é serviço essencial, o Judiciário tem aplicado com frequência o Código de Defesa do Consumidor, o Estatuto do Idoso e as normas da ANS para conter aumentos desproporcionais. Assim, diante de um aumento muito alto, o caminho não é cancelar o plano de imediato, mas questionar, pedir revisão, registrar reclamação e, se necessário, acionar a Justiça. Em muitos casos, o valor volta a um patamar razoável e o consumidor mantém o benefício.
Guia rápido
- 1. Recebeu boleto com aumento muito alto? Compare com o índice da ANS.
- 2. Não explicou? Peça a memória de cálculo à operadora.
- 3. Reajuste por idade perto dos 60? Veja se tem mais de 10 anos de plano.
- 4. Reclame na ANS e no Procon.
- 5. Se o plano insistir, ajuíze ação pedindo suspensão do aumento.
FAQ
1. Todo reajuste de plano de saúde é abusivo?
Não. O reajuste é um mecanismo legítimo para manter o equilíbrio econômico do contrato. Ele só se torna abusivo quando desrespeita os índices da ANS, não tem base contratual ou é desproporcional.
2. Posso entrar na Justiça mesmo sem cancelar o plano?
Sim. A ação pode pedir a manutenção do plano com o valor anterior e a suspensão do aumento. Muitos juízes concedem liminar para evitar a interrupção do serviço.
3. Idoso pode sofrer reajuste por faixa etária?
Depois dos 60 anos, e se o beneficiário tem mais de 10 anos de vínculo, o reajuste não pode ser discriminatório nem tornar o plano impagável. Aumento exagerado pode ser reduzido judicialmente.
4. Plano coletivo também pode ser questionado?
Pode. Embora não tenha teto de reajuste pela ANS, o plano coletivo precisa ser transparente. Sem memória de cálculo ou com aumento fora do mercado, cabe revisão.
5. A ANS resolve o problema sozinha?
A ANS pode pressionar a operadora, multar e exigir explicação. Mas quando a discussão é sobre cláusula contratual ou devolução de valores, o caminho costuma ser o Judiciário.
6. Posso pedir devolução do que paguei a mais?
Sim. Se o juiz reconhecer que houve reajuste abusivo, pode determinar devolução simples ou compensação em faturas seguintes.
Base técnica (fontes legais – de outro nome)
- Lei nº 9.656/1998 – Dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde.
- Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) – Princípios de transparência, equilíbrio e boa-fé.
- Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) – Proteção contra reajustes discriminatórios a maiores de 60 anos.
- Resoluções Normativas da ANS (ex.: RN 63/2003, RN 171/2008, RN 441/2018) – Critérios para reajuste e mudança de faixa etária.
- Guia de Reajuste de Planos Individuais – ANS – Tabelas anuais de índices autorizados.
- Jurisprudência de tribunais estaduais e STJ – Casos de limitação de reajustes abusivos e manutenção de planos.
Comunicado importante: Este conteúdo tem caráter informativo e educativo e foi elaborado com base em normas da ANS e legislação de consumo. Ele não substitui o atendimento individual de um advogado especializado ou defensor público, especialmente em casos urgentes, de pessoas idosas, em tratamento médico contínuo ou com risco de cancelamento do plano.
