Pensão por Morte: Entenda as Regras, Provas e Principais Teses da Jurisprudência Brasileira
Panorama jurisprudencial da pensão por morte (RGPS e regimes próprios)
A pensão por morte é benefício típico de sobrevivência, de caráter substitutivo da renda do segurado falecido e com natureza alimentar. A lei de regência é a Lei 8.213/1991 (arts. 74 a 79) para o RGPS, com regras próprias nos regimes próprios. Em linhas gerais, a concessão depende de (i) qualidade de segurado do instituidor ao tempo do óbito (ou manutenção pelo período de graça), (ii) evento morte (comprovada ou presumida) e (iii) condição de dependente do requerente. A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem refinado esses requisitos, especialmente quanto à união estável, relações simultâneas, menor sob guarda, ex-cônjuge e aos efeitos financeiros do benefício.
Dependentes e prova da dependência
- Presunção de dependência: cônjuge, companheiro(a) e filhos menores de 21 anos ou inválidos/deficientes (art. 16, I, Lei 8.213) não precisam provar dependência econômica; basta demonstrar o vínculo.
- Companheiro(a) em união estável: a jurisprudência exige início de prova material contemporânea (contas conjuntas, domicílio comum, declaração no INSS, planos de saúde, filhos em comum), corroborada por testemunhas. A TNU consolidou a exigência de início de prova material para evitar decisões baseadas apenas em prova oral.
- Ex-cônjuge: se receber pensão alimentícia judicial/convencional, a dependência é reconhecida; sem alimentos, admite-se prova de dependência superveniente (doença, incapacidade, desemprego prolongado), analisada casuisticamente pelo STJ.
- Enteado e menor tutelado: equiparados a filho, desde que comprovada a dependência econômica e a declaração do segurado.
Direito à pensão e famílias contemporâneas
- Uniões homoafetivas: reconhecidas com os mesmos efeitos da união estável, assegurando pensão por morte (precedentes do STF).
- Relações simultâneas: o STF/STJ distinguem separação de fato (admite rateio entre cônjuge separado de fato e companheira comprovada) do concubinato impuro (relação adulterina paralela sem separação de fato), que não gera pensão.
Qualidade de segurado e período de graça
É pacífico que não há carência para pensão por morte; exige-se apenas que o falecido possuísse qualidade de segurado no óbito ou a mantivesse pelo período de graça (geralmente 12 meses, prorrogáveis para 24/36 meses conforme histórico contributivo e comprovação de desemprego). A jurisprudência admite provas administrativas (CNIS, seguro-desemprego, CTPS) para estender o período de graça, e reconhece que o contribuinte individual/facultativo pode perder a qualidade se houver atraso relevante no pagamento sem opção de retroação válida.
Data de início do benefício (DIB) e efeitos financeiros
- Para cônjuge/companheiro, se o requerimento for feito em até 90 dias do óbito, a DIB é a data do falecimento; após esse prazo, a DIB é a data do requerimento administrativo (DER), regra reforçada após a Lei 13.846/2019.
- Para menor de 16/21 anos ou incapazes, a jurisprudência afasta prescrição e fixa efeitos financeiros desde o óbito, independentemente do prazo de 90 dias.
- Havendo requerimento administrativo indeferido, a DIB costuma retroagir ao óbito se o indeferimento decorreu de erro do INSS e as provas eram suficientes ou foram complementadas na via judicial sem alteração do quadro fático básico.
Duração do benefício, cotas e cessação
Após a EC 103/2019, a duração para cônjuge/companheiro passou a observar faixas etárias e tempo de contribuição/união (regra geral: mínimo de 4 contribuições do instituidor e 2 anos de união, sob pena de pensão temporária de 4 meses, ressalvadas hipóteses de morte acidental ou doença do trabalho). As cotas são: 50% + 10% por dependente, não reversíveis entre si (cada cota de 10% cessa com a perda da qualidade de dependente). Para óbitos anteriores à reforma, aplicam-se as regras então vigentes (cota familiar de 100% e reversão de cotas), tema recorrente em julgamentos sobre direito intertemporal.
Cumulação e acumulação com outros benefícios
O STF e o STJ reconhecem a possibilidade de cumular pensões de regimes distintos (ex.: RGPS e regime próprio) quando houver fundamentos jurídicos autônomos, porém a EC 103/2019 introduziu limites e redutores na cumulação (aplica-se a óbitos/benefícios instaurados após a reforma). A cumulação com aposentadoria também passou a sofrer redutores progressivos sobre a pensão (percentuais por faixas de salário de benefício), tema que segue gerando controvérsias sobre aplicação retroativa e direito adquirido.
Provas, instrução e padrão decisório
- Prova material mínima é frequentemente exigida para união estável (contas, correspondências, certidão de filhos, declaração de imposto de renda), complementada por testemunhas idôneas.
- Em desaparecimento, admite-se pensão provisória por decisão judicial (art. 78), convertida em definitiva com o reconhecimento do óbito presunto.
- Para menor sob guarda, a jurisprudência tem reconhecido o direito à pensão quando demonstrada dependência econômica e o exercício efetivo da guarda, sem artificialismos, especialmente em contextos de proteção integral.
- Em contextos de violência doméstica que resultem no óbito, decisões recentes têm afastado penalidades ao dependente inocente e acelerado a implantação, observando prioridade legal.
Quadro prático — como os tribunais têm decidido
- União estável: concede quando há início de prova material + prova testemunhal consistente; meras declarações isoladas são insuficientes.
- Separação de fato: admite rateio entre cônjuge separado de fato e companheira com convivência pública, contínua e duradoura.
- Concubinato impuro: não gera pensão; a relação paralela clandestina ao casamento sem separação de fato não é protegida.
- Menor/incapaz: efeitos financeiros desde o óbito.
- Período de graça: estendido com prova de desemprego (CNIS, seguro-desemprego, CTPS sem baixa recente).
Mudanças pós-Reforma (EC 103/2019) e debates atuais
Além da nova forma de cálculo (cota familiar 50% + 10% por dependente) e dos limites de cumulação, o contencioso atual discute: (i) direito intertemporal — se os critérios de cálculo/duração aplicam-se a óbitos anteriores; (ii) revisões por erro de enquadramento de dependentes; (iii) impacto de contribuições esparsas na qualidade de segurado; (iv) pensão de servidor x RGPS e a repartição de competências entre INSS/entes subnacionais; (v) proteção a famílias plurais e multiparentalidade.
Tópicos (+)
- Óbito presumido: pensão provisória por decisão judicial; exige diligências e prazos legais.
- Reversão de cotas: para óbitos anteriores à EC 103/2019, a cota de um dependente costuma reverter aos demais.
- Dependente inválido: perícias periódicas podem reavaliar a manutenção; benefício não cessa por idade.
- Acumulação com BPC: em regra, vedada; escolha pelo mais vantajoso quando preenchidos os requisitos de ambos.
- Competência: ações do RGPS tramitam na Justiça Federal; juizados especiais previdenciários admitem causas até o teto legal.
Check-list probatório
- Certidão de óbito e identificação do segurado (CNIS/CTPS).
- Documentos contemporâneos da convivência (para companheiro[a]).
- Comprovação de desemprego para ampliar período de graça.
- Decisão/termo de alimentos (ex-cônjuge).
- Laudos/atestados para dependente inválido ou com deficiência.
Conclusão
A jurisprudência sobre pensão por morte tem preservado o caráter protetivo do benefício, sem abrir mão de critérios probatórios que coíbem fraudes. Destacam-se: (i) a proteção às famílias reais (inclusive homoafetivas), (ii) o rateio em separação de fato, com vedação ao concubinato impuro, (iii) a sensibilidade com menores e incapazes quanto aos efeitos financeiros, e (iv) o novo regime de cálculo/cumulação após a EC 103/2019. Para litigar ou decidir, o ponto de partida é sempre o tripé: qualidade de segurado, dependência e marco temporal das regras aplicáveis ao óbito, aliado a um dossiê probatório robusto que espelhe a realidade familiar e contributiva do caso concreto.
Guia rápido
- Requisitos centrais: qualidade de segurado do instituidor; óbito (real ou presumido); condição de dependente nos moldes do art. 16 da Lei 8.213/1991.
- Sem carência: pensão por morte dispensa carência; o foco é a manutenção da qualidade de segurado (período de graça).
- DIB e prazos: para cônjuge/companheiro, até 90 dias do óbito a DIB retroage à data do falecimento; após esse prazo, conta da DER. Menores e incapazes recebem desde o óbito.
- União estável: exige início de prova material contemporânea, reforçada por testemunhas; uniões homoafetivas têm igual proteção.
- Relações simultâneas: separação de fato admite rateio entre cônjuge separado e companheiro(a); concubinato impuro não gera pensão.
- Pós-EC 103/2019: cota familiar de 50% + 10% por dependente, sem reversão; limites para cumulação com aposentadoria e pensões de regimes distintos.
FAQ
Quais documentos servem como prova de união estável para pensão por morte?
Contas ou contratos em conjunto, domicílio comum, declaração no IR/INSS, planos de saúde e certidão de filhos, além de prova testemunhal. A tendência é exigir início de prova material contemporânea, evitando decisões baseadas só em testemunhas.
Perder o emprego pouco antes do óbito faz a família perder o direito?
Não necessariamente. A lei assegura o “período de graça”, que mantém a qualidade de segurado por 12 meses, prorrogáveis conforme histórico contributivo e comprovação de desemprego (CNIS, seguro-desemprego, CTPS), tema acolhido de forma favorável pela jurisprudência.
O ex-cônjuge que recebia pensão alimentícia tem direito?
Sim. A dependência econômica é, em regra, presumida quando há alimentos fixados judicial ou convencionalmente. Sem alimentos, admite-se prova de dependência superveniente (doença, incapacidade, vulnerabilidade), analisada caso a caso.
É possível cumular pensão por morte com aposentadoria?
Hoje é possível com limites. A EC 103/2019 introduziu redutores progressivos quando há cumulação com aposentadoria ou com outra pensão; aplica-se conforme a data do óbito/implantação e o regime previdenciário envolvido.
Como os tribunais tratam relações paralelas ao casamento?
Há distinção entre separação de fato (admite rateio entre cônjuge separado de fato e companheiro(a) provado) e concubinato impuro (relação clandestina sem separação de fato), que não gera pensão. Esse é o padrão consolidado em julgados de STF/STJ.
Quando a pensão começa a ser paga para menores e incapazes?
Via de regra, desde a data do óbito, ainda que o requerimento seja posterior, porque não corre prescrição contra incapazes. Isso é aceito de forma ampla pela jurisprudência previdenciária.
Fundamentação normativa e precedentes (Base técnica)
- Lei 8.213/1991 (arts. 16 e 74–79): dependentes, concessão, DIB e duração; art. 78 (pensão provisória por morte presumida).
- Decreto 3.048/1999: regulamento do RGPS, períodos de graça e comprovações administrativas (CNIS, vínculos, desemprego).
- Lei 13.846/2019: prazo de 90 dias para DIB desde o óbito ao cônjuge/companheiro; ajustes probatórios.
- EC 103/2019: nova forma de cálculo (50% + 10% por dependente), regras de duração por faixa etária e limites à cumulação.
- Jurisprudência dominante STF/STJ: reconhecimento de uniões homoafetivas com efeitos previdenciários; vedação do concubinato impuro; possibilidade de rateio em separação de fato; proteção reforçada a menores/incapazes; extensão do período de graça com prova de desemprego.
- Direito intertemporal: aplica-se a regra vigente à época do óbito para cálculo/duração, salvo hipóteses expressas em contrário; inúmeros acórdãos reafirmam a necessidade de observar o marco temporal do falecimento.
Checklist prático para instrução do pedido
- Certidão de óbito, documentos do segurado (CNIS/CTPS) e do dependente.
- Início de prova material de convivência para união estável + testemunhas.
- Comprovação de desemprego para estender período de graça (se aplicável).
- Decisão/termo de alimentos para ex-cônjuge; laudos médicos para inválidos.
- Registrar a DER e guardar o protocolo; em indeferimento, avaliar ação judicial.
Considerações finais
A jurisprudência preserva o caráter protetivo da pensão por morte ao mesmo tempo em que exige um dossiê probatório consistente. O êxito depende de demonstrar com precisão o tripé qualidade de segurado + dependência + marco temporal (regras vigentes na data do óbito), além de atenção às mudanças trazidas pela EC 103/2019 em cálculo, duração e cumulação.
Este material é informativo e não substitui a atuação de um advogado ou profissional habilitado, que poderá avaliar documentos, prazos e estratégias processuais conforme as particularidades do seu caso.

