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Entenda a lei com clareza – Understand the Law with Clarity

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Direito ambientalDireito Penal

Jurisprudência do STF e STJ em crimes ambientais: entendimentos, tendências e impactos práticos

Panorama da jurisprudência do STF e do STJ em crimes ambientais

A Lei 9.605/1998 inaugurou um sistema de responsabilização multissetorial – civil, administrativa e penal – para a tutela do meio ambiente (CF, art. 225). Ao longo das últimas duas décadas, STF e STJ consolidaram diretrizes sobre responsabilidade penal da pessoa jurídica, tipicidade, competência, medidas cautelares, sanções e instrumentos de consenso. Este guia sintetiza as linhas mestras desses entendimentos, com foco prático para quem atua na persecução penal, defesa técnica e compliance ambiental.

Responsabilidade penal da pessoa jurídica

Tese constitucional do STF (Tema 246)

O STF fixou que é constitucional a responsabilização penal de pessoas jurídicas por crimes ambientais independentemente de responsabilização concomitante da pessoa física. A Corte interpretou o art. 225, §3º, da CF e o art. 3º da Lei 9.605/1998 para afirmar a autonomia da imputação quando o fato decorre de decisão corporativa ou de política empresarial. Com isso, admite-se denúncia exclusiva contra a pessoa jurídica quando as circunstâncias evidenciam conduta institucionalizada.

Seguimento no STJ

O STJ alinhou-se à orientação: mantém-se a admissibilidade de ação penal apenas contra a empresa, desde que haja descrição concreta do nexo entre atividade corporativa e resultado/risco. Não se exige identificação nominal de um “autor natural” para legitimar a persecução contra a PJ, mas a acusação deve demonstrar o vínculo funcional entre o fato e os objetivos ou interesses corporativos.

Tipicidade, bens jurídicos e estrutura dos tipos penais ambientais

Crimes de mera conduta e perigo abstrato

O STJ entende que diversos tipos penais ambientais (p. ex., art. 60, “exercer atividade sem licença”) são crimes formais de mera conduta e de perigo abstrato. Basta a comprovação da atividade sujeita a licenciamento e a inexistência/invalidade da licença, sendo desnecessária a prova de dano ou potencial lesivo concreto. A exigência de laudo técnico só é imprescindível quando o elemento normativo do tipo o impuser (p. ex., discussão sobre “poluição” do art. 54 em hipóteses específicas).

Princípio da insignificância

O STJ cristalizou, por meio da Súmula 613, que não se aplica o princípio da insignificância a crimes e contravenções ambientais. A ratio é a tutela de um bem jurídico difuso (equilíbrio ecológico) e a natureza frequentemente cumulativa/fragmentada do dano ambiental. Exceções são residuais e demandam cenário de inexpressividade extrema, o que, na prática, o Tribunal repele com recorrência.

Concurso de normas e consunção

É comum a acusação múltipla (p. ex., art. 60 — sem licença — e art. 54 — poluição). O STJ tem aplicado a consunção quando a conduta-meio (sem licença) é totalmente absorvida pelo crime-fim (poluição qualificada), desde que exista unidade de desígnio e de contexto. Em sentido inverso, quando não há prova de poluição, mantém-se a condenação pelo art. 60.

Competência penal em matéria ambiental

Justiça Federal x Justiça Estadual

Seguindo a regra constitucional e a jurisprudência consolidada, a competência será federal quando o crime for praticado em detrimento de bens, serviços ou interesse direto da União (CF, art. 109), o que abrange: unidades de conservação federais, mar territorial e plataforma continental, terras indígenas e hipóteses em que o IBAMA figure como ofendido direto. Na ausência desse nexo federal, a competência permanece estadual, ainda que o órgão ambiental federal tenha fiscalizado ou autuado.

Conexão e prevenção

Em delitos plurilocais (cadeias de transporte de madeira, crimes em bacias hidrográficas), STJ e STF priorizam a fixação no local de consumação do dano ou onde se desenvolveu a maior atividade delitiva, com uso de regras de prevenção para evitar decisões conflitantes.

Medidas cautelares, perdimento e reparação

Apreensão e perdimento de instrumentos

A apreensão de veículos, embarcações e maquinário é recorrente. O STJ tem exigido proporcionalidade e nexo de instrumentalidade para o perdimento (Lei 9.605/1998, art. 25). Exige-se prova de que o bem foi especificamente utilizado na prática criminosa, afastando-se o confisco quando desproporcional ou quando a utilização foi sem ciência do proprietário de boa-fé. A restituição pode ocorrer com caução e condições (p. ex., comprometimento de não uso para atividade ilícita).

Reparação civil e danos morais coletivos

No âmbito penal, STF e STJ admitem a fixação de valor mínimo de reparação (CPP, art. 387, IV), inclusive para danos morais coletivos, desde que haja pedido expresso e prova minimamente suficiente. A reparação penal dialoga com a responsabilização civil-administrativa, devendo-se evitar bis in idem pelo mesmo fato, sem excluir a complementaridade entre esferas.

Consenso penal, ANPP e alternativas à pena

Transação, suspensão condicional e ANPP

Crimes ambientais, em regra, possuem baixa ou média ofensividade abstrata e penas mínimas reduzidas, o que abre espaço para transação penal (Lei 9.099/1995), suspensão condicional do processo (art. 89, Lei 9.099/1995) e Acordo de Não Persecução Penal — ANPP (CPP, art. 28-A). O STJ tem reconhecido a retroatividade benéfica do ANPP em processos sem trânsito em julgado, desde que preenchidos os requisitos legais. Medidas como prestação pecuniária ambiental, serviços à comunidade e projetos de recuperação são preferidas, conforme a orientação da Lei 9.605/1998 para penas restritivas de direitos.

Interação com TACs

Embora o TAC (LACP, art. 5º, §6º) pertença à esfera cível, STF e STJ admitem que seu cumprimento pode ser valorado no juízo penal como circunstância favorável (redução de pena/substituição) ou como condição em ANPP/sursis processual, sem impedir a persecução se o fato permanecer típico e antijurídico.

Proteção constitucional da fauna e repercussões penais

Maus-tratos e manifestações culturais

Ao interpretar o art. 225, §1º, VII, da CF, o STF firmou orientação protetiva à fauna, rechaçando práticas com crueldade (p. ex., controle de fauna com métodos cruéis, competições com maus-tratos). Em julgamentos paradigmáticos de controle abstrato, a Corte reforçou que a criminalização de maus-tratos (Lei 9.605/1998, art. 32) deve ser lida em harmonia com a vedação constitucional à crueldade, mesmo diante de normas locais que busquem relativizá-la. A posterior EC 96/2017 reconheceu manifestações culturais com animais, mas condicionadas à proteção contra crueldade, preservando a interpretação estrita em matéria penal.

Estatísticas ilustrativas e focos jurisprudenciais

A atuação dos Tribunais Superiores revela alguns hotspots: responsabilidade da PJ, competência federal, apreensão/perdimento, e uso do consenso penal. Para visualização rápida, veja a composição ilustrativa abaixo (não é banco oficial, mas espelha a tendência da pauta):


Temas recorrentes (índice) PJ e tipicidade Competência Cautelares Consenso penal Fauna/CF
Tendência: crescimento de decisões sobre consenso penal e competência, sem reduzir a centralidade da PJ e de cautelares.

Integrações com o direito administrativo sancionador

STF e STJ reiteram que a responsabilidade administrativa ambiental é, em regra, objetiva (teoria do risco administrativo) e independe da esfera penal, enquanto a penal continua fundada em dolo ou culpa. Entretanto, autos de infração, laudos e processos administrativos são probatórios relevantes, especialmente quando há cadeia documental robusta (p. ex., DOF e notas fiscais), podendo subsidiar a convicção do juízo criminal.

Quadros práticos

Conclusão

A jurisprudência dos Tribunais Superiores consolidou pilares para a persecução e a defesa em crimes ambientais: a autonomia penal da pessoa jurídica (com denúncia autônoma), a natureza formal de boa parte dos tipos (com Súmula 613 afastando insignificância), a competência federal seletiva por interesse direto da União e a preferência por sanções substitutivas, acordos e reparação. O desenho atual busca efetividade preventiva e proporcionalidade, articulando esfera penal com o direito administrativo sancionador e a responsabilidade civil. Para resultados consistentes, é decisivo investir em prova técnica qualificada, governança e gestão do risco ambiental ao longo de toda a cadeia de valor.

Guia rápido — Jurisprudência do STF e STJ em crimes ambientais

  • Foco central: responsabilidade penal de pessoas físicas e jurídicas, tipicidade (crimes de perigo), competência federal/estadual, cautelares e reparação, consenso penal (ANPP, transação, sursis processual) e proteção constitucional da fauna.
  • Perguntas frequentes abaixo resumem entendimentos dos Tribunais Superiores e orientam atuação prática em persecução, defesa e compliance ambiental.

STF admite responsabilização penal da pessoa jurídica sem incluir pessoa física?

Sim. O STF firmou tese de que a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais é autônoma, com base no art. 225, §3º, da CF e no art. 3º da Lei 9.605/1998. Não é indispensável denunciar simultaneamente pessoa física quando a conduta decorre de decisão corporativa ou política empresarial. O STJ acompanha a orientação, exigindo descrição concreta do vínculo entre o fato e a atuação/benefício da empresa.

O princípio da insignificância se aplica a crimes ambientais?

Em regra, não. O STJ consolidou na Súmula 613 a inaplicabilidade do princípio da insignificância em crimes e contravenções ambientais, dada a proteção de bens difusos e a natureza cumulativa dos danos. Exceções são raras e demandam inexpressividade extrema do fato e do potencial ofensivo, o que normalmente é repelido.

Quando a competência é da Justiça Federal em matéria penal ambiental?

Quando houver interesse direto da União ou o crime atingir bens/serviços federais, como unidades de conservação federais, mar territorial e plataforma continental, terras indígenas ou quando o IBAMA for ofendido direto (CF, art. 109). Na ausência de nexo federal, a competência é estadual, ainda que autuação tenha sido feita por órgão federal.

Atividade sem licença (art. 60) exige prova de dano ambiental?

Não. O STJ qualifica o art. 60 como crime formal de mera conduta e perigo abstrato; basta provar que a atividade exigia licenciamento e que a licença era inexistente, inválida ou descumprida. Laudo de dano só é imprescindível quando o tipo exigir (ex.: certas hipóteses do art. 54 — poluição).

Quais medidas cautelares e sanções patrimoniais são admitidas?

Admite-se apreensão e perdimento de instrumentos do crime (Lei 9.605/1998, art. 25) com observância da proporcionalidade e do nexo de instrumentalidade. O STJ veda confisco sem prova de uso no ilícito ou contra proprietário de boa-fé. Na sentença penal, é possível fixar valor mínimo de reparação (CPP, art. 387, IV), inclusive por dano moral coletivo, havendo pedido e suporte probatório.

Há espaço para ANPP, transação e suspensão condicional do processo?

Sim. Pela baixa/média ofensividade abstrata de muitos tipos ambientais, são comuns transação penal e sursis processual (Lei 9.099/1995), além do ANPP (CPP, art. 28-A), inclusive com retroatividade benéfica reconhecida pelo STJ quando sem trânsito em julgado. Obrigações de recuperação ambiental, prestação pecuniária e compliance costumam integrar os acordos. Cumprimento de TAC cível pode ser valorado como circunstância favorável, sem impedir a persecução se persistir tipicidade.

Referencial normativo e jurisprudencial (Base jurídica de apoio)

  • Constituição Federal: art. 225 (meio ambiente), §3º (responsabilização penal/administrativa/civil); art. 109 (competência federal).
  • Lei 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais): arts. 3º (pessoa jurídica), 21 (penas restritivas de direitos às PJs), 25 (perdimento), 54 (poluição), 60 (atividade sem licença).
  • CPP: art. 387, IV (reparação mínima); art. 28-A (ANPP); medidas cautelares e cadeia de custódia.
  • Lei 9.099/1995: transação penal e suspensão condicional do processo.
  • Súmula 613/STJ: não aplicação do princípio da insignificância em crimes ambientais.
  • Entendimentos consolidados STF/STJ: tese de autonomia da responsabilidade penal da PJ; competência federal por interesse direto da União; proporcionalidade no perdimento; possibilidade de dano moral coletivo na fixação reparatória penal.

Considerações finais

A jurisprudência dos Tribunais Superiores busca efetividade preventiva e proporcionalidade: reforça a autonomia punitiva da pessoa jurídica, preserva a natureza formal/de perigo de vários tipos, delimita a competência federal e estimula soluções consensuais com foco em reparação e compliance. Para resultados consistentes, são cruciais provas técnicas robustas (laudos, georreferenciamento, rastreabilidade), pedidos bem calibrados e execução monitorada das decisões.

Este conteúdo é informativo e não substitui a atuação de profissional habilitado(a) — defensorias, advocacias pública ou privada e Ministério Público. Cada caso demanda análise técnica do conjunto fático-probatório, legislação local e precedentes aplicáveis, podendo requerer estratégias específicas (ANPP, TAC, perícias, medidas cautelares).

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