FGTS no Contrato Intermitente: cálculo, base e direitos na rescisão
Entenda o contrato de trabalho intermitente
O contrato intermitente é uma modalidade prevista no art. 443, §3º, da CLT, introduzida pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), em que a prestação de serviços ocorre com alternância de períodos de labor e de inatividade, com subordinação e remuneração por hora ou por tarefa. O empregado é convocado pelo empregador para trabalhar em determinados dias e horas, e recebe o pagamento ao final de cada período de trabalho, juntamente com verbas proporcionais.
Essa estrutura não transforma o trabalhador em autônomo: há vínculo de emprego, anotação em CTPS e todos os direitos mínimos. A peculiaridade é que o empregado só recebe (e o empregador só recolhe encargos) quando há efetiva prestação de serviço. Em todo período sem convocação, não há remuneração e não correm horas à disposição.
• Convocação: chamada do empregador, com antecedência mínima legal, informando data, local e duração do trabalho.
• Remuneração por período: salário/hora + adicionais devidos, pagos ao final do período trabalhado.
• Verbas proporcionais: 13º salário e férias (+1/3) calculados e pagos proporcionalmente a cada período de trabalho.
FGTS no contrato intermitente: qual é a lógica
O FGTS é devido ao empregado intermitente nas mesmas bases aplicáveis aos demais vínculos. Em síntese:
- O empregador deve depositar 8% a título de FGTS sobre a remuneração paga pelo período efetivamente trabalhado (salário-hora x horas convocadas + adicionais de natureza salarial).
- O depósito é feito na conta vinculada do trabalhador, identificada pelo PIS/Pasep.
- O recolhimento acompanha a competência do pagamento do período trabalhado, utilizando os sistemas oficiais (eSocial/SEFIP, conforme regramento vigente).
• Em intermitente, as parcelas são pagas “ao fim de cada período”. Assim, o FGTS incide sobre o que tiver natureza salarial naquele pagamento.
• Férias indenizadas (quando há rescisão) não sofrem FGTS; férias gozadas têm incidência. O 13º também possui regras próprias de incidência na competência de dezembro; quando pago de forma proporcional ao longo do ano no intermitente, observar o layout do eSocial para a base de cálculo declarada pelo empregador.
Quem recolhe, quando e como
O empregador é o responsável por apurar e recolher o FGTS. O fluxo prático costuma ser:
- Apuração ao término do período trabalhado (por exemplo, uma semana de eventos ou três dias de cobertura de loja): horas x salário-hora + adicionais.
- Pagamento das verbas ao empregado (salário do período, 13º e férias proporcionais, se devidos) e emissão dos recibos.
- Declaração no eSocial e recolhimento do FGTS até a data-limite da competência, via guia oficial.
• Manter controles de convocação e aceite do empregado (datas/horas).
• Calcular base de FGTS de forma destacada no demonstrativo, indicando o que compõe a base (salário, adicional noturno, horas extras, etc.).
• Arquivar recibos e guias de recolhimento para auditorias e reclamatórias.
Base de cálculo do FGTS no intermitente
A base de cálculo é a remuneração mensal devida ao trabalho prestado, de natureza salarial. Em termos práticos, entram na base:
- Salário-hora multiplicado pelas horas efetivamente trabalhadas no período convocado;
- Adicionais de natureza salarial (noturno, periculosidade/insalubridade, horas extras e seus reflexos);
- Descanso semanal remunerado (DSR) quando integrador da remuneração do período, conforme regras aplicáveis.
Não integram a base de FGTS as verbas de natureza indenizatória (p. ex., férias indenizadas na rescisão). Já o 13º salário possui incidência de FGTS na competência anual; quando pago proporcionalmente ao longo do ano no intermitente, o tratamento deve seguir a escrituração oficial (eventos do eSocial), para não haver recolhimentos a menor ou a maior.
FGTS do período = 8% × Remuneração salarial (salário do período + adicionais salariais + DSR integrável).
Aviso: verifique o tratamento do 13º proporcional no seu sistema de folha, pois a escrituração pode exigir guia específica/competência de dezembro.
Exemplos numéricos (cálculo passo a passo)
Cenário A – Varejo (turnos diurnos)
• Salário-hora ajustado: R$ 12,00
• Convocação: 4 dias no mês, 8 horas/dia ⇒ 32 horas
• Adicionais: não há; DSR integrável estimado: R$ 46,08 (exemplo)
Remuneração do período = 32 × 12 = R$ 384,00 + DSR R$ 46,08 ⇒ R$ 430,08.
FGTS = 8% × 430,08 = R$ 34,41.
Cenário B – Eventos noturnos com horas extras
• Salário-hora: R$ 14,00
• Horas trabalhadas: 20h, sendo 8h noturnas (+20%) e 4h extras 50%
• DSR integrável estimado: R$ 30,80
Remuneração base:
– 8h simples: 8 × 14 = R$ 112,00
– 8h noturnas: 8 × (14 × 1,2) = R$ 134,40
– 4h extras 50%: 4 × (14 × 1,5) = R$ 84,00
Subtotal = R$ 330,40 + DSR (R$ 30,80) ⇒ R$ 361,20.
FGTS = 8% × 361,20 = R$ 28,90.
Cenário | Horas | Remuneração (R$) | FGTS 8% (R$) |
---|---|---|---|
A – Varejo diurno | 32 | 430,08 | 34,41 |
B – Eventos noturnos | 20 | 361,20 | 28,90 |
Registre no holerite a composição da base de FGTS (o que entra e o que não entra), especialmente em meses com adicionais, para evitar divergências entre folha, eSocial e guias de recolhimento.
Visualização rápida (gráfico simples)
O SVG abaixo ilustra a diferença entre remuneração e depósito de FGTS nos dois cenários:
Como ficam 13º e férias no intermitente e a relação com o FGTS
No intermitente, a lei determina que, ao final de cada período trabalhado, o empregador pague também as parcelas proporcionais de férias + 1/3 e de 13º salário. Na prática, há dois cuidados:
- Férias: quando gozadas, têm natureza remuneratória (em regra, com incidência de FGTS); quando indenizadas na rescisão, não sofrem FGTS.
- 13º: a incidência do FGTS ocorre na competência anual. Se a sua folha antecipa 13º proporcional a cada período, o envio ao eSocial deve refletir corretamente a base por competência, evitando omissões ou duplicidades em dezembro.
• Calcular FGTS sobre parcelas indenizatórias por engano.
• Deixar de informar corretamente o 13º na competência de dezembro, gerando divergência entre folha e GFIP/FGTS.
• Não destacar os adicionais (noturno, horas extras), reduzindo indevidamente a base de cálculo.
Rescisão, multa de 40% e saque do FGTS no intermitente
Em caso de dispensa sem justa causa, aplica-se a multa de 40% sobre o saldo do FGTS (como nos contratos tradicionais). Em acordo de rescisão (art. 484-A da CLT), a multa é de 20% e o trabalhador pode sacar até 80% do saldo. No pedido de demissão ou justa causa, não há multa e o saque segue as hipóteses legais (desemprego por tempo, aquisição de moradia, doenças graves, saque-aniversário opcional, entre outras).
Quanto ao saque, as hipóteses do FGTS aplicam-se ao intermitente nas mesmas condições: rescisão sem justa causa, aposentadoria, saque-aniversário (opção do trabalhador), calamidade, entre outras previstas na Lei 8.036/1990 e normas da Caixa.
✓ Confirmar depósitos mensais do FGTS no extrato (app/portal).
✓ Guardar recibos de pagamento de cada período e o termo de rescisão quando houver.
✓ Avaliar a conveniência do saque-aniversário (impacta o saque em caso de demissão sem justa causa).
Direitos correlatos e documentação obrigatória
O intermitente mantém direitos fundamentais: férias anuais, 13º salário, FGTS, INSS, adicionais quando devidos, vale-transporte (se houver deslocamento), repouso semanal remunerado e anotações em CTPS. Documentos essenciais:
- Contrato escrito com identificação do valor do salário-hora, do local de prestação e das regras de convocação/aceite.
- Registros de convocação (com antecedência mínima) e aceite do empregado.
- Comprovantes de pagamento por período (holerites) e guias de recolhimento de FGTS e contribuições.
• Valor do salário-hora e base de cálculo de adicionais.
• Procedimento de convocação (prazo, meio, janela de resposta).
• Critérios de cancelamento de convocação e consequências econômicas.
• Forma e prazo de pagamento ao fim de cada período, com discriminação das verbas e FGTS.
Compliance: riscos e como evitá-los
Os principais riscos em contratos intermitentes estão ligados a fraudes de jornada e pagamentos incompletos. Exemplos: convocar e não pagar o DSR quando integrável; ignorar adicionais (noturno, hora extra); não recolher FGTS sobre toda a base salarial declarada; atrasar guias. A mitigação passa por:
- Uso de sistema de ponto apropriado aos períodos convocados;
- Conferência mensal da compatibilidade entre o que foi pago e o que foi informado ao eSocial;
- Política clara de convocação/aceite e de remarcação;
- Treinamento de líderes/gestores que realizam convocações.
• % de convocações com horas extras e adicional noturno (ajusta a base de FGTS).
• Tempo médio entre trabalho e pagamento (atrasos geram multas/encargos).
• Taxa de glosas na auditoria interna (erros de base/competência).
Perguntas práticas (sem FAQ formal)
É possível somar diferentes convocações no mês para um único recolhimento?
Sim. Na prática, a folha consolida as remunerações por competência. O que importa é que todo valor salarial pago no mês componha a base de FGTS declarada e recolhida tempestivamente.
Se o empregado recusar convocações, o FGTS é devido?
Não. Sem trabalho prestado no mês, não há remuneração e, portanto, não há base de FGTS naquele período.
Intermitente tem direito à multa de 40% na dispensa sem justa causa?
Sim. A multa de 40% incide sobre o saldo do FGTS da conta vinculada, como nos contratos tradicionais. No acordo de extinção, aplica-se a multa de 20% e regras de saque reduzido.
Conclusão: como acertar o FGTS no intermitente
Para cumprir corretamente o FGTS no contrato intermitente, empregadores devem vincular o recolhimento à remuneração do período trabalhado, apurando todos os adicionais salariais e refletindo-os na base de cálculo. O 13º proporcional e as férias exigem atenção à competência e à sua natureza (remuneratória x indenizatória) para evitar recolhimentos indevidos. Já os trabalhadores devem conferir extratos, guardar recibos e compreender quando podem sacar o saldo.
Seguindo controles de convocação, escrituração no eSocial e prazos de guia, o intermitente mantém o FGTS íntegro e alinhado às garantias legais, evitando passivos trabalhistas e assegurando a proteção do crédito do empregado.
No intermitente, o FGTS é simples: 8% sobre tudo o que for remuneração salarial do período convocado, declarado na competência correta e recolhido no prazo. O resto é organização e prova documental.
FAQ – FGTS em contrato intermitente (acordeão)
O que é contrato intermitente e qual a base legal do FGTS nessa modalidade?
O contrato intermitente é a forma de emprego em que o trabalho ocorre com alternância de períodos de prestação de serviços e inatividade, com subordinação e pagamento por período trabalhado. Está previsto no art. 443, §3º, da CLT e regulamentado pelos arts. 452-A a 452-H da CLT (Lei 13.467/2017). O FGTS é devido normalmente, conforme a Lei 8.036/1990 (especialmente art. 15, alíquota de 8%) e o Decreto 99.684/1990.
Quem recolhe o FGTS e quando deve ser feito o depósito?
O empregador recolhe o FGTS do empregado intermitente, depositando 8% sobre a remuneração do período efetivamente trabalhado na conta vinculada do trabalhador. O recolhimento segue a competência do pagamento do período laborado e deve ser feito dentro do prazo legal da competência via sistema oficial (eSocial/FGTS), como nos demais contratos.
Sobre quais verbas o FGTS incide no intermitente?
Incide sobre todas as parcelas de natureza salarial pagas no período convocado: salário-hora, horas extras e respectivos adicionais, adicional noturno, insalubridade/periculosidade, e o DSR quando integrador da remuneração. Em regra, não incide sobre verbas indenizatórias (como férias indenizadas na rescisão), observadas as regras específicas do eSocial/FGTS para 13º e férias gozadas.
Como ficam 13º e férias no intermitente em relação ao FGTS?
No intermitente, a lei permite pagar proporcionalidades ao fim de cada período trabalhado. O 13º salário possui incidência de FGTS na competência anual (tratamento declarado no eSocial). Férias gozadas integram a base do FGTS; férias indenizadas na rescisão não geram FGTS. É essencial escriturar corretamente as competências para evitar recolhimentos a menor/maior.
Na rescisão, há multa de 40% do FGTS para o intermitente? E quando é possível sacar?
Sim. Em dispensa sem justa causa, o empregador paga multa de 40% sobre o saldo do FGTS (art. 18, §1º, da Lei 8.036/1990). No acordo de rescisão (art. 484-A da CLT), a multa é de 20%. O saque segue as hipóteses da Lei 8.036/1990 (rescisão sem justa causa, aposentadoria, calamidade, saque-aniversário opcional etc.), aplicáveis também ao intermitente.
Base técnica – Fontes legais
- CLT: art. 443, §3º (contrato intermitente); arts. 452-A a 452-H (regras específicas da contratação, convocação, pagamento e documentação).
- Lei 8.036/1990 (FGTS): art. 15 (alíquota de 8%); art. 18 (multa rescisória e hipóteses); demais dispositivos sobre conta vinculada e saques.
- Decreto 99.684/1990: regulamenta a Lei 8.036/1990 e a operacionalização do FGTS.
- Constituição Federal, art. 7º, III: garantia do FGTS como direito dos trabalhadores urbanos e rurais.
- eSocial/FGTS: regras de escrituração e prazos de recolhimento por competência, inclusive para 13º e férias (manuais e atos normativos vigentes).
Nota prática: manter a composição da base de FGTS detalhada na folha (salário-hora, adicionais e DSR) e compatível com os eventos/competências declaradas no eSocial, evitando divergências entre folha, guias e extrato da conta vinculada.