Férias Anuais na CLT: regras básicas, prazos e cálculo (guia prático)
O que são as férias anuais e por que elas existem
As férias são um período de descanso remunerado garantido pela legislação trabalhista. Depois de trabalhar por um ciclo completo, a pessoa tem direito a se afastar da empresa por um tempo determinado, recebendo a remuneração correspondente, acrescida do terço constitucional. O objetivo é permitir recuperação física e mental, convivência com a família e reorganização da vida pessoal.
Na regra geral da CLT, todo empregado com vínculo tem direito a férias, inclusive quem trabalha em tempo parcial e quem recebe remuneração variável (comissões, horas extras etc.). Há apenas ajustes na forma de cálculo e na duração, conforme apontado ao longo do texto.
Período aquisitivo e período concessivo
O direito às férias nasce após o empregado cumprir um período aquisitivo de 12 meses de trabalho. Concluído esse ciclo, inicia-se o período concessivo, que são os 12 meses seguintes, dentro dos quais o empregador deve conceder as férias.
Se as férias não forem concedidas dentro do período concessivo, a CLT determina o pagamento em dobro da remuneração das férias correspondentes. Além disso, continuam devidas as férias do ciclo seguinte, o que pode acumular valores relevantes e gerar passivo trabalhista.
Duração das férias e redução por faltas injustificadas
O tempo-padrão de férias é de 30 dias para quem não teve faltas injustificadas acima dos limites legais. A CLT, porém, reduz esse tempo em caso de faltas injustificadas no período aquisitivo:
- 0 a 5 faltas: 30 dias de férias;
- 6 a 14 faltas: 24 dias;
- 15 a 23 faltas: 18 dias;
- 24 a 32 faltas: 12 dias;
- Mais de 32 faltas: sem direito a férias naquele ciclo.
Atenção: atrasos e saídas antecipadas podem ser computados como faltas conforme políticas internas e convenções. Já faltas justificadas (como atestados válidos, luto, doação de sangue, serviço eleitoral, entre outras hipóteses legais) não reduzem as férias.
Férias fracionadas (até 3 períodos)
A legislação permite fracionar as férias em até três períodos, desde que observadas duas travas:
- Um dos períodos deve ter pelo menos 14 dias corridos;
- Os demais períodos não podem ser menores que 5 dias corridos cada.
A regra vale para todas as idades (inclusive maiores de 50 e menores de 18). O fracionamento deve ser organizado de modo a não prejudicar o descanso nem a operação da empresa, e costuma ser definido em comum acordo.
Proibição de início em véspera de feriado ou do DSR
As férias não podem começar nos dois dias que antecedem feriado ou o descanso semanal remunerado (DSR). O intuito é impedir que o descanso seja “encurtado” na prática.
Exemplo simples: se o DSR da sua categoria é o domingo, as férias não podem começar na sexta nem no sábado. O início deve ser programado para outro dia.
Comunicação de férias e prazo de pagamento
O empregador deve notificar o empregado com antecedência mínima de 30 dias sobre o início do descanso, preferencialmente por escrito, com a indicação clara das datas de gozo.
Já o pagamento das férias (remuneração + 1/3 constitucional + eventuais médias) deve ser feito até 2 dias antes do início do período de fruição. Receber antes garante que o trabalhador consiga planejar o período de descanso.
O que entra na remuneração de férias
As férias são pagas com base na remuneração do empregado na data da concessão, acrescida do terço constitucional. Para quem tem remuneração variável (comissões, horas extras habituais, adicionais etc.), aplica-se a média do período de referência, conforme a CLT.
Em termos práticos, costuma-se considerar a média dos últimos 12 meses que antecedem o início das férias para compor o valor variável. Convenções e acordos coletivos podem trazer critérios específicos para o cálculo dessas médias.
Exemplo de cálculo (mensalista com salário fixo)
Imagine um salário de R$ 2.400,00, sem verbas variáveis. O valor bruto das férias será:
- Remuneração: R$ 2.400,00
- 1/3 constitucional: R$ 800,00
- Total bruto: R$ 3.200,00
Sobre esse total incidem os descontos legais (previdenciários e fiscais, conforme a faixa). O depósito de FGTS também é devido sobre férias gozadas.
Exemplo (variáveis com média)
Suponha salário fixo de R$ 1.800,00 + média de comissões de R$ 700,00 + média de horas extras de R$ 200,00. A remuneração de férias é a soma dessas parcelas:
- Base: R$ 1.800,00 + R$ 700,00 + R$ 200,00 = R$ 2.700,00
- 1/3: R$ 900,00
- Total bruto: R$ 3.600,00
Essa metodologia protege o empregado que tem variações salariais, refletindo o padrão de ganho dos últimos meses.
Abono pecuniário (venda de 1/3 das férias)
O empregado pode converter em dinheiro 1/3 do período de férias. Na prática, quem tem direito a 30 dias pode vender 10 dias, descansando os outros 20. É uma faculdade do empregado — o empregador não pode impor a venda.
O pedido deve ser feito por escrito, normalmente até 15 dias antes de terminar o período aquisitivo. O valor do abono corresponde à remuneração dos dias convertidos, observadas as mesmas bases das férias (incluindo as médias, quando houver). Na prática de folha, paga-se também o 1/3 constitucional proporcional aos dias vendidos.
Exemplo rápido: férias de 30 dias, salário-base de R$ 2.400,00. Abono de 10 dias ≈ R$ 800,00 (2.400 ÷ 30 × 10), com o terço proporcional ≈ R$ 266,67.
Férias coletivas
A empresa pode conceder férias coletivas a todos os empregados de um setor, estabelecimento ou a todo o quadro. Elas podem ocorrer em até 2 períodos anuais, e cada um não pode ser inferior a 10 dias.
É necessária comunicação prévia aos empregados e informação ao sindicato da categoria, observando prazos previstos em norma. Também se deve afixar aviso interno em local de fácil visualização e organizar a logística de pagamento até 2 dias antes do início.
Quem não completou o período aquisitivo recebe férias proporcionais, iniciando-se novo período aquisitivo a partir do retorno ao trabalho (salvo ajustes diferentes previstos em norma coletiva).
Regras especiais
Estudante menor de 18 anos
As férias devem, sempre que possível, coincidir com as férias escolares. Isso evita prejuízos acadêmicos e é uma proteção prioritária à educação do adolescente trabalhador.
Trabalho em regime de tempo parcial
O regime de tempo parcial segue as mesmas regras gerais de duração e fracionamento (até 3 períodos, 14 + 5 + 5). A remuneração e o terço são calculados sobre a remuneração do contrato de tempo parcial, com as eventuais médias.
Contrato intermitente
No contrato intermitente, a cada 12 meses o trabalhador adquire direito a um mês no qual não pode ser convocado para prestar serviços. Além disso, a remuneração do período de trabalho já costuma incluir, ao final de cada prestação, as parcelas proporcionais de férias, 13º e FGTS, conforme a lei.
Férias proporcionais na rescisão
Na rescisão do contrato, o empregado tem direito a férias proporcionais + 1/3 se ainda não tiver completado o ciclo aquisitivo. A contagem é feita em 12 avos, computando-se como mês integral geralmente quem trabalhou por 14 dias ou mais naquele mês.
Em caso de justa causa, são devidas apenas as férias vencidas (se houver). Nos demais tipos de desligamento (inclusive pedido de demissão), são pagas as proporcionais.
Doença, afastamentos e coincidências de datas
Férias não devem coincidir com períodos de afastamento previdenciário (auxílio-doença, licença-maternidade etc.). Nesses casos, as férias são remarcadas para data posterior.
Se a pessoa adoecer durante as férias, a regra geral é que não há interrupção automática. Algumas decisões admitem soluções diferentes em situações específicas (como internação), mas, como prática, recomenda-se registrar o fato e negociar remarcação quando houver amparo em norma coletiva.
Passo a passo para calcular corretamente
1) Identifique o número de dias de férias
Verifique se houve faltas injustificadas que reduzam a duração. Em caso contrário, considere 30 dias.
2) Determine a remuneração-base
Para quem é mensalista, a base é o salário mensal atualizado na data da concessão. Para quem recebe verbas variáveis, calcule a média de acordo com o período definido em lei/convênio (comum: últimos 12 meses).
3) Some o 1/3 constitucional
Sobre a remuneração de férias, acrescente o terço. Se houver abono (venda de 1/3), calcule o valor dos dias convertidos e o terço proporcional.
4) Aplique descontos legais
Desconte as parcelas previdenciárias e fiscais conforme a legislação vigente e a tabela aplicável ao trabalhador. Para fins de FGTS, as férias gozadas integram a base de depósito.
5) Observe os prazos
Efetue o pagamento até 2 dias antes do início do descanso e formalize a comunicação com antecedência mínima de 30 dias. Guarde o recibo de pagamento e a notificação de férias assinada.
Erros comuns (e como evitar)
- Atrasar o pagamento para depois do início das férias → o valor deve ser pago antes do descanso.
- Ignorar médias de comissões/horas extras → férias devem refletir a real remuneração do período.
- Forçar venda de 1/3 → o abono pecuniário é opção do empregado.
- Começar férias na véspera do DSR/feriado → a lei proíbe o início nos 2 dias anteriores.
- Não conceder dentro do período concessivo → gera pagamento em dobro e risco de ações.
- Desorganizar férias coletivas → é preciso informar empregados e sindicato, observando prazos e registros.
Checklist rápido para RH e para o trabalhador
- Período aquisitivo: 12 meses.
- Período concessivo: 12 meses seguintes.
- Duração: até 30 dias (redução por faltas injustificadas).
- Fracionamento: até 3 períodos (1 de 14+ e demais de 5+).
- Início: não pode ocorrer nos 2 dias anteriores ao DSR/feriado.
- Notificação: com 30 dias de antecedência.
- Pagamento: até 2 dias antes do início.
- Abono: empregado pode vender 1/3, mediante pedido prévio.
- Variáveis: calcular médias (comissões, extras, adicionais).
- Rescisão: pagar proporcionais + 1/3 (salvo justa causa, em que só vencidas).
Perguntas rápidas
Férias contam em dias corridos?
Sim. O período é contado em dias corridos, incluindo fins de semana e feriados, respeitada a vedação quanto ao início nos 2 dias que antecedem DSR/feriado.
Posso trabalhar em outro emprego durante as férias?
Em regra, não há proibição genérica, mas é necessário evitar concorrência desleal e cumprir eventuais cláusulas contratuais e normas coletivas. Se houver risco à saúde/segurança ou incompatibilidade com a finalidade do descanso, a empresa pode questionar.
Adicional de periculosidade/insalubridade entra no cálculo?
Se pago de forma habitual e integrar a remuneração, a prática é considerar a parcela (ou sua média) no cálculo de férias.
Se a empresa pagar as férias em atraso, há dobra?
O que gera dobra, por lei, é não conceder as férias dentro do período concessivo. Quanto a pagamento fora do prazo (2 dias antes), decisões recentes afastam a ideia de “dobra automática”, ficando a discussão sujeita a outras penalidades legais. Recomenda-se cumprir os prazos à risca.
Posso fracionar todo ano?
Sim, desde que respeitados os mínimos (14 + 5 + 5) e que o fracionamento não seja usado para esvaziar a finalidade de descanso. Boas práticas sugerem negociar com antecedência.
Boas práticas para evitar conflitos
- Planeje férias com calendário anual por setor, equilibrando demandas de produção e direitos.
- Formalize tudo por escrito: aviso, pedido de abono, períodos fracionados.
- Padronize cálculos (médias, adicionais) e valide com normas coletivas.
- Faça o pagamento até 2 dias antes e colete recibo de quitação.
- Respeite regras específicas de menores, tempo parcial e intermitente.
“`0
