Arbitragem, Mediação ou Conciliação? Entenda a Diferença e Escolha o Caminho Certo
No Brasil, três métodos extrajudiciais lideram a resolução eficiente de disputas: arbitragem, mediação e conciliação. Todos integram a política pública de tratamento adequado de conflitos (modelo “multiportas”), mas não são a mesma coisa. Mudam a lógica, quem conduz, o tipo de resultado, a forma de iniciar e até os custos. A seguir, um guia técnico e prático para escolher o caminho certo.
Conceitos essenciais e diferenças nucleares
Arbitragem
Mecanismo privado em que as partes, por convenção arbitral (cláusula compromissória ou compromisso), delegam a decisão a um árbitro ou tribunal arbitral. O árbitro é juiz de fato e de direito; profere sentença arbitral com os mesmos efeitos de sentença judicial, que pode ser executada como título executivo judicial. Aplica-se a direitos patrimoniais disponíveis (em regra, relações empresariais, contratos complexos, M&A, construção, mercado de capitais). Em regra é confidencial, mais célere e técnica; admite medidas de urgência (pelo Judiciário antes ou pelo próprio tribunal depois da instituição).
Mediação
Procedimento autocompositivo em que um mediador imparcial facilita o diálogo para que as próprias partes construam a solução. É indicado quando há vínculo continuado (societário, familiar, vizinhança, sucessório, consumo duradouro) e quando o conflito envolve interesses, emoções ou comunicação rompida. O acordo é voluntário, pode ser extrajudicial (título executivo extrajudicial) e, se homologado, vira título executivo judicial. O mediador não impõe proposta; trabalha com interesses subjacentes, confidencialidade e decisão informada.
Conciliação
Procedimento autocompositivo mais diretivo, adequado a conflitos pontuais e objetivos (ex.: dívida, pequeno contrato, dano simples). O conciliador pode sugerir propostas para aproximação, sem decidir. É muito usada nos CEJUSCs e audiências iniciais do CPC. O acordo pode ser formalizado e homologado, com eficácia de título executivo judicial.
Quando usar cada método — cenários típicos
- Contratos de alto valor e alta complexidade (engenharia, societário, energia, construção, infraestrutura).
- Necessidade de decisor técnico e sigilo.
- Urgência em solução final (sentença executável sem duplo grau obrigatório).
- Disputas internacionais (enforcement com base na Convenção de Nova Iorque/1958).
- Relações continuadas que precisam sobreviver à disputa (sócios, família, vizinhos, fornecedores-chave).
- Controvérsias com interesses múltiplos e comunicação tensa.
- Busca de soluções criativas (trocas, cronogramas, novas regras de convivência) fora do binário ganhar/perder.
- Cobranças e danos simples com valores objetivos.
- Casos de consumo e pequenas causas em que uma proposta concreta resolve.
- Etapa inicial processual (audiência do art. 334 do CPC) para tentativa rápida de acordo.
Como se inicia cada um
Arbitragem — convenção arbitral
- Cláusula compromissória: prevista no contrato; em caso de litígio, envia-se a disputa à câmara indicada. Evite cláusulas “patológicas” (sem instituição, regras ou sede).
- Compromisso arbitral: firmado após o litígio, definindo regras, sede, idioma, número de árbitros e instituição.
- Medidas de urgência: antes da instituição, ao Judiciário; depois, ao tribunal arbitral (art. 22-A da Lei de Arbitragem).
Mediação — termo de mediação
- As partes assinam um termo de mediação (extrajudicial ou judicial/CEJUSC) com regras de confidencialidade e calendário.
- O mediador auxilia a identificar interesses, mapear opções e construir o acordo.
Conciliação — convite ou designação
- No Judiciário, o CPC prevê audiência de conciliação/mediação (art. 334) antes da contestação, salvo exceções.
- Em CEJUSCs e Procons, pode ocorrer por convite com pauta curta e proposta objetiva.
Quem decide e qual o resultado
Método | Quem decide | Resultado | Execução |
---|---|---|---|
Arbitragem | Árbitro / Tribunal Arbitral | Sentença arbitral (coisa julgada entre as partes) | Título executivo judicial (CPC, art. 515, VII; Lei 9.307/1996) |
Mediação | As partes | Acordo autocompositivo | Extrajudicial (título extrajudicial) ou judicial (homologado → título judicial) |
Conciliação | As partes (com propostas do conciliador) | Acordo objetivo | Em regra homologado pelo juiz → título executivo judicial |
Princípios e garantias por método
- Kompetenz-Kompetenz e separabilidade da convenção (o árbitro decide sua própria competência e a cláusula vive independente do contrato).
- Imparcialidade dos árbitros, contraditório, ampla defesa e devido processo arbitral.
- Confidencialidade (salvo convenção em contrário ou necessidade de tutela judicial).
Mediação
- Voluntariedade, autonomia da vontade, imparcialidade, confidencialidade, boa-fé e decisão informada.
- O mediador não julga nem impõe — facilita a construção de opções.
Conciliação
- Imparcialidade, independência, isonomia e busca de solução célere, com propostas do conciliador quando útil.
Tempo, custos, sigilo e exequibilidade
- Tempo: arbitragem costuma durar 6–18 meses em câmaras estruturadas; mediação pode encerrar-se em poucas sessões; conciliação, em uma única audiência.
- Custos: arbitragem envolve taxas e honorários do tribunal (proporcionais ao valor da causa) e custos periciais; mediação e conciliação tendem a ser mais baratas (especialmente em CEJUSCs).
- Sigilo: regra na arbitragem e usual na mediação; conciliação judicial é pública quanto ao processo, mas o conteúdo negociado pode ser preservado.
- Exequibilidade: sentença arbitral é executada como judicial; acordos de mediação/conciliação homologados têm a mesma força; extrajudiciais são títulos executivos extrajudiciais (execução própria).
Etapas práticas — checklists rápidos
Para incluir arbitragem no contrato
- Defina instituição (câmara), regras, sede, número de árbitros (1 ou 3), idioma e direito aplicável.
- Designe matérias arbitráveis (patrimoniais disponíveis) e exceções (tutelas urgentes, questões não arbitráveis).
- Preveja confidencialidade, alocação de custos e regras de produção de provas.
- Evite cláusulas “patológicas” (sem instituição/sede/idioma) e conflitos com contratos coligados.
Para iniciar uma mediação eficaz
- Escolha mediador qualificado e aceite um termo de mediação com confidencialidade.
- Mapeie interesses, opções e BATNA (melhor alternativa ao acordo).
- Leve poderes para transigir e informações suficientes para decisão informada.
Para uma conciliação objetiva
- Leve cálculos e documentos-chave prontos.
- Peça propostas concretas com prazos e formas de pagamento.
- Redija termos de acordo claros (obrigações, prazos, multa, foro), e busque homologação.
Riscos e erros comuns — e como evitá-los
- Arbitragem de matéria indisponível: pode gerar nulidade. Cheque arbitralidade (direitos patrimoniais disponíveis).
- Cláusula compromissória vaga: sem instituição/sede/idioma → litígio sobre a própria cláusula. Use modelos institucionais.
- Falta de poderes do preposto em mediação/conciliação: paralisa o procedimento e mina a confiança.
- Violação à confidencialidade: expõe estratégias e inviabiliza acordos futuros.
- Due process ignorado na arbitragem: pode ensejar ação anulatória (vícios do art. 32 da Lei 9.307/1996).
Base normativa e referências essenciais
- Lei 9.307/1996 (Lei de Arbitragem), alterada pela Lei 13.129/2015 — árbitro como juiz de fato e de direito; efeitos e execução da sentença arbitral; medidas de urgência; ação anulatória (art. 32); Kompetenz-Kompetenz e separabilidade (art. 8º).
- Lei 13.140/2015 (Lei de Mediação) — princípios (voluntariedade, imparcialidade, confidencialidade, decisão informada), mediação judicial e extrajudicial.
- CPC/2015 — arts. 3º, §2º e §3º (estímulo à solução consensual), 165–175 (mediação/conciliação), 334 (audiência inicial), 515, VII (sentença arbitral como título executivo judicial).
- Resolução CNJ 125/2010 — política judiciária de tratamento adequado dos conflitos (CEJUSCs).
- Convenção de Nova Iorque/1958 — reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras.
Encerramento prático
Arbitragem, mediação e conciliação não competem entre si; são ferramentas complementares para diferentes problemas. Contratos robustos se beneficiam de cláusulas escalonadas e bem redigidas; litígios complexos ganham com árbitros técnicos; relações duradouras pedem mediação; conflitos pontuais resolvem-se na conciliação. Em todos os casos, respeite princípios de imparcialidade, contraditório, boa-fé e confidencialidade. Com método certo, o sistema é mais rápido, barato e previsível — e a solução tende a ser melhor para todos.
Guia rápido: Arbitragem × Mediação × Conciliação
Três caminhos extrajudiciais resolvem conflitos com eficiência, cada um com lógica própria:
arbitragem (terceiro decide), mediação (partes decidem com ajuda) e
conciliação (terceiro sugere proposta para as partes decidirem). Use este guia de bolso
para escolher e preparar o procedimento certo antes de avançar para a FAQ.
1) Para que serve cada método
- Arbitragem — ideal para contratos de alto valor/complexidade (direitos patrimoniais disponíveis), necessidade de sigilo, decisão técnica e executável como sentença judicial.
- Mediação — indicada quando há relação continuada (sócios, família, vizinhança, fornecedores estratégicos), comunicação rompida e interesse em soluções criativas preservando o vínculo.
- Conciliação — melhor para disputas pontuais e objetivas (cobranças, pequenos contratos, consumo), quando uma proposta concreta pode encerrar a controvérsia em pouco tempo.
2) Escolha rápida (árvore de decisão)
- Preciso de decisão final e vinculante por especialista? → Vá de arbitragem.
- Quero preservar a relação e construir solução conjunta? → Procure mediação.
- É um conflito simples, com valor definido? → Tente conciliação (CEJUSC/Procon).
3) Como iniciar cada procedimento
- Arbitragem — verifique se há cláusula compromissória no contrato; se não houver, firmem compromisso arbitral definindo câmara, sede, regras, idioma, número de árbitros e custos. Medidas urgentes: juiz antes da instituição, árbitro depois.
- Mediação — assinem termo de mediação (extrajudicial ou via CEJUSC); escolham mediador, calendários e regras de confidencialidade.
- Conciliação — solicite sessão no CEJUSC ou aguarde audiência inicial do processo (art. 334 do CPC). Leve proposta objetiva e documentos.
4) Tempo, custos, sigilo e resultado
Método | Duração típica | Custos | Sigilo | Resultado |
---|---|---|---|---|
Arbitragem | 6–18 meses | Mais altos (taxas/câmara, árbitros, perícias) | Regra geral: confidencial | Sentença arbitral (título executivo judicial) |
Mediação | Semanas a poucos meses | Baixos/moderados | Confidencial | Acordo das partes (pode ser homologado) |
Conciliação | Horas a dias | Baixos (CEJUSC/Procon) | Processo geralmente público | Acordo objetivo (homologável) |
5) Preparação prática (checklists)
- Arbitragem: defina câmara, sede, regras, idioma, nº de árbitros; junte contrato, garantias, provas e perícias; organize estratégia de medidas urgentes e de confidencialidade; confirme arbitralidade (direitos patrimoniais disponíveis).
- Mediação: mapeie interesses, limites, alternativas (BATNA), opções de troca; leve poderes para transigir e dados para decisão informada.
- Conciliação: leve cálculos, documentos e minuta de acordo com prazos, multas e forma de pagamento; peça homologação para título judicial.
6) Erros comuns que derrubam resultados
- Cláusula arbitral “patológica” (sem câmara/sede/idioma): gere litígios sobre a própria cláusula.
- Matéria não arbitrável: pode levar à nulidade da sentença arbitral.
- Falta de poderes do representante em mediação/conciliação: inviabiliza acordo.
- Quebra de confidencialidade na mediação/arbitragem: destrói confiança e estratégia.
- Propostas vagas na conciliação: redija termos claros e executáveis.
preservam relações e reservam a decisão final para o que realmente sobrar de controvérsia.
FAQ — Diferença entre arbitragem, mediação e conciliação
1) Qual é a diferença essencial entre arbitragem, mediação e conciliação?
Arbitragem: um árbitro (ou tribunal arbitral) decide o caso e profere sentença obrigatória. Mediação: um mediador facilita o diálogo para que as partes construam elas mesmas o acordo. Conciliação: o conciliador conduz a conversa e propõe soluções objetivas; as partes aceitam ou não.
2) Quando escolher arbitragem em vez de mediação ou conciliação?
Quando você precisa de decisão vinculante, técnica, sigilosa e executável como sentença judicial em disputas de direitos patrimoniais disponíveis (contratos empresariais, M&A, construção, energia, tecnologia).
3) Em que situações a mediação funciona melhor?
Em conflitos com relação continuada (societário entre sócios, contratos de longo prazo, vizinhança, família, saúde), em que a prioridade é preservar o vínculo, restabelecer comunicação e criar soluções criativas de ganho mútuo.
4) E a conciliação, quando é indicada?
Para controvérsias pontuais e objetivas (cobrança, pequenos contratos, consumo), nas quais uma proposta concreta pode encerrar rapidamente o litígio — por exemplo via CEJUSC/Procon ou audiência inicial do processo.
5) A sentença arbitral tem a mesma força de uma sentença judicial?
Sim. A sentença arbitral é título executivo judicial e pode ser executada no Judiciário se houver inadimplemento. Anulação é excepcional (v.g., incapacidade, violação do compromisso, matéria não arbitrável, ofensa ao contraditório).
6) Os procedimentos são confidenciais?
Em regra, arbitragem e mediação são confidenciais (salvo convenção em contrário ou necessidade legal de divulgação). A conciliação costuma acontecer em processos públicos, embora o teor de tratativas possa ser resguardado.
7) Preciso de cláusula específica para usar arbitragem ou mediação?
Para arbitragem, prefira cláusula compromissória no contrato; sem ela, ainda é possível firmar compromisso arbitral posterior. Para mediação, uma cláusula de mediação (ou cláusula escalonada: negociação → mediação → arbitragem) dá previsibilidade e reduz custos.
8) Quanto tempo e quanto custa cada método?
Arbitragem: 6–18 meses, custos mais altos (câmara, árbitros, perícias). Mediação: semanas a poucos meses, custos baixos/moderados. Conciliação: horas a dias, custos baixos (muitas vezes gratuitos em CEJUSC/Procon).
9) O acordo obtido em mediação ou conciliação é executável?
Sim. O acordo pode ser homologado judicialmente (ou pela própria câmara, quando cabível) e vira título executivo judicial; sem homologação, normalmente já é título executivo extrajudicial se atender aos requisitos legais.
10) E se a outra parte não comparecer ou não quiser participar?
Na mediação/conciliação, sem adesão espontânea é difícil avançar (salvo quando a audiência é obrigatória no processo). Na arbitragem, havendo cláusula válida, a ausência injustificada não impede a instauração; o procedimento segue e a sentença é válida, respeitado o contraditório.
📘 Matriz Jurídica — Arbitragem, Mediação e Conciliação
1) Conceitos e escopo
- Arbitragem: jurisdição privada para direitos patrimoniais disponíveis; decisão final pelo(s) árbitro(s) com força de sentença judicial.
- Mediação: procedimento voluntário, confidencial e autocompositivo em que o mediador facilita o diálogo; as partes constroem a solução.
- Conciliação: terceiro propõe soluções de forma mais diretiva para disputa geralmente pontual.
2) Uso adequado
- Arbitragem: contratos complexos e técnicos (construção, M&A, energia, tecnologia), necessidade de decisão vinculante e sigilo.
- Mediação: relações continuadas ou sensíveis (societário, saúde, parcerias) em que se busca preservar o vínculo.
- Conciliação: conflitos de baixo a médio valor, objetivos e documentados (consumo, cobrança, locação).
3) Regras-chave e garantias
- Competência-competência na arbitragem: o árbitro decide sobre sua própria competência; intervenção judicial é subsidiária.
- Cláusula compromissória deve ser clara; em contrato de adesão, precisa de destaque e ciência do aderente.
- Contraditório, isonomia e imparcialidade aplicam-se a todos os métodos (regras do rito + princípios da boa-fé).
- Sigilo predomina na mediação; informações não podem ser usadas em juízo (salvo exceções legais).
4) Efeitos e executividade
- Sentença arbitral (art. 31, Lei 9.307/1996) = título executivo judicial; anulação apenas por hipóteses do art. 33.
- Termo de mediação (art. 30, Lei 13.140/2015) = título executivo extrajudicial; homologação judicial é possível/útil em certos cenários.
- Acordo de conciliação homologado = título executivo judicial (CPC, art. 515 II–III).
📚 Fontes legais (base normativa)
- Lei 9.307/1996 (Arbitragem): arts. 1º, 3º–7º, 18, 21–22, 31, 33, 34+ (sentença estrangeira).
- Lei 13.140/2015 (Mediação): arts. 1º–2º (princípios), 3º, 9º–14, 30–32 (título e sigilo).
- CPC/2015: art. 3º §§2º–3º; arts. 165–175 (CEJUSCs), 334 (audiência), 515 e 784 (títulos executivos).
- Resolução CNJ 125/2010: política pública de autocomposição (estrutura/fluxo dos CEJUSCs).
- Convenção de Nova Iorque/1958 (Dec. 4.311/2002): reconhecimento/execução de sentenças arbitrais estrangeiras.
🛠️ Modelo de cláusula escalonada (resumo)
- Negociação direta por
30 dias
. - Mediação institucional (câmara, regras, local e idioma).
- Arbitragem final e vinculante (nº de árbitros, sede, direito aplicável, sigilo, custas).
✅ Checklist rápido
- É patrimonial disponível? → pode ir para arbitragem.
- Precisa preservar a relação? → priorize mediação.
- Questão pontual e documental? → conciliação.
- Formalize a convenção (cláusula/compromisso) e documente o procedimento.
🔚 Fechamento Operacional
Para contratos estratégicos, recomende cláusula multi-step e defina instituição, sede, idioma, n.º de árbitros e direito aplicável.
Em disputas recorrentes com clientes/fornecedores, mediação inicial reduz atritos e custos.
Para demandas simples, utilize CEJUSC/Procons e preserve executividade por termos formais.