Arbitragem e mediaçãoDireito empresárial

Custos da Arbitragem: Saiba Quem Paga e Como o Tribunal Define as Despesas

Panorama geral dos custos na arbitragem

A pergunta “quem paga a arbitragem?” quase nunca tem resposta binária. Ao contrário do processo judicial, cujas custas estão mais padronizadas, a arbitragem reúne múltiplos componentes de preço (taxas institucionais, honorários de árbitros e peritos, despesas operacionais, honorários advocatícios, traduções, viagens e eventuais medidas de urgência). O regime de alocação desses custos é moldado por três fatores principais: (i) o contrato e a cláusula compromissória; (ii) o regulamento da câmara arbitral escolhida; e (iii) a decisão do tribunal arbitral ao final, que aplica critérios de sucumbência, causalidade e conduta processual.

No Brasil, a Lei nº 9.307/1996 confere liberdade às partes para disciplinar a matéria, e determina que os árbitros decidam sobre a responsabilidade pelas despesas do processo arbitral e seus honorários (art. 27). Em regra, as partes adiantam os custos na fase inicial, segundo tabelas da instituição administradora (ou orçamento em arbitragens ad hoc), e o tribunal, na sentença final, distribui quem arca, em definitivo, com cada parcela — usualmente com a lógica do “perdeu, pagou”, mas com espaço para ajustes proporcionais e penalidades por conduta (ex.: resistência infundada, incidentes protelatórios).

Componentes do custo: do protocolo à sentença

1) Taxa de registro e administração

A maior parte das câmaras cobra uma taxa de registro (filing fee), paga por quem inicia o procedimento, para cobrir o exame preliminar, notificações e administração inicial do caso. Em seguida, calculam-se as taxas administrativas progressivas com base no valor da disputa (quantum em reais ou dólares/euros). Quanto mais complexo e alto o valor, maior a faixa da tabela. Em arbitragens ad hoc, esses custos administrativos são substituídos por despesas operacionais diretas (secretaria, local, registros, plataformas digitais), definidas por orçamento.

2) Honorários dos árbitros

Em arbitragens institucionais, os honorários costumam ser parametrizados por tabelas; em ad hoc, são negociados com os árbitros, por hora ou por montante. A composição do tribunal (árbitro único x tribunal de três membros) eleva ou reduz sensivelmente o custo. Também impactam: número de audiências, volume probatório, incidentes (ex.: competência-competência, produção de prova técnica), e necessidade de escrita e revisões de decisões parciais (procedural orders, partial awards).

3) Perícias, tradução e tecnologia

Disputas que envolvem engenharia, construção, energia, M&A ou valuation, frequentemente exigem peritos (do tribunal ou das partes), além de assistentes técnicos. Em casos internacionais, traduções juramentadas e interpretação simultânea em audiência elevam as despesas. Hoje, plataformas de e-discovery e data rooms, além de ferramentas de transcrição e audiência virtual, integram o orçamento.

4) Honorários advocatícios

Embora não sejam custos “da arbitragem” de maneira estrita, os honorários das equipes jurídicas representam parcela significativa do dispêndio global. Eles podem ser fixos, por hora, por stages (fases), success fee ou combinações. A sentença arbitral pode impor reembolso desses honorários, total ou parcial, à parte vencida, dependendo do regulamento aplicável e dos critérios do tribunal.

5) Medidas de urgência e árbitro de emergência

Caso o contrato preveja ou o regulamento permita, as partes podem acionar um árbitro de emergência antes da constituição do tribunal, para tutelas cautelares. Há taxas próprias (mais elevadas por sua celeridade), além de adiantamentos específicos. Na ausência, recorre-se ao Poder Judiciário para tutelas provisórias, com custas judiciais correspondentes — sem impedir a arbitragem de seguir no mérito.

Quem adianta e quem paga no final

Adiantamentos (depósitos) durante o procedimento

Via de regra, a instituição emitirá uma planilha de adiantamentos (advance on costs) a ser paga pro rata por ambas as partes (autor e ré), em percentuais iguais ou segundo diretrizes do regulamento. Se houver reconvenção, muitas câmaras calculam adiantamento separado para o valor reconvindo, cabendo à parte reconvinte aportar sua cota. Em caso de inadimplência de uma parte, a outra pode suprir o valor para evitar suspensão ou extinção do processo — sem prejuízo de reembolso na sentença final.

Distribuição final dos custos (costs follow the event?)

A Lei de Arbitragem brasileira confere ao tribunal ampla margem para fixar quem arcará com as despesas e com os honorários dos árbitros (art. 27). Os regulamentos institucionais em geral adotam o princípio de que a parte vencida arca com as despesas do procedimento e honorários de sucumbência, salvo se o tribunal entender mais adequado aplicar distribuição proporcional ao grau de êxito/insucesso (apportionment) e/ou à conduta processual (litigância de má-fé, resistência injustificada, descumprimento de ordens).

QUADRO-RESUMO — Alocação típica:

  • Adiantamentos: em regra, 50/50 entre autor e ré; reconvenção gera adiantamento próprio.
  • Sentença:
    • Vencedor claro: costuma obter costs shifting integral (vencido reembolsa taxas, honorários de árbitros e parte substancial dos honorários advocatícios).
    • Vitória parcial: rateio proporcional por “temas” ou percentuais; o tribunal pode compensar.
    • Mau comportamento processual: pode levar a sanções em custos, mesmo à parte vencedora no mérito.

O que influencia o “quanto” a arbitragem vai custar

Valor da causa e complexidade

As tabelas de câmaras arbitrais escalam conforme o valor econômico em disputa e a complexidade: número de pedidos, documentos, perícias, testemunhas, audiências e incidentes processuais. Disputas técnicas (construção, óleo e gás, infraestrutura, societário) tendem a custos altos, notadamente por perícias volumosas e múltiplos especialistas.

Arquitetura do tribunal (1 x 3 árbitros)

Tribunal com três árbitros aprimora a percepção de legitimidade e a discussão colegiada, mas triplica a rubrica de honorários arbitrais. Para controvérsias de baixo a médio valor, avaliar a viabilidade de árbitro único pode reduzir custos sem sacrificar qualidade, especialmente em matérias de baixa complexidade probatória.

Gestão processual e tecnologia

Procedural orders eficientes, limitação de temas, calendário enxuto, audiências virtuais e uso criterioso de prova pericial reduzem tempo e custo. Adoção de hot-tubbing (oitiva simultânea de peritos), regras IBA para produção de documentos e redlines iterativos nos termos de referência também trazem eficiência.

Estimativas e cenários de orçamento

Sem tabelas numéricas específicas, é possível projetar faixas percentuais do custo procedimental (excluídos honorários advocatícios), tomando como referência práticas de mercado:

  • Taxas administrativas: ~10% a 25% do custo procedimental.
  • Honorários de árbitros: ~45% a 70% (a depender de 1 ou 3 árbitros e da duração).
  • Perícias, intérpretes, estenotipia, logística: ~15% a 35%.
  • Árbitro de emergência (se acionado): fee fixo adicional + adiantamento específico.

VISUALIZAÇÃO (proporções aproximadas)

Taxas adm.   | 10–25%
Árbitros      | 45–70%
Perícias/log.| 15–35%

Mecanismos para mitigar e gerenciar custos

Cláusulas de custo e de eficiência

As partes podem pré-acordar parâmetros de custo: árbitro único até certo valor; limites para oitivas e páginas; mediação prévia obrigatória; custos seguem a sucumbência como ponto de partida; sanções por condutas dilatórias. Tais cláusulas devem ser compatíveis com o regulamento da câmara.

Orçamentação faseada (staged budgets)

Solicitar que o tribunal adote case management conference inicial com orçamento por fases (memoriais iniciais, documentos, perícia, audiência, memoriais finais) e revisões periódicas melhora a previsibilidade. Ferramentas de escopo de prova (quais issues exigem prova técnica?) reduzem perícias sobre temas irrelevantes.

Financiamento por terceiros (third-party funding)

Em certos casos, um funder pode financiar custas e honorários em troca de parte do resultado. O tema envolve disclosure (para evitar conflitos do tribunal) e, a depender do regulamento, security for costs pode ser exigido da parte financiada. Trata-se de ferramenta útil quando a parte tem bom caso e limitações de caixa.

Adiantamento em caso de multiparte e reconvenção

Em litígios com múltiplos autores ou rés, a instituição costuma ratear adiantamentos por lados (sides) ou indivíduos, conforme o regulamento. Inadimplemento de uma co-parte pode obrigar as demais a assumirem a cota para evitar paralisação. Reconvenções substanciais geram segundo cálculo de custas; alguns regulamentos autorizam separar demandas para não travar o caso principal.

Critérios de condenação em custas na sentença arbitral

Na prática, vê-se uso de três critérios-chaves:

  1. Sucumbência — custos seguem o resultado (quem perde paga). É a base de referência.
  2. Causalidade — responsabiliza quem deu causa a gastos desnecessários (ex.: incidentes improcedentes, recusa a perícia essencial, ausência em audiência).
  3. Conduta processual — incentiva boa-fé e cooperação; sanções econômicas por “guerra de atrito”.

O tribunal deve fundamentar a distribuição de custos, indicando as rubricas (taxas, árbitros, perícia, estenotipia, tradução, viagem, locação de sala) e percentuais ou valores exatos. Em casos de vitória mista, é comum dividir por temas ou pedidos, imputando custos específicos a quem fracassou naquele ponto.

BOAS PRÁTICAS PARA O “CUSTOS FINAIS”

  • Apresentar planilha de custos atualizada com notas fiscais e recibos.
  • Requerer reembolso de honorários advocatícios com base no regulamento e prática do tribunal.
  • Sugerir metodologia de rateio (por issues/pedidos) em casos de vitória parcial.
  • Invocar conduta da parte oposta para ajustar a distribuição (protelatórios, não cooperação, resistência infundada).

Riscos de não pagamento dos adiantamentos

Se uma parte não paga sua cota dos adiantamentos, o regulamento normalmente permite: (i) suspender prazos; (ii) permitir que a outra parte cubra o montante, preservando direito de reembolso; (iii) extinguir pedidos (em especial reconvenções); ou (iv) prosseguir apenas com o que está custeado. É recomendável avaliar o risco de crédito da contraparte e, se necessário, pleitear security for costs (garantia para custas e honorários) quando houver indícios de insolvência ou abuso.

Aspectos tributários e cambiais

Honorários de árbitros e serviços (tradução, intérpretes, transcrição) podem sofrer incidência tributária conforme a natureza do prestador (pessoa física/jurídica, ISS, IRRF) e o local de sua residência fiscal. Em arbitragens com prestadores estrangeiros, atentar a retenções na fonte, câmbio e tratados para evitar bitributação, além de políticas internas de compliance e ESG da instituição.

Comparativo qualitativo entre modelos de gestão de custo

Modelo Vantagens Riscos/Cuidados Quando usar
Árbitro único Menor custo e maior agilidade decisória. Dependência de um único julgador; menos deliberação. Causas até médio valor e baixa complexidade técnica.
Tribunal tríplice Maior colegialidade e percepção de legitimidade. Custo mais elevado e agendas mais complexas. Alto valor e temas técnicos/societários sensíveis.
Perícia do tribunal Maior imparcialidade técnica. Custo significativo; debates sobre escopo. Quando a controvérsia depende de prova especializada central.
Hot-tubbing Confronto técnico eficiente; reduz audiência. Necessita árbitros e peritos experientes no formato. Temas de engenharia, construção e finanças.

Cláusulas contratuais úteis para custo

Exemplo 1 — Sucumbência como regra

“As custas e despesas do procedimento arbitral, incluindo taxas, honorários dos árbitros, peritos e despesas administrativas, serão suportadas pela parte vencida, conforme determinado na sentença arbitral, podendo o tribunal arbitral ajustar a distribuição de acordo com o grau de êxito e a conduta processual das partes.”

Exemplo 2 — Eficiência e limitação de escopo

“As partes concordam em um tribunal arbitral composto por árbitro único para disputas até R$ 10.000.000; audiências preferencialmente virtuais; perícia limitada aos pontos essenciais definidos pelo tribunal; e orçamentação faseada com revisão a cada case management conference.”

Checklist prático para planejar e controlar custos

  • Confirmar regulamento aplicável e tabela de custas da câmara.
  • Definir estratégia de composição do tribunal compatível com o valor/complexidade.
  • Solicitar cronograma e escopo de prova na primeira CMC.
  • Avaliar mediação pré-arbitragem e janelas de negociação.
  • Planejar perícia: termos de referência, hot-tubbing, cronograma e orçamento.
  • Controlar traduções e interpretação (usar bilíngue quando possível).
  • Preparar planilha de custos e comprovações desde o início.
  • Prever funding ou garantias (security for costs) quando adequado.
SIMULAÇÃO DIDÁTICA (valores ilustrativos)
Disputa de R$ 20 milhões, tribunal com 3 árbitros, perícia única e 1 audiência de 2 dias:

  • Taxas administrativas (faixa média): R$ 250 mil
  • Honorários dos árbitros: R$ 1,2 milhão
  • Perícia e estenotipia: R$ 300 mil
  • Tradução e plataforma: R$ 80 mil
  • Total procedimental: R$ 1,83 milhão (excluídos honorários advocatícios)

Obs.: números meramente pedagógicos; use a tabela da instituição e orçamento real.

Quando a arbitragem vale a pena, apesar do custo

Para disputas de alto valor, com necessidade de especialização técnica, confidencialidade e previsibilidade de execução internacional (Convenção de Nova Iorque), a arbitragem tende a compensar, inclusive sob o prisma de custos, se comparada à morosidade e incerteza de múltiplas demandas judiciais. Além disso, a possibilidade de cost shifting (reembolso de custos) é incentivo econômico relevante para a parte com boa probabilidade de êxito.

Casos especiais: emergência, bifurcação e decisões parciais

Pedir bifurcação (competência/ mérito; responsabilidade/quantum) pode reduzir custos se a fase inicial resolver o litígio ou delimitar as questões centrais. Por outro lado, a bifurcação pode duplicar audiências e memoriais. Medidas de urgência demandam taxa própria, mas podem evitar danos irreparáveis que tornariam a arbitragem inútil. Partial awards agregam tempo de redação, mas podem encurtar o caminho probatório.

Boas práticas para pedido de custo na fase final

  • Apresentar sumário executivo do pedido de custos (tabelado por rubrica, fase e “issue”).
  • Indicar base jurídica (Lei 9.307/1996 e regulamento aplicável) e princípios (sucumbência, causalidade, conduta).
  • Anexar comprovantes (invoices, recibos, contratos) e demonstrar razoabilidade.
  • Argumentar sobre conduta da contraparte e impacto em tempo/custo do processo.

Conclusão

O custo da arbitragem não é um “número único”, mas o resultado de escolhas: instituição, composição do tribunal, desenho processual, escopo de prova e até linguagem e local da arbitragem. Em linha com a Lei 9.307/1996, a regra prática é: as partes adiantam conforme o regulamento; o tribunal decide, ao final, quem arcará com a conta, aplicando sucumbência com ajustes pela causalidade e pela conduta processual. Uma gestão ativa — cláusulas bem redigidas, case management rigoroso, foco no cerne probatório e transparência de orçamentos — controla riscos e potencializa a recuperação de custos pela parte com razão. Para quem planeja, a pergunta “quem paga?” deixa de ser um acaso e passa a ser uma estratégia.

Perguntas frequentes sobre custos na arbitragem


Em regra, as partes adiantam os custos conforme planilha da câmara (advance on costs), normalmente em proporções iguais. Havendo reconvenção, costuma-se calcular adiantamento separado para o valor reconvindo. Se uma parte não paga, a outra pode cobrir para evitar suspensão/extinção, preservando direito de reembolso na sentença final (Lei 9.307/1996, art. 27, e regulamentos institucionais).


A sentença arbitral define a distribuição final dos custos. O padrão é a sucumbência (“quem perde, paga”), ajustada por grau de êxito (vitória parcial) e conduta processual (ex.: incidentes infundados). Podem ser reembolsados: taxas, honorários dos árbitros, perícias, traduções, stenotipia e, quando previsto/aplicável, honorários advocatícios.


  • Taxa de registro e administração (tabelas da câmara, por valor da causa).
  • Honorários dos árbitros (parâmetros da câmara ou negociação ad hoc; 1 x 3 árbitros).
  • Perícia, assistentes técnicos, interpretação/tradução e tecnologia.
  • Árbitro de emergência e medidas de urgência (taxas específicas).
  • Honorários advocatícios (podem ser reembolsados na sucumbência, a critério do tribunal e do regulamento aplicável).


  • Prever árbitro único até certo valor de causa.
  • Definir limites de prova e bifurcação quando encurtar o litígio.
  • Adotar audiências virtuais e hot-tubbing de peritos.
  • Usar orçamento faseado (CMC inicial e revisões).
  • Inserir cláusulas de custos seguem a sucumbência e sanções por conduta dilatória.


Os regulamentos costumam permitir que a câmara suspenda prazos, determine complementação pela parte adimplente (com reserva de reembolso) ou até extinga pedidos específicos (ex.: reconvenção). Em situações de risco de crédito, pode-se pleitear security for costs (garantia para custas e honorários).


Referências normativas e técnicas

  • Lei nº 9.307/1996 (Lei de Arbitragem) — arts. 13–15 (árbitros), 18–21 (procedimento), art. 27 (despesas e honorários), 31 (sentença).
  • Regulamentos institucionais (exemplos usuais no Brasil e exterior): CAM-CCBC, CAM B3, CBMA, CIESP/FIESP, Amcham Brasil; internacionais: ICC/CCI, LCIA, SIAC, SCC.
  • Regras de Arbitragem da UNCITRAL (ad hoc): disposições sobre adiantamentos, despesas e honorários do tribunal.
  • IBA Rules on the Taking of Evidence (boas práticas de prova documental, pericial e testemunhal, com impacto direto em tempo e custo).
  • Convenção de Nova Iorque (1958) — execução internacional de sentenças arbitrais (benefício econômico relevante na escolha pela arbitragem).
Observações metodológicas:

  1. As respostas refletem a prática predominante em regulamentos de câmaras atuantes no Brasil, combinada com a Lei 9.307/1996.
  2. As tabelas de custas variam por instituição e valor da disputa; sempre consultar a tabela vigente e o regulamento aplicável ao caso.
  3. Itens reembolsáveis e política de honorários advocatícios (costs shifting) dependem do regulamento e da discricionariedade do tribunal arbitral.

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