Direito de família

Adoção no Brasil: requisitos, passo a passo no SNA e prazos oficiais

Adoção no Brasil: princípios, base legal e quem pode adotar

A adoção é uma medida jurídica que estabelece, de forma plena e irrevogável, o vínculo de filiação entre a criança/adolescente e o(s) adotante(s). Ela está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em especial nos arts. 39 a 52, e tem como eixo o melhor interesse da criança e do adolescente e o direito fundamental à convivência familiar e comunitária.

Pelo art. 39 do ECA, a adoção é excepcional e irrevogável: utiliza-se quando se esgotaram os esforços para manter a criança com a família de origem ou extensa. O processo corre sob segredo de justiça, protege a intimidade de todos os envolvidos e culmina com uma sentença que substitui a filiação biológica pela filiação civil, com novo assento de nascimento sem qualquer menção ao ato adotivo.

Quem pode adotar

O art. 42 do ECA permite a adoção por maiores de 18 anos, independentemente do estado civil (solteiros, casados, união estável, divorciados, viúvos). Exige-se diferença mínima de 16 anos entre adotante e adotando. Em regra, cônjuge/companheiro precisa consentir quando a adoção for unilateral.

vedações importantes: ascendentes (pais/avós) e irmãos do adotando não podem adotar; procuração para “adotar à distância” é vedada. A Justiça avaliará idoneidade moral, saúde física/mental, condições socioeconômicas e ambiente familiar por meio de estudo psicossocial. Em situações excepcionais, a jurisprudência do STJ admite flexibilizar a diferença etária de 16 anos quando isso melhor atender ao interesse da criança, desde que devidamente fundamentado.

Quem pode ser adotado

O ECA trata da adoção de crianças e adolescentes. Em regra, o(s) genitor(es) devem consentir em audiência (salvo quando destituídos do poder familiar por abandono, maus-tratos ou outras causas legais). A partir de 12 anos, o consentimento do adotando também é exigido. Adoção de maior de 18 anos é possível, mas segue disciplina do Código Civil e não do ECA; como este guia foca no procedimento infantil/juvenil, permanecemos nos parâmetros do Estatuto.

Princípios e diretrizes práticas

  • Melhor interesse: toda decisão prioriza o desenvolvimento saudável e a proteção integral da criança/adolescente.
  • Manutenção de vínculos: só se separam irmãos por motivo realmente justificável; a regra é preservar o grupo fraterno.
  • Excepcionalidade do acolhimento: o acolhimento institucional/familiar é temporário, com reavaliações periódicas; busca-se retorno à família de origem ou colocação em família substituta.
  • Irrevogabilidade e segredo: a adoção consolida filiação definitiva e tramita com proteção de dados sensíveis.

Cadastro e Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA)

O Brasil opera um cadastro nacional unificado de crianças/adolescentes aptos à adoção e de pretendentes habilitados, hoje integrado ao SNA, gerido pelo CNJ. O sistema organiza as filas, em regra por ordem cronológica e perfil pretendido, e dispõe de alertas automáticos de prazos para dar celeridade e transparência aos processos. Pretendentes habilitados só podem receber guarda para fins de adoção quando houver compatibilidade e vinculação registrada no SNA.

Requisitos práticos para a habilitação

Embora cada Tribunal publique sua lista de documentos, em geral exigem-se: identidade/CPF, comprovante de residência, comprovante de renda, certidões cíveis e criminais, atestados de saúde, fotos e declarações. A etapa inclui curso preparatório, entrevistas, visita domiciliar e emissão de parecer psicossocial e do Ministério Público, culminando em sentença de habilitação com validade e necessidade de renovação periódica.

Perfis e expectativas realistas

O tempo de espera depende de escolhas de perfil (idade, grupo de irmãos, condições de saúde). Pretendentes que aceitam adoção tardia, grupos de irmãos ou crianças com necessidades específicas costumam ser vinculados com maior rapidez. A preparação emocional e a rede de apoio contam tanto quanto requisitos formais.

Resumo do bloco: a adoção no Brasil é um processo jurídico-psicossocial que conjuga requisitos objetivos (maioridade, diferença etária, idoneidade, documentação) e avaliações técnicas para garantir o melhor interesse da criança. A base legal do ECA estrutura a irrevogabilidade, o cadastro e o papel do SNA na organização do procedimento.

Procedimentos e prazos: da habilitação ao novo registro

1) Habilitação no Judiciário

O processo inicia com o pedido de habilitação perante a Vara da Infância e da Juventude da comarca de residência do(s) pretendente(s). Não é obrigatório constituir advogado nessa fase (embora seja recomendável em casos complexos). Após o protocolo com a documentação, o juízo abre vista ao Ministério Público, determina estudo psicossocial e agenda audiência, quando necessária.

Dois marcos temporais importam: (a) a participação em curso preparatório para adoção — etapa formativa e obrigatória, que aborda vínculos, história pregressa, adoção tardia, grupos de irmãos e necessidades específicas — e (b) o prazo máximo para a conclusão da habilitação, fixado em 120 dias, prorrogável por igual período com decisão fundamentada. A habilitação deve ser renovada ao menos a cada 3 anos, com nova avaliação técnica.

2) Inscrição no SNA e vinculação

Deferida a habilitação, o pretendente é incluído no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA). O sistema cruza perfis definidos pelos pretendentes com os das crianças/adolescentes aptos à adoção. O SNA é dotado de alertas de prazo, que monitoram, por exemplo, o tempo de acolhimento, as etapas processuais de destituição do poder familiar e os marcos da ação de adoção, oferecendo ao Judiciário mecanismos de gestão ativa para dar fluidez ao procedimento.

Como regra, é preciso que a criança/adolescente esteja juridicamente disponível (com consentimento válido dos genitores ou destituição do poder familiar). A legislação estimulou a celeridade: recém-nascidos entregues e crianças acolhidas não procuradas pela família devem ser cadastrados em até 30 dias para fins de colocação em família substituta, e o tempo em acolhimento deve ser revisto periodicamente para evitar permanências indevidas.

3) Guarda para fins de adoção e estágio de convivência

Estabelecida a compatibilidade e a vinculação, o juízo pode conceder guarda provisória para fins de adoção, deflagrando o estágio de convivência. A lei fixa o prazo máximo de 90 dias para o estágio, prorrogável de forma justificável, e autoriza a dispensa dessa etapa quando já houver convivência suficiente (por exemplo, em casos de guarda/tutela anteriores com vínculo consolidado). Após o término do estágio, os detentores da guarda dispõem de 15 dias para propor a ação de adoção, salvo quando ela já estiver tramitando.

4) Ação de adoção, sentença e efeitos

A ação de adoção é o momento constitutivo do vínculo civil. O ECA determina que ela seja concluída, preferencialmente, em até 120 dias, com possibilidade de uma única prorrogação por igual período mediante decisão fundamentada. Colhidos os pareceres técnicos e do Ministério Público, o juiz sentencia: a adoção passa a valer desde o trânsito em julgado e acarreta a lavratura de novo registro de nascimento, em que os adotantes constam como pais. Todos os direitos de filiação (nome, parentesco, alimentos, sucessão) são idênticos aos biológicos, e o ato é irrevogável.

5) Entrega voluntária, sigilo e proteção à origem

O ECA prevê procedimento humanizado para entrega voluntária do recém-nascido, com acolhimento da gestante, garantia de sigilo sobre o nascimento e acompanhamento familiar por período determinado, bem como prazos para encaminhamento ao cadastro quando não houver procura pela família. O objetivo é proteger a criança e evitar entregas informais ou práticas ilícitas.

6) Prazos práticos reunidos

  • Habilitação: concluir em até 120 dias (prorrogável uma vez por igual período); renovação trienal.
  • Estágio de convivência: até 90 dias, com 15 dias após o término para propor a ação, quando cabível.
  • Ação de adoção: conclusão em 120 dias, prorrogável uma única vez.
  • Cadastro: recém-nascidos/crianças acolhidas não procuradas devem ser cadastrados em até 30 dias.

7) Documentos e avaliação psicossocial (o que esperar)

Além de certidões e comprovantes, prepare-se para entrevistas individuais e conjuntas, visita domiciliar, reflexões sobre história pregressa da criança, manejo de vínculos e perdas, disciplina positiva e rede de suporte. O curso preparatório antecipa desafios e ajuda a alinhar expectativas com a realidade — especialmente em adoção tardia, grupos de irmãos ou necessidades específicas de saúde.

Resumo do bloco: a jornada formal passa por habilitação (com curso e prazos), inscrição no SNA, vinculação, estágio de convivência e sentença. Ao dominar os prazos legais, você se organiza melhor e cobra celeridade quando necessário.

Adoção nacional x internacional, direitos do adotante e guia rápido

Adoção nacional

A adoção nacional envolve pretendentes residentes no Brasil e segue todo o rito descrito: habilitação, SNA, vinculação, estágio e sentença. A preferência é buscar família no território nacional antes de cogitar a via internacional. Tribunais e equipes técnicas realizam busca ativa para perfis de difícil colocação (adoção tardia, grupos de irmãos, necessidades específicas).

Adoção internacional (Convenção de Haia)

Quando não há pretendentes nacionais compatíveis, pode-se cogitar a adoção internacional, definida pelo ECA (art. 51) como aquela em que o(s) pretendente(s) tem residência habitual no exterior (país Parte da Convenção de Haia de 1993). O procedimento é mais formal e envolve a Autoridade Central Administrativa Federal (ACAF), as Autoridades Centrais Estaduais e, quando aplicável, organismos credenciados. O CNJ normatiza e integra o fluxo no SNA.

Passos essenciais (síntese): habilitação no país de residência; envio do dossiê ao Brasil via autoridade central; exame pela ACAF e pela Comissão Estadual (CEJAI); vinculação via SNA apenas quando esgotadas as possibilidades no plano interno; guarda/estágio de convivência no Brasil; sentença e posterior acompanhamento pós-adotivo. O Brasil veda adoções privadas e exige trâmite via autoridades centrais, assegurando legalidade e proteção contra tráfico ou “turismo de adoção”.

Direitos e garantias após a sentença

  • Filiação plena: novo registro civil, com nome e parentesco equivalentes aos biológicos; direitos sucessórios, alimentares e previdenciários.
  • Benefícios trabalhistas e previdenciários: a legislação equipara a adoção à maternidade/paternidade biológica para fins de licenças e salário-maternidade, inclusive para adoção monoparental.
  • Acesso às origens: ao atingir a maioridade, a pessoa adotada tem direito de conhecer sua origem biológica com mediação judicial adequada.
  • Sigilo e proteção de dados: o procedimento é sigiloso; a revelação da origem é acompanhada de suporte técnico.

Checklist prático para pretendentes

  1. Planejamento: alinhe expectativas sobre perfil e disponibilidade para adoção tardia ou grupos de irmãos.
  2. Documentos: providencie certidões, atestados e comprovantes atualizados.
  3. Curso preparatório: participe com atenção; anote dúvidas para a equipe técnica.
  4. Estudo psicossocial: seja transparente nas entrevistas; organize a casa para a visita domiciliar.
  5. Habilitação: acompanhe prazos; se houver demora injustificada, peticione (ou procure a Defensoria/advogado).
  6. SNA: mantenha o perfil atualizado; avalie, com suporte técnico, ampliar a faixa etária ou aceitar irmãos para reduzir espera.
  7. Vinculação e estágio: registre impressões, dificuldades e evoluções; valorize o apoio psicológico.
  8. Ação de adoção: reforce prazos e junte relatórios; após a sentença, providencie o novo registro e comunicações necessárias (escola, plano de saúde etc.).

Erros que atrasam (e como evitar)

  • Perfil restrito sem reflexão: alonga a fila. Revise preferências com base em informação técnica.
  • Documentos desatualizados ou falta no curso: causam exigências e perdas de prazo.
  • Expectativas idealizadas: a história pregressa pode incluir traumas; rede de apoio e acompanhamento são essenciais.
  • Desconhecer prazos: anote os marcos (120 dias, 90 dias, 15 dias, 30 dias) e monitore o processo.

FAQ objetivo

Quanto tempo demora? Varia conforme perfil e dinâmica local. Em termos processuais, a lei aponta 120 dias para habilitação (prorrogáveis uma vez) e 120 dias para ação de adoção (prorrogável uma vez). O estágio tem teto de 90 dias e há 15 dias após o término para propor a ação, quando necessário.

Solteiros podem adotar? Sim. O que importa é a capacidade para o cuidado e as condições psicossociais.

É preciso advogado? Na habilitação, não necessariamente; na ação de adoção, é recomendável assistência de advogado ou Defensoria.

Irmãos serão separados? A regra é não separar; só se admite separação com fundamentação robusta no melhor interesse.

E se a diferença de 16 anos não for atendida? Em hipóteses excepcionais e bem justificadas, a jurisprudência admite flexibilização, desde que assegurada a proteção da criança.

Resumo do bloco: a adoção nacional é a via comum; a internacional funciona como alternativa regulada pela Convenção de Haia e pela ACAF. Após a sentença, valem todos os direitos de filiação, inclusive licenças trabalhistas. Organização, informação e suporte técnico fazem toda a diferença.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *