Brasileiros em Aeronaves Estrangeiras: Seus Direitos no Atraso, Bagagem e Segurança
Visão geral
Quando um brasileiro embarca em aeronave estrangeira (matriculada em outro país), os seus direitos decorrem de três camadas principais: (1) regras internacionais do transporte aéreo (ex.: Convenção de Montreal, Convenção de Tóquio); (2) normas brasileiras aplicáveis a operações que partem, chegam ou ocorrem no território/ espaço aéreo do Brasil (ex.: Resolução ANAC nº 400/2016 e Código Brasileiro de Aeronáutica – CBA); e (3) regras do país de partida/chegada quando a viagem ocorre integralmente no exterior. 0
- Voo que sai ou chega ao Brasil: valem as regras da ANAC (informação, assistência 1h/2h/4h, reacomodação/reembolso) + tratados internacionais. 1
- Voo inteiramente no exterior: valem os tratados e a legislação/autoridades do país envolvido (ex.: UE, EUA), além da Convenção de Montreal se for internacional. 2
- Infrações a bordo: a jurisdição primária é do Estado de matrícula da aeronave; o comandante pode adotar medidas para manter a ordem. 3
- Espaço aéreo brasileiro: o Brasil exerce soberania completa; autoridades podem intervir após o pouso. 4
Direitos do passageiro: atrasos, cancelamentos e preterição
Em voos com origem ou destino no Brasil, a companhia deve prestar assistência material conforme o tempo de espera e oferecer alternativas como reacomodação ou reembolso. A própria Resolução 400 detalha a assistência: comunicação a partir de 1h; alimentação a partir de 2h; e hospedagem/transporte a partir de 4h, quando cabível. 5
- 1h+: meios de comunicação (internet/telefone).
- 2h+: alimentação (voucher/refeição).
- 4h+: hospedagem e translado, quando houver pernoite necessário; reacomodação ou reembolso. 6
|———|———|—————————–→ tempo
Comunicação Alimentação Hospedagem/Translado + Reacomodação/Reembolso
Se a empresa negar a assistência, registre ocorrência junto à ANAC (telefone 163 ou site), peça declaração por escrito com o motivo do atraso/cancelamento e guarde comprovantes para eventual indenização. 7
Bagagem: extravio, dano e atraso
Nos voos internacionais, a responsabilidade por destruição, perda, avaria ou atraso da bagagem segue a Convenção de Montreal, com limites calculados em Direitos Especiais de Saque (DES/SDR) e prazos específicos para reclamação: até 7 dias para dano e 21 dias para atraso, além de 2 anos para ajuizamento, conforme os arts. 31 e 35. 8
- Dano à bagagem: reclamação escrita em até 7 dias do recebimento.
- Atraso da bagagem: reclamação em até 21 dias do recebimento.
- Ação judicial: até 2 anos a partir da chegada prevista/ interrupção do transporte. 9
Observação: os limites indenizatórios são expressos em DES e sofrem atualizações periódicas pela ICAO; verifique o teto vigente ao ajuizar o pedido. 10
Onde processar a companhia aérea
Em caso de dano (morte, lesão ou danos cobertos pela Convenção), a ação pode ser proposta, à escolha do passageiro, no domicílio do transportador, em seu principal estabelecimento, no local onde o contrato foi firmado (ponto de venda) ou no destino do voo. Para morte/lesão, existe ainda a chamada “quinta jurisdição”: o foro do domicílio permanente do passageiro se o transportador operar nesse Estado. (Art. 33 da Convenção de Montreal). 11
No Brasil, o STF firmou a tese do Tema 210: em transporte internacional, tratados de Varsóvia/Montreal prevalecem sobre o CDC para limitação de responsabilidade material. Em paralelo, o Tema 1240 assentou que danos morais não se submetem a essas convenções, permitindo aplicação do CDC. 12
Segurança e conduta a bordo (infração/perturbação)
Em caso de infração a bordo (agressões, fumo, desobediência grave, etc.), a Convenção de Tóquio (1963) autoriza o comandante a tomar medidas razoáveis para proteger a segurança, inclusive restringindo passageiro indisciplinado, com jurisdição primária do Estado de matrícula da aeronave. Ao pouso no Brasil, podem atuar a Polícia Federal e a autoridade aeronáutica, nos termos do CBA. 13
- Comandante intervém (medidas razoáveis/registro de ocorrência). 14
- Entrega do passageiro às autoridades no pouso (conforme aeroporto). 15
- Autoridades brasileiras podem deter/instaurar procedimentos quando aplicável. 16
Direitos em situações de detenção no exterior
Se, em razão de fato ocorrido a bordo ou no aeroporto estrangeiro, um brasileiro for detido, ele tem direito à notificação e assistência consular (contato com o Consulado/Embaixada do Brasil) segundo o art. 36 da Convenção de Viena sobre Relações Consulares, promulgada no Brasil pelo Decreto nº 61.078/1967. 17
Como agir na prática (passo a passo)
- Antes do embarque: registre contatos da companhia; salve regras tarifárias; tenha seguro viagem.
- Atraso/cancelamento: dirija-se ao balcão; solicite assistência material adequada e declaração escrita do motivo; fotografe o painel e guarde vouchers/recibos. 18
- Bagagem: abra PIR no aeroporto; protocole reclamação por escrito dentro dos prazos (7/21 dias). 19
- Reembolso/remarcação: avalie opção menos onerosa e prazos previstos na Resolução 400. 20
- Reclamação administrativa: ANAC (163/site), Procons e plataformas oficiais do governo.
- Ação judicial: avalie foro cabível (Art. 33) e deadline de 2 anos (Art. 35) quando a Convenção se aplica. 21
Guia rápido
- Assistência 1h/2h/4h em voos de/para o Brasil (comunicação, alimentação, hospedagem). 22
- Reacomodação ou reembolso por escolha do passageiro em cancelamento/preterição. 23
- Bagagem: 7 dias (dano), 21 dias (atraso), 2 anos (processo). 24
- Onde processar: domicílio do transportador, principal estabelecimento, local do contrato, destino; e, para morte/lesão, domicílio do passageiro (quinta jurisdição). 25
- Tratados x CDC: Montreal/Varsóvia prevalecem para danos materiais (Tema 210); danos morais ficam fora dos limites dos tratados (Tema 1240). 26
- Conduta a bordo: comandante pode restringir passageiro indisciplinado (Convenção de Tóquio). 27
FAQ
1) Em aeronave estrangeira, a ANAC ainda vale?
Sim, para voos que partem ou chegam ao Brasil (incluindo conexões no país), a Resolução 400/2016 se aplica à assistência e informações ao passageiro, independentemente da matrícula da aeronave. 28
2) Posso pedir reacomodação em companhia diferente?
Sim, havendo disponibilidade e se for a primeira oportunidade para o mesmo destino; também é possível optar pelo reembolso. 29
3) Extravio de bagagem em voo internacional: há teto de indenização?
Há limites em DES/SDR definidos pela Convenção de Montreal (atualizados periodicamente). Se declarar valor especial e pagar eventual taxa, o teto pode ser ampliado. 30
4) Onde ajuizar ação por lesão corporal ocorrida a bordo?
Você pode escolher entre os quatro foros clássicos (domicílio do transportador, principal estabelecimento, local do contrato, destino) ou, para morte/lesão, o foro do seu domicílio permanente (“quinta jurisdição”). 31
5) As regras da Convenção limitam danos morais?
O STF decidiu que os danos morais em transporte internacional não se submetem às limitações de Varsóvia/Montreal (Tema 1240). Já para danos materiais, prevalecem os tratados (Tema 210). 32
6) Fui detido no exterior após incidente no voo. Tenho direito ao consulado?
Sim. As autoridades locais devem informar seu direito de comunicar-se com o consulado do Brasil (art. 36 da Convenção de Viena). 33
Modelos de “gráficos” úteis (para impressão/treinamento)
Ação judicial: até 2 anos
Os gráficos acima são esquemas visuais de apoio (não expressam dados estatísticos).
Conclusão
Em aeronaves estrangeiras, os direitos do brasileiro derivam de um mosaico: tratados internacionais (Montreal/Tóquio), normas nacionais quando o voo se conecta ao Brasil (Resolução 400 e CBA) e, fora do país, a lei local. Para proteger-se, documente tudo, observe prazos, acione a ANAC e, se preciso, escolha o foro mais favorável permitido pela Convenção. Em temas sensíveis (lesão, grandes danos, detenções), considere orientação jurídica e apoio consular.
Fundamentos legais e normativos
- Resolução ANAC nº 400/2016 – Condições Gerais do Transporte Aéreo; assistência material, reacomodação e reembolso. 34
- Convenção de Montreal (1999) – responsabilidade por morte/lesão, bagagem e atraso; prazos (arts. 31 e 35) e jurisdiction (art. 33). Promulgada no Brasil pelo Decreto nº 5.910/2006. 35
- Convenção de Tóquio (1963) – infrações e outros atos a bordo; poderes do comandante; jurisdição do Estado de matrícula. Promulgada pelo Decreto nº 66.520/1970. 36
- Código Brasileiro de Aeronáutica – Lei 7.565/1986 – soberania do espaço aéreo e providências das autoridades brasileiras. 37
- Convenção de Viena sobre Relações Consulares (1963), art. 36 – direito à assistência consular; Decreto nº 61.078/1967. 38
- STF – Tema 210 (RE 636.331/ RJ): prevalência de Varsóvia/Montreal sobre o CDC para danos materiais; Tema 1240: convenções não se aplicam a danos morais. 39
Comunicado importante
Este conteúdo é informativo e não substitui um advogado. Cada caso concreto pode exigir análise jurídica específica no Brasil e/ou no país estrangeiro de partida/chegada.
