Quem pode pedir a falência do empresário? Veja quem tem esse direito e em quais casos a lei permite
Quem pode pedir a falência do empresário (legitimidade ativa)
A falência é um procedimento judicial que visa a liquidação organizada do patrimônio do empresário ou da sociedade empresária, quando demonstrada a sua incapacidade de cumprir obrigações de forma regular. A Lei nº 11.101/2005 (Lei de Recuperação e Falências – LRF), com as alterações posteriores, define o escopo e os sujeitos alcançados: aplica-se ao empresário e à sociedade empresária, não alcançando sociedades simples, profissionais liberais ou atividades não empresárias (art. 1º da LRF).
Quanto à legitimidade ativa, o art. 97 da LRF estabelece, de forma taxativa, quem pode requerer a falência do devedor:
Autofalência (pedido pelo próprio devedor)
O devedor pode requerer sua própria falência quando verificar a insolvência irremediável, devendo apresentar livros e documentos contábeis, quadro de credores, relação de bens e outras informações exigidas nos arts. 105 a 107. Em geral, a autofalência é usada quando não há viabilidade de recuperação judicial e se pretende preservar a paridade entre credores, evitar atos isolados de execução e organizar a liquidação.
Pedido por credor (art. 94)
Qualquer credor pode pedir a falência, desde que comprove uma das hipóteses legais do art. 94: (i) impontualidade injustificada no pagamento de obrigação líquida materializada em título executivo de valor superior a 40 salários mínimos; (ii) execução frustrada (no curso de execução, o devedor não paga, não deposita nem nomeia bens à penhora); (iii) prática de atos falimentares (ex.: liquidação precipitada de ativos, abandono do estabelecimento, simulação de negócios para fraudar credores, entre outros). Em todas as hipóteses, é essencial instruir o pedido com provas idôneas (protestos, certidões, decisões, documentos contábeis).
Pedido por cônjuge sobrevivente, herdeiros ou inventariante
Na ausência do devedor (falecimento, por exemplo), o cônjuge sobrevivente, herdeiros ou inventariante podem pedir a falência, sobretudo quando identificarem insolvência e necessidade de uma liquidação coletiva para resguardar a igualdade entre credores e evitar atos individuais que deteriorem o patrimônio a partilhar.
Pedido por cotista ou acionista
O cotista/acionista pode requerer a falência nas hipóteses legais, respeitando-se o que dispõe a lei societária e o ato constitutivo quanto à representação e ao exercício de direitos. Em cenários de conflito societário somado a insolvência, o pedido pode ser estratégico para resguardar a comunhão de interesses dos credores e a transparência da liquidação.
E o Ministério Público pode pedir?
A LRF não confere ao Ministério Público legitimidade ampla e irrestrita para propor a ação de falência como autor. O MP atua como fiscal da ordem jurídica, podendo intervir e, em hipóteses específicas, requerer a convolação da recuperação judicial em falência (art. 73), além de outras intervenções normativamente previstas. Em síntese: fora das hipóteses legais específicas, o MP não figura como legitimado universal para o pedido inicial de falência, mas tem papel relevante de controle da legalidade e tutela do interesse público no processo falimentar.
Hipóteses legais para o pedido por credor (art. 94 LRF)
Impontualidade injustificada (art. 94, I)
Exige-se a demonstração de títulos executivos que somem mais de 40 salários mínimos, devidamente protestados (ou com prova equivalente), e a ausência de justificativa idônea do devedor. A jurisprudência reconhece que, superado o piso legal, afasta-se a tese de abuso do uso da via falimentar como mero meio coercitivo, pois a própria lei realiza esse juízo de ponderação ao impor o piso como condição de procedibilidade.
Execução frustrada (art. 94, II)
Caracteriza-se quando, em execução por quantia certa, o devedor não paga, não deposita e não nomeia bens à penhora. A certidão do juízo da execução é documento-chave para instruir o pedido de falência nesta hipótese.
Prática de atos falimentares (art. 94, III)
A lei elenca comportamentos que revelam quebra da confiança na atividade empresarial, como: liquidação precipitada de ativos; abandono do estabelecimento; fraudes com desvio de bens; simulações e outros. O credor deve descrever e provar os fatos, demonstrando sua gravidade e conexão com a insolvência.
Competência e rito essencial
A competência é do foro do principal estabelecimento do devedor. Distribuído o pedido, o juiz pode determinar a citação para resposta (especialmente em impontualidade injustificada), facultar a produção de prova e, presentes os requisitos, decretar a falência. A sentença nomeia administrador judicial, fixa prazos para habilitação de créditos, determina a arrecadação de bens, a formação do quadro-geral de credores e demais atos até a liquidação e extinção das obrigações, na forma da lei.
“Gráfico” de fluxo do procedimento (ilustrativo)
Boas práticas probatórias e riscos processuais
Em pedidos por impontualidade injustificada, instruir com protestos regulares (ou prova equivalente) é crucial. Em atos falimentares, detalhar os fatos e apresentar documentos/indícios robustos aumenta a probabilidade de sucesso. A jurisprudência tem repelido o uso abusivo da via falimentar quando o crédito não atinge o piso legal ou quando o objetivo é apenas coagir o pagamento de valores inferiores. Superado o piso e cumpridos os requisitos, afasta-se, em regra, a alegação de abuso.
Para credores públicos (Fazenda Nacional/Estaduais/Municipais), também é possível o requerimento quando presentes os requisitos legais e a frustração das vias executivas, havendo decisões reconhecendo essa legitimidade à luz do art. 97, IV.
Notas legais úteis (para consulta)
- Art. 1º LRF: aplica-se ao empresário e à sociedade empresária.
- Art. 94 LRF: hipóteses de decretação por pedido de credor (impontualidade > 40 SM; execução frustrada; atos falimentares).
- Art. 97 LRF: legitimados para requerer a falência (devedor; cônjuge/herdeiros/inventariante; cotista/acionista; qualquer credor).
- Arts. 105 a 107 LRF: requisitos da autofalência.
- Art. 73 LRF: hipóteses de convolação da recuperação judicial em falência (atuando o MP nos termos legais).
Conclusão
Podem pedir a falência do empresário: o próprio devedor (autofalência), cônjuge sobrevivente, herdeiros ou inventariante, cotista/acionista e qualquer credor. Para o credor, as hipóteses do art. 94 (impontualidade > 40 SM; execução frustrada; atos falimentares) exigem prova robusta e observância de requisitos formais (protestos, certidões, documentação idônea). O Ministério Público não é legitimado universal para o pedido inicial, mas desempenha papel relevante na fiscalização e pode requerer convolação em hipóteses legais. Em todos os casos, atenção à competência, à regular instrução e ao piso legal, sob pena de indeferimento ou reconhecimento de abuso.
1) Qualquer credor pode pedir a falência?
Sim. Qualquer credor (trabalhista, tributário, quirografário, com garantia real, etc.) possui legitimidade nos termos do art. 97, desde que comprove uma das hipóteses do art. 94 e instrua o pedido com prova idônea.
2) O Ministério Público pode iniciar o pedido de falência?
O MP não tem legitimidade universal para propor a ação inicial. Atua como fiscal da ordem jurídica e pode requerer atos específicos (ex.: convolação da recuperação em falência, art. 73), além de intervir para resguardar o interesse público.
3) É obrigatório protesto do título para pedir por impontualidade?
Em regra, sim: a impontualidade (art. 94, I) pressupõe título executivo protestado (ou prova equivalente), somado ao montante superior a 40 salários mínimos. A ausência de protesto costuma levar ao indeferimento.
4) Como funciona a execução frustrada como fundamento?
Se, em execução, o devedor não paga, não deposita nem nomeia bens, o credor pode instruir o pedido com a certidão do juízo da execução (art. 94, II), demonstrando a frustração.
5) O que são “atos falimentares” do art. 94, III?
São condutas que revelam quebra da confiança e risco aos credores (p.ex., fraude, abandono do estabelecimento, liquidação precipitada de ativos, simulações). Devem ser descritas e provadas com precisão.
6) Devedor pode pedir sua própria falência?
Sim. É a autofalência (arts. 105–107, LRF), usada quando a empresa reconhece insolvência irremediável e visa uma liquidação organizada, com apresentação de livros, quadro de credores e relação de bens.
7) Só sociedades empresárias podem falir?
A LRF aplica-se ao empresário e à sociedade empresária (art. 1º). Sociedades simples e atividades não empresárias, em regra, não se submetem ao regime falimentar.
8) Qual foro competente para o pedido?
O do principal estabelecimento do devedor. Peticionar em foro diverso pode gerar incompetência e atrasos ou extinção do feito.
9) Qual o papel do piso de 40 salários mínimos?
É requisito para a hipótese de impontualidade injustificada. Abaixo desse patamar, o pedido tende a ser indeferido, evitando uso da falência como meio de cobrança coercitiva de créditos pequenos.
10) O que mais costuma derrubar um pedido de falência?
Falta de prova (protesto/certidão), foro errado, devedor não sujeito à LRF, atos falimentares genéricos sem lastro probatório e uso da via falimentar como ameaça sem atender aos requisitos legais.
- Lei 11.101/2005 (LRF) — arts. 1º, 73, 94, 97, 105–107: delimita sujeitos alcançados (empresário e sociedade empresária), hipóteses legais para decretação e legitimados para requerer a falência. Essencial para fundamentação dos pedidos e defesas.
- Código de Processo Civil (CPC): normas supletivas de procedimento (citação, provas, recursos), quando não conflitantes com a LRF.
- Lei das S.A. (Lei 6.404/1976) e Código Civil (arts. de sociedades): suporte para legitimidade de cotista/acionista e regras societárias corrrelatas.
- Jurisprudência dos Tribunais de Justiça e STJ: reforça a necessidade de protesto (art. 94, I), certidão de execução frustrada (art. 94, II) e descrição minuciosa dos atos falimentares (art. 94, III). Em geral, repele uso da via falimentar como sucedâneo de cobrança.
- Normas locais de custas e organização judiciária: para preparo adequado, distribuição no foro do principal estabelecimento e tramitação correta.
Dicas práticas de instrução: anexar protestos atualizados; certidão do juízo da execução quando for o caso; comprovar atos do art. 94, III com documentos, e-mails, registros contábeis e relatórios; indicar endereço do estabelecimento principal; e observar regularidade fiscal e societária dos próprios documentos juntados.
O pedido de falência é medida extrema e exige prova robusta da hipótese legal invocada, além de observância estrita aos requisitos formais (piso de 40 SM, protesto ou certidão, descrição de atos, competência). Escolher a fundamentação correta (impontualidade, execução frustrada ou atos falimentares), bem como preparar a instrução documental desde o início, aumenta substancialmente a chance de êxito e reduz incidentes processuais.
Aviso importante (leia antes de decidir): Estas informações têm caráter educativo e informativo, não constituem aconselhamento jurídico individualizado, não substituem a análise por profissional habilitado e não criam relação advogado-cliente. Cada caso possui particularidades; procure um(a) advogado(a) para avaliação específica dos seus documentos e circunstâncias.
