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Entenda a lei com clareza – Understand the Law with Clarity

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Direito digitalDireito médico e da saúde

Comercialização de Dados de Saúde: Entenda os Limites Legais e as Responsabilidades da LGPD

Comercialização de dados de saúde: conceito, riscos e panorama regulatório

Dados de saúde são dados pessoais sensíveis pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD – Lei 13.709/2018). Envolvem qualquer informação sobre estado físico ou mental, histórico médico, exames, prescrições, biometria, hábitos relacionados a saúde, entre outros. Sua comercialização — isto é, a cessão, venda, licenciamento ou troca com contraprestação econômica — só é juridicamente possível em hipóteses muito restritas, com forte ênfase em anonimização robusta, finalidade legítima e transparência. Fora desses parâmetros, a prática tende a ser vedada ou a demandar salvaguardas intensas, sob pena de sanções administrativas, civis e reputacionais.

O que a LGPD permite e o que proíbe (regras centrais)

Bases legais aplicáveis a sensíveis

O tratamento de dados sensíveis exige base legal específica (art. 11 da LGPD). Para o setor de saúde, destacam-se: (i) consentimento específico e destacado; (ii) tutela da saúde por profissionais ou serviços de saúde e autoridades sanitárias; (iii) pesquisa (com órgãos de ética/legislação setorial); (iv) proteção da vida e execução de políticas públicas. Bases do art. 7º (como legítimo interesse) não alcançam sensíveis fora das hipóteses do art. 11.

Proibição de uso econômico indevido

A LGPD restringe o compartilhamento de dados de saúde visando vantagem econômica. Exceções típicas: portabilidade a pedido do titular, operações indispensáveis à prestação de serviços de saúde (ex.: faturamento, auditoria, ressarcimento, prevenção a fraudes), e tratamento por operadoras e prestadores dentro da cadeia assistencial. A mera venda a anunciantes, seguradoras ou corretores para perfilização comercial não se enquadra e, em regra, viola princípios de finalidade, necessidade e não discriminação.

Anônimos x pseudônimos

Dados anonimizados (sem possibilidade razoável de reidentificação) não são pessoais para fins da LGPD, desde que mantidas salvaguardas técnicas e organizacionais que impeçam reidentificação. Já pseudonimizados continuam pessoais e não podem ser livremente comercializados. Em saúde digital, risco de reidentificação é alto (conjuntos pequenos, dados de localização, padrões de exames), exigindo testes de risco, contratos e controles técnicos.

QUADRO-CHAVE — Pode vender dados de saúde?

  • Sem anonimização real: em regra, não. Precisa base do art. 11 e, normalmente, não se admite “venda” para marketing.
  • Anonimizados de forma robusta: pode licenciar/conceder acesso se respeitar finalidade, minimização, teste de re-id e cláusulas contratuais.
  • Assistência direta (prestação do serviço de saúde): compartilhar é possível quando estritamente necessário e com segurança.

Requisitos práticos para qualquer cessão/licenciamento

1) Finalidade, necessidade e minimização

Defina exatamente para que o terceiro usará o dado, qual o valor legítimo (ex.: pesquisa clínica, qualidade assistencial) e o mínimo necessário (campos, granularidade, tempo). Evite “coleta ampla para usos futuros”.

2) Consentimento qualificado (quando aplicável)

Quando a base for o consentimento, ele deve ser específico, destacado e informado, com linguagem clara, opt-in granular (separar finalidades), registro auditável e revogação simples. Não é válido “condicionar” acesso a um app de saúde à venda de dados para publicidade.

3) Anonimização e testes de reidentificação

Implemente técnicas como k-anonymity, l-diversity, differential privacy, supressão/perturbação, e realize avaliações independentes de risco de reidentificação. Documente resultados e repita periodicamente, sobretudo ao combinar bases externas.

4) Relatório de Impacto (RIPD) e governança

Para operações de alto risco (típico em saúde), elabore RIPD descrevendo etapas do tratamento, riscos e medidas mitigadoras. Engaje o encarregado (DPO), comitês de ética, e adote políticas internas de acesso, retenção, descarte e auditoria.

5) Contratos com terceiros

Instrumente a cessão com contratos de tratamento contendo: finalidade, limites de uso, proibição expressa de reidentificação, subcontratação, medidas de segurança (criptografia, segregação), notificação de incidentes, auditoria, direito de exigir deleção/devolução, e penalidades. Em caso de transferência internacional, inclua cláusulas contratuais e avalie a base dos arts. 33-36 (país adequado, cláusulas padrão, cooperação internacional etc.).

Setor saúde: particularidades e fronteiras

Planos e seguradoras

Operadoras podem tratar dados para execução do contrato assistencial, auditoria e combate a fraude, mas a profilização para fins comerciais discriminatórios (ex.: reajustes, exclusões, marketing invasivo) esbarra em não discriminação e nas vedações do art. 11.

Healthtechs e apps de bem-estar

Apps que coletam batimentos, sono, glicemia, fertilidade ou localização de farmácias tratam sensíveis quando vinculados a saúde. A monetização por adtech (SDKs rastreadores, perfis para anúncios) é de alto risco jurídico, sobretudo se cruzar dados com terceiros fora da finalidade assistencial. Práticas aceitáveis tendem a exigir anonimização robusta ou consentimento destacado (e ainda assim com parcimônia).

Pesquisa clínica e dados secundários

Pesquisas demandam comitês de ética, bases legais específicas e, sempre que possível, anonimização. “Secondary use” para ciência ou inovação deve obedecer a finalidades compatíveis e a salvaguardas reforçadas (controle de acesso, data rooms, safe havens).

CHECKLIST OPERACIONAL (resumo)

  1. Mapeie quais dados (sensíveis?) e por quê (finalidade específica).
  2. Escolha a base legal adequada (art. 11) e documente.
  3. Aplique minimização e anonimização quando possível; teste re-id.
  4. Produza RIPD e defina limites contratuais com terceiros.
  5. Implemente segurança da informação (criptografia, logging, segregação de ambientes).
  6. Estabeleça retention schedule e descarte seguro.
  7. Facilite direitos do titular (acesso, correção, portabilidade, revogação).
  8. Treine equipes e revise periodicamente.

Transparência e direitos dos titulares

Políticas de privacidade devem ser claras, explicar com quem se compartilha e para qual benefício concreto. Em saúde, a expectativa legítima do paciente é restrita ao cuidado e à gestão assistencial. Disponibilize painéis de preferências, portabilidade e revogação em um clique, além de canais de atendimento e logs auditáveis.

Sanções e responsabilidade

A ANPD pode aplicar advertências, multas (até 2% do faturamento, limitadas a R$ 50 milhões por infração), publicização, bloqueio ou eliminação dos dados. Consumidores e pacientes podem buscar indenizações com base no CDC e na responsabilidade civil. Em casos de discriminação e danos morais coletivos, o risco é elevado. Brechas éticas (ex.: uso para precificação discriminatória) agravam a dosimetria das sanções.

Boas práticas para projetos de monetização responsável

  • Data sandbox com acesso supervisionado, logs e proibição de cópias.
  • Data clean rooms com query controls e limites de extração.
  • Agregação estatística (ex.: relatórios por coortes mínimas, ruído diferencial).
  • Comitê de ética com veto a usos de alto risco (publicidade segmentada sensível).
  • Métricas de risco (probabilidade de re-id, impacto de dano, exposição de grupos vulneráveis).
EXEMPLOS PRÁTICOS

  • Relatórios de tendências com dados agregados e anonimizados sobre incidência de sintomas → tende a ser lícito com salvaguardas.
  • Venda de IDs de usuários de app de saúde para campanhas de adsalto risco/vedação.
  • Compartilhamento com laboratório para auditoria e faturamentopermitido se estritamente necessário e contratado.

Gráfico rápido: matriz de risco (ilustrativa)

Baixo risco: dados anonimizados + agregação por coortes ≥ k; Médio: pseudonimização + contratos fortes; Alto: identificação direta + marketing/ads externos.

Conclusão — Linha de corte para “comercialização”

No Brasil, a “comercialização” de dados de saúde só se sustenta quando não envolve dados pessoais (anonimização com barreiras reais de reidentificação) ou quando está intrinsecamente vinculada à assistência, pesquisa regulada ou outra hipótese de interesse público claramente amparada pela LGPD. Modelos de negócio baseados em ads segmentados ou em venda de perfis de pacientes tendem a ser incompatíveis com a legislação e com a ética em saúde. O caminho seguro é governança de dados madura, contratos rígidos, anonimização séria e transparência total com os titulares.

Guia rápido

  • Os dados de saúde são considerados sensíveis pela LGPD (Lei 13.709/2018), exigindo tratamento especial e restrito.
  • A comercialização desses dados é, em regra, proibida, salvo quando anonimizados ou utilizados para fins científicos, assistenciais ou de políticas públicas.
  • Empresas e profissionais devem observar princípios de finalidade, necessidade e não discriminação.
  • A ANPD pode aplicar multas severas e sanções administrativas em caso de uso indevido.

Quem pode tratar dados de saúde?

Somente profissionais de saúde, autoridades sanitárias e instituições devidamente autorizadas. O tratamento por empresas de marketing, seguros ou tecnologia exige consentimento explícito e anonimização robusta.

O que é permitido pela LGPD?

É permitido o uso de dados de saúde para pesquisa científica, políticas públicas e serviços assistenciais, desde que respeitadas as salvaguardas legais. A venda direta de dados pessoais identificáveis é expressamente vedada.

Quais são os riscos jurídicos?

O uso indevido pode gerar responsabilidade civil, sanções administrativas e até danos morais coletivos. Além das penalidades da ANPD, há implicações sob o CDC e o Código Civil.

Como evitar irregularidades?

Adote anonimização real, contratos claros com terceiros, e elabore um Relatório de Impacto à Proteção de Dados (RIPD). A transparência com os titulares e o consentimento informado são essenciais.

Base normativa essencial

  • Lei 13.709/2018 (LGPD) – arts. 11, 33 a 36 (tratamento e transferência de dados sensíveis).
  • Resolução CFM nº 2.227/2018 – ética no uso de prontuários e sistemas digitais.
  • Constituição Federal – art. 5º, X (direito à intimidade e à vida privada).
  • CDC – art. 6º, III (direito à informação clara sobre uso de dados).

Considerações finais

A comercialização de dados de saúde no Brasil exige responsabilidade e transparência. Qualquer uso fora do escopo assistencial ou científico deve ser analisado sob a ótica da LGPD, com atenção à anonimização e ao consentimento explícito. Ignorar esses princípios pode gerar consequências graves para empresas e profissionais envolvidos.

Essas informações têm caráter informativo e não substituem a orientação de um profissional especializado em proteção de dados ou direito digital.

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