Falhas em Caixas Eletrônicos: Quando o Banco Deve Indenizar o Cliente
Falhas em caixas eletrônicos: responsabilidade dos bancos
Falhas em caixas eletrônicos (ATMs) — como débito sem saque, depósito não creditado, retenção de cartão, saque/transferência não reconhecidos e erro de contagem — são defeitos na prestação de serviço bancário que, em regra, geram responsabilidade objetiva das instituições financeiras. Pela teoria do risco da atividade (art. 14 do CDC), o banco responde independentemente de culpa quando o serviço é defeituoso, inclusive por fortuito interno (fraudes e delitos de terceiros inerentes à atividade bancária), consoante a Súmula 479 do STJ. Aplica-se também a Súmula 297 do STJ (bancos submetidos ao CDC).
Marco jurídico essencial
CDC e responsabilidade
- Art. 14 do CDC: fornecedor responde por defeito do serviço que cause dano ao consumidor; excludentes: culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro e inexistência de defeito.
- Art. 6º, VI e VIII: reparação integral e inversão do ônus da prova quando verossímil a alegação/hipossuficiência técnica.
- Art. 22: serviços essenciais devem ser prestados de forma eficiente e segura.
- Art. 26: prazo decadencial de 90 dias para reclamar de vício de serviço durável (p. ex., não crédito de depósito; lançamentos indevidos recorrentes).
- Art. 27: prescrição de 5 anos para danos decorrentes de fato do serviço (materiais e morais).
Fortuito interno x externo
Fraudes e delitos inerentes ao risco da atividade bancária (como clonagem, “cash trapping”, “skimming”, troca de envelopes, erro de contagem automática ou falha de sensores) são fortuito interno — o banco responde. Já eventos absolutamente estranhos e inevitáveis (fortuito externo), como roubo com violência fora de agências sem nexo com o sistema de segurança do banco, tendem a afastar o nexo causal. Em agências e salas de autoatendimento, a jurisprudência frequentemente reconhece dever de segurança reforçado.
- Débito sem saque (máquina registra saque, mas não libera cédulas): defeito do serviço. Banco deve estornar e demonstrar logs/imagens se negar.
- Depósito em envelope não creditado: banco deve provar divergência na conferência; consumidor pode exigir perícia do conteúdo/filmagens.
- Retenção de cartão/“troca” por golpistas: regra é responsabilidade do banco (fortuito interno) quando falha de vigilância/sinalização/monitoramento do terminal.
- Transações não reconhecidas (saques/PIX a partir do ATM): aplica-se Súmula 479/STJ; banco deve demonstrar autenticação forte e ausência de falha sistêmica.
Prova, logs e dever de transparência
O banco tem dever de manter registros (logs) de operações, imagens de CFTV e relatórios técnicos dos ATMs (status de gavetas, sensores, divergência de cédulas, abertura de cofre, abastecimento). Na controvérsia, a prova é dinâmica: ao consumidor cabe verossimilhança (tickets, prints, extratos, BO), e ao banco, a prova de ausência de defeito ou culpa exclusiva.
Procedimento prático para o consumidor
- Registre a ocorrência imediatamente no canal do banco (telefone/app/caixa/gerente). Anote o protocolo.
- Guarde o comprovante emitido pelo ATM e faça fotos do terminal, horário e mensagens de erro.
- Boletim de ocorrência quando houver suspeita de fraude ou terceiros.
- Peça formalmente a cópia de logs e filmagens do período (a agência deve preservar o material).
- Não resolvido, reclame na Ouvidoria (prazo de resposta geralmente até 10 dias úteis).
- Persistindo o problema, utilize consumidor.gov.br/Procon ou ajuíze ação (Juizado Especial Cível quando cabível).
Tipos de danos e reparação
- Dano material: estorno de valores, correção monetária e juros; lucros cessantes quando demonstrado (ex.: bloqueio indevido que impede pagamento).
- Dano moral: é reconhecido quando o defeito causa abalo relevante (ex.: privação de numerário essencial, cobrança indevida persistente, negativação).
- Astrei ntas: descumprida a ordem de estorno/fornecimento de documentos, pode-se fixar multa diária.
Compliance e prevenção (deveres do banco)
- Manutenção preventiva e testes dos módulos de dispensação/deposição; atualização de firmwares dos sensores e antifraude.
- Monitoramento ativo de cash trapping/skimming, com trava anti-inserção e inspeções físicas.
- Trilhas de auditoria robustas: logs imutáveis, sincronia de relógio, retenção de imagens conforme política.
- Informação clara ao usuário: instruções no ATM e sinalização de segurança; equipe de apoio em autoatendimento.
- Acessibilidade: ATMs com braile, voz e altura adequada; falhas de acessibilidade podem caracterizar defeito do serviço.
- Consumidor: protocolo, comprovante, BO (se fraude), prints, extratos, pedido de logs/filmagens, testemunhas.
- Banco: relatório técnico do ATM, logs de autenticação, vídeo, conferência de gavetas, trilha do estorno ou justificativa técnica.
- Prazos: art. 26 (90 dias para vício), art. 27 (5 anos para danos); atenção a prazos contratuais e normativos de ouvidoria.
Mapa de riscos e priorização (ilustrativo)
Distribuição exemplificativa das ocorrências em autoatendimento e prioridade de mitigação:
Barras meramente ilustrativas para fins didáticos — substitua por dados internos de ocorrências.
Estratégias probatórias em juízo
Em demandas sobre ATM, são decisivos: perícia do terminal, registros de reconciliação de cassetes (entrada/saída de cédulas), telemetria do ciclo de saque, hash de integridade dos logs e imagens da operação. A ausência de documentação básica fragiliza a tese defensiva do banco ante a inversão do ônus da prova e a aplicação da Súmula 479/STJ.
Conclusão
Em falhas de caixas eletrônicos, o padrão decisório dos tribunais brasileiros aponta para a responsabilidade objetiva das instituições financeiras, com estorno célere e reparação dos danos quando demonstrado defeito do serviço ou fraude típica da atividade bancária. A gestão de riscos (manutenção, segurança e transparência) reduz litígios e protege o consumidor. Para o usuário, a melhor estratégia é documentar imediatamente a ocorrência e acionar os canais formais, escalando a ouvidoria e, se necessário, o Judiciário.
Conteúdo educativo: não substitui a análise individual por advogado(a) de confiança. Situações concretas podem exigir medidas e prazos específicos.
Guia rápido
- Regra-mãe: falha em ATM (débito sem saque, depósito não creditado, retenção de cartão etc.) é defeito do serviço bancário. Resposta é, em regra, objetiva (art. 14, CDC; Súmula 297/STJ e Súmula 479/STJ – fortuito interno).
- Ônus da prova: pode ser invertido (art. 6º, VIII, CDC). Ao banco cabe exibir logs, imagens, relatórios do ATM e prova de inexistência de defeito ou culpa exclusiva do consumidor.
- Prazos: vício do serviço durável — 90 dias (art. 26, CDC); danos materiais/morais — 5 anos (art. 27, CDC).
- Passos práticos: protocolo imediato, guarda de comprovantes e extratos, solicitação de filmagens/logs, BO em caso de fraude, Ouvidoria e, se preciso, Juizado Especial.
- Danos reparáveis: estorno, correção e juros; dano moral quando houver abalo relevante (negativação, privação de numerário, reiteradas recusas).
- Excludentes raras: culpa exclusiva do consumidor/terceiro e fortuito externo (evento totalmente estranho à atividade e inevitável).
FAQ
1) O banco sempre responde por saques não realizados debitados na conta?
Quase sempre, sim. Trata-se de fortuito interno (risco da atividade). O banco só se exonera se provar ausência de defeito e culpa exclusiva do cliente, com evidências técnicas (logs/autenticação/filmagens).
2) Depositei no envelope e o valor não caiu. O que fazer?
Abra protocolo, guarde o recibo e solicite conferência técnica do ATM e das imagens. Se o banco alegar divergência, deve demonstrá-la. Persistindo, acione Ouvidoria, Procon/consumidor.gov.br e, se necessário, o Judiciário.
3) Retiveram meu cartão no caixa e fui vítima de “troca”. O banco é responsável?
Em regra, sim. Golpes típicos de autoatendimento integram o risco do negócio. Responde por falhas de vigilância, monitoramento, sinalização e ausência de barreiras antifraude.
4) Tenho direito a dano moral em falha de ATM?
Depende do caso. Tribunais reconhecem quando há abalo relevante (privação de numerário para despesas essenciais, negativação, recusa de estorno por longo tempo). Em erros prontamente sanados, pode haver só dano material.
5) Quais provas ajudam a ganhar a ação?
Comprovante do ATM, extratos, prints do app, protocolo, BO (em fraude), pedido formal de logs e filmagens, testemunhas, e eventual laudo/relatório técnico do terminal.
6) Qual o prazo para reclamar e para processar?
Para vício do serviço (ex.: depósito não creditado), 90 dias (art. 26, CDC). Para danos materiais/morais, 5 anos (art. 27, CDC), contados do fato/ciência do dano.
Base legal e jurisprudencial essencial
- CDC: arts. 6º, VI e VIII (reparação integral e inversão do ônus), 14 (responsabilidade objetiva por defeito do serviço), 22 (dever de continuidade e segurança), 26 (90 dias), 27 (5 anos).
- STJ: Súmula 297 (instituições financeiras se submetem ao CDC) e Súmula 479 (resposta objetiva por fortuito interno em fraudes).
- Prova: dever de guarda/exibição de logs, CFTV e relatórios do ATM; aplicação de prova dinâmica.
Considerações finais
Falhas em caixas eletrônicos normalmente configuram defeito do serviço e atraem a responsabilidade objetiva do banco. Consumidores devem documentar a ocorrência e esgotar os canais internos; instituições financeiras devem investir em prevenção, evidências técnicas e transparência, reduzindo litígios e tempo de resolução.
Estas informações são educativas e não substituem a atuação de profissional habilitado. Cada caso exige análise jurídica individual, especialmente quanto a prazos, provas e estratégias processuais.
