Crimes corporativos no Brasil: entenda os mais comuns e como as empresas podem se proteger
Crimes corporativos mais comuns no Brasil: panorama, leis aplicáveis e estratégias de prevenção
No ambiente empresarial brasileiro, a prevenção e a resposta a crimes corporativos são dimensões centrais da governança e do compliance. A heterogeneidade regulatória — que envolve leis penais, administrativas, concorrenciais, ambientais, de mercado de capitais e de consumo — exige um programa integrado de controles internos. Abaixo, mapeamos os ilícitos mais recorrentes, seus marcos legais e os pontos de atenção para diretorias, conselhos e áreas de auditoria, investigação e jurídico.
1) Corrupção, fraude em contratos e relações com o poder público
Inclui promessa, oferta ou pagamento de vantagem indevida, fraude em licitações/contratos, patrocínio de interesse privado, tráfico de influência e caixa dois. A responsabilização pode ser penal (pessoas físicas) e administrativa/civil (pessoas jurídicas) com base na Lei nº 12.846/2013 (Anticorrupção), no Código Penal (corrupção ativa, peculato mediante concurso, estelionato contra a administração), e na Lei nº 14.133/2021 (crimes e infrações em contratações públicas). Riscos típicos: intermediários, doações, brindes e hospitalidades sem critérios, patrocínios, facilitadores locais e terceirizações críticas.
- Pagamentos repetidos a consultorias sem escopo ou com taxas de sucesso relacionadas a atos oficiais.
- Contratos aditados com sobrepreço e mudanças de escopo sem justificativa técnica.
- Interações com agentes públicos sem registro e agenda.
2) Cartel, combinações ilícitas e abusos concorrenciais
Práticas como cartel (fixação de preços, divisão de mercado), troca sensível de informações entre concorrentes e abuso de posição dominante são investigadas pelo CADE (Lei nº 12.529/2011). Além de multas elevadas, há sanções reputacionais e restrições a contratos públicos. Riscos: reuniões setoriais sem agenda clara, consórcios mal estruturados e interlocks (administração comum entre concorrentes) sem salvaguardas.
3) Lavagem de dinheiro, crimes financeiros e uso indevido do sistema bancário
Estruturas de ocultação ou dissimulação de bens, direitos e valores, operações em espécie sem lastro e layering por empresas de fachada são alvos da Lei nº 9.613/1998. Empresas de setores obrigados devem manter PLD/FT (políticas, cadastros, monitoramento e comunicação de operações ao regulador), com forte integração a KYC/KYB.
4) Crimes tributários e contábeis
Omissão de receita, fraudes fiscais, notas frias, créditos indevidos e manipulação contábil se enquadram na Lei nº 8.137/1990 e em tipos do Código Penal (falsidade ideológica, sonegação de contribuição previdenciária). Além de multas e autuações, há risco de responsabilização de administradores quando há dolo ou participação.
5) Crimes ambientais relacionados à atividade empresarial
Operar sem licença, lançar efluentes fora do padrão, suprimir vegetação em APP, transporte irregular de produtos florestais e omitir informações em licenciamento configuram crimes na Lei nº 9.605/1998. A pessoa jurídica pode sofrer penas restritivas de direitos (suspensão, interdição, proibição de contratar) e TACs onerosos. A gestão de condicionantes e monitoramento é crucial.
6) Mercado de capitais: insider trading e manipulação
Negociação com base em informação privilegiada (art. 27-D da Lei nº 6.385/1976) e manipulação de preços sujeitam administradores, colaboradores e controladores a sanções criminais e administrativas. Controles sobre janelas de negociação, listas de restringidos e muralhas de informação (Chinese walls) são essenciais.
7) Crimes contra consumidores e publicidade enganosa
Propagandas enganosas, omissões de riscos, cláusulas abusivas e práticas de recall tardio geram responsabilidade administrativa, civil e penal, com base no CDC, em reguladores setoriais e em legislações municipais/estaduais. Programas de qualidade de produto, segurança e transparência reduzem exposição.
8) Propriedade intelectual e concorrência desleal
Uso indevido de marcas, patentes, segredos industriais e software (Lei nº 9.279/1996 e normas correlatas) pode caracterizar crime e gerar perdas financeiras severas. Adoção de programas de proteção de PI e controle de acesso é mandatória em cadeias tecnológicas.
9) Trabalho e direitos humanos
Redução a condição análoga à de escravo (art. 149 do CP), trabalho infantil e violações graves de saúde e segurança geram riscos penais, civis e trabalhistas, além de restrições em listas públicas e cancelamento de contratos. Due diligence de cadeia e cláusulas contratuais robustas são imprescindíveis.
Distribuição meramente ilustrativa; substitua por dados do seu setor e portfólio de riscos.
Como as empresas são investigadas e punidas
Fluxos de enforcement
- Administrativo: CADE, órgãos ambientais, Procons, CVM, Banco Central e demais reguladores aplicam multas, acordos e restrições.
- Cível: ações de improbidade, ações civis públicas e indenizações.
- Penal: pessoas físicas (e jurídicas, no ambiental) respondem por crimes com base em dolo ou culpa; cabem colaboração premiada, ANPP e acordos específicos.
- Mapeamento de riscos com matriz por processos, terceiros e operações.
- Políticas e códigos (anticorrupção, concorrencial, PLD/FT, brindes/hospitalidade, doações e patrocínios).
- Due diligence de terceiros e monitoramento contínuo (KYC/KYB).
- Controles financeiros e segregação de funções (P2P, T&E, adiantamentos).
- Canal de denúncias independente, proteção ao denunciante e investigações internas.
- Treinamento baseado em risco para alta gestão e áreas críticas.
- Governança (comitê de ética/ESG, reporte ao conselho) e RACI claro.
- Monitoramento e auditoria de KPIs; asseguração de dados relevantes.
- Planos de resposta a crises (buscas e apreensões, incidentes ambientais, cyber).
- Remediação e melhoria contínua com base em achados e sanções.
Investigações internas: passos seguros
Fluxo recomendado
- Triagem e escopo; preservação de provas (legal hold) e cadeia de custódia.
- Entrevistas e revisão documental (e-mails, mensagens, contratos, logs).
- Forense de dados, análise transacional e mapeamento de beneficiários finais.
- Relatório com achados, apuração de dolo/culpa, cálculo de danos e recomendações.
- Avaliar autorreporte e acordos quando aplicáveis para mitigar sanções.
Conclusão
Os crimes corporativos mais comuns no Brasil giram em torno de corrupção, fraudes tributárias, cartéis, lavagem, ambiental, mercado de capitais, consumidor e PI. A defesa eficaz combina prevenção (governança, políticas, treinamento e tecnologia), detecção (monitoramento e canal de denúncias) e resposta (investigação, remediação e negociação com autoridades). Ao transformar compliance em alavanca estratégica — com dados auditáveis, liderança engajada e cultura ética — a empresa reduz riscos legais e reputacionais, protege valor e fortalece sua competitividade.
Guia rápido
- “Crimes corporativos” ou “crimes empresariais” envolvem condutas ilícitas cometidas por empresas ou seus representantes em benefício da entidade ou de terceiros. 0
- Entre os tipos mais comuns no Brasil estão: lavagem de dinheiro, corrupção, fraude contábil, ameaça cibernética e violação de dados, sonegação fiscal e crimes ambientais. 1
- Dados recentes mostram que 4 em cada 10 brasileiros já foram vítimas de alguma forma de fraude, com significativa preocupação empresarial. 2
- O Brasil figura entre os países com maiores alertas para lavagem de dinheiro, com quase três mil ocorrências em 2023. 3
- Na indústria, 54% das empresas relataram ter sofrido roubo ou furto de patrimônio no último ano — o que revela vulnerabilidade corporativa. 4
- Estratégias eficazes de prevenção e detecção envolvem governança corporativa rigorosa, compliance anticorrupção, auditoria interna e monitoramento de indicadores de risco.
FAQ
1. O que caracteriza um crime corporativo no Brasil?
Um crime corporativo ocorre quando a empresa ou seus representantes praticam conduta ilícita formalmente prevista em lei (ex.: lavagem de dinheiro – Lei nº 9.613/1998; crime contra a ordem econômico-financeira – Lei nº 9.613/1998; corrupção – Lei nº 12.846/2013) com o objetivo de obter vantagem econômica ou favorecer a entidade, os sócios ou terceiros. 5
2. Quais os tipos mais recorrentes de crimes empresariais?
Dentre os mais frequentes no Brasil destacam-se: lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, sonegação fiscal, fraude contábil e prestacional, violação de dados e fraude cibernética, além de atos associados à concorrência desleal e práticas ambientais ilícitas. 6
3. Como as empresas podem ser responsabilizadas?
A responsabilização pode ocorrer na esfera penal, civil e administrativa. A empresa pode responder por meio de multa, obrigar-se à reparação de danos, sofrer interdição e firmar »acordos de leniência«. Além disso, seus dirigentes ou representantes podem responder individualmente se estiver comprovada participação, dolo ou culpa. 7
4. Como a violação de dados se tornou um crime corporativo relevante?
Segundo levantamento, no Brasil os crimes envolvendo dados e armazenamento custaram em média R$ 7,29 milhões às empresas em 2024, com tempo médio de combate de 355 dias. A vulnerabilidade ao cibercrime se insere no espectro de crimes corporativos. 8
5. Qual a relação entre lavagem de dinheiro e crimes empresariais no Brasil?
O Brasil é um dos países com maiores alertas para lavagem de dinheiro no continente. Em 2023 foram quase três mil alertas de operações suspeitas, que são instrumento de crimes empresariais como corrupção, evasão de divisas e fraude financeira. 9
6. Que medidas empresariais previnem ou reduzem o risco de crimes corporativos?
São fundamentais: adoção de programas de compliance eficazes, treinamento e certificação de equipes, due diligence de parceiros, monitoramento de operações suspeitas, auditoria interna, governança ativa e cultura de ética. Essas práticas aumentam a probabilidade de detecção precoce e redução de danos jurídicos e reputacionais.
Fundamentação normativa e técnica
- Lei nº 9.613/1998 – dispõe sobre os crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores. 10
- Lei nº 12.846/2013 – dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil da pessoa jurídica pela prática de atos contra a probidade, a administração pública e o mercado. 11
- Lei nº 9.605/1998 – Lei de Crimes Ambientais, que prevê responsabilização penal da pessoa jurídica e física pelos danos ambientais. 12
- Lei nº 12.529/2011 – trata da repressão aos crimes contra a ordem econômica, incluindo cartel, abuso de poder econômico e fraude à concorrência. 13
- Lei nº 6.404/1976 – estabelece o dever dos administradores de agirem com diligência, lealdade e transparência, base vital da governança corporativa. 14
Considerações finais
Os crimes corporativos representam grave risco para empresas, investidores, empregados e para toda a sociedade. A prevenção ativa exige não apenas conformidade normativa, mas a construção de uma cultura ética com controle, transparência e responsabilidade. Empresas que negligenciam essas áreas ficam vulneráveis a perdas financeiras, dano à reputação, bloqueios regulatórios e responsabilização penal de seus dirigentes.
Estas informações têm caráter educativo e não substituem a orientação de profissional qualificado em direito empresarial, penal ou compliance. Para análise e medidas específicas, busque a consultoria de advogado ou auditor especializado.

