Pensão Avoenga: Quando os Avós Precisam Pagar, Como se Calcula e Quando Pode Ser Exonerada
Pensão alimentícia avoenga: conceito, natureza e finalidade
A chamada pensão alimentícia avoenga é a prestação de alimentos devida pelos avós aos netos em situações excepcionais. Seu fundamento não é substituir a obrigação dos pais, mas complementá-la quando estes não podem cumprir o dever legal. O instituto decorre da solidariedade familiar e da regra de que o direito a alimentos é recíproco entre parentes e se estende aos ascendentes (art. 1.696 do CC), observada a ordem de graus (art. 1.698 do CC) e o binômio necessidade–possibilidade (art. 1.694 do CC).
Na prática, os tribunais brasileiros consolidaram que a obrigação avoenga tem natureza complementar e subsidiária — isto é, só se ativa na falta (total ou parcial) da prestação pelos pais. Essa diretriz tutela o melhor interesse da criança e do adolescente (vetor do ECA), sem romper a lógica de que o primeiro chamado a custear o sustento é o genitor.
A pensão avoenga é excepcional: serve para complementar ou, se necessário, suprir provisoriamente a pensão devida pelos pais quando comprovada a impossibilidade destes.
Base legal e princípios aplicáveis
Regras do Código Civil
- Art. 1.694: qualquer parente pode pedir alimentos de que necessite para viver de modo compatível com a sua condição social, proporcionalmente aos recursos do devedor (binômio necessidade–possibilidade).
- Art. 1.696: o direito a alimentos é recíproco entre pais e filhos e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.
- Art. 1.698: não podendo o parente, em primeiro lugar chamado, cumprir a obrigação na proporção necessária, serão chamados os de grau imediato (avós) a concorrer; o juiz pode distribuir a obrigação entre todos os obrigados conforme as possibilidades de cada um.
Outros fundamentos
- ECA: prioridade absoluta aos direitos de crianças e adolescentes; dever da família, sociedade e Estado em assegurar-lhes, com absoluta prioridade, o direito à vida, saúde, alimentação e educação.
- Princípio da solidariedade familiar: a família como rede de apoio patrimonial e afetivo, especialmente quando direitos fundamentais do alimentando estão ameaçados.
Os tribunais superiores têm afirmado que a obrigação dos avós é complementar e subsidiária, exigindo prova robusta da impossibilidade do genitor e da necessidade do neto. Admite-se a divisão proporcional entre avós paternos e maternos quando ambos têm condições.
Quando os avós devem pagar (hipóteses típicas)
Não basta alegar que o pai ou a mãe “não paga” ou “dificulta”. É indispensável demonstrar incapacidade econômica (total ou parcial) do genitor de arcar com a pensão sem comprometer a própria subsistência digna. Em geral, a obrigação avoenga surge em três grupos de situações:
- Impossibilidade absoluta do genitor: desemprego duradouro aliado a incapacidade temporária; doença grave; prisão sem renda; desaparecimento ou falecimento do genitor sem deixar pensão ou seguro.
- Impossibilidade relativa com lacuna parcial: o genitor contribui com valor insuficiente diante das despesas comprovadas (ex.: saúde, escola, alimentação), cabendo aos avós complementar a diferença segundo as suas possibilidades.
- Risco ao mínimo existencial do alimentando: urgência que exige medida liminar de alimentos para evitar prejuízo grave (ex.: necessidade de tratamento médico ou medicação contínua que o genitor não consegue custear). Nesses casos, a contribuição avoenga pode ser **provisória**, até revisão da capacidade parental.
Provas necessárias e ônus de demonstração
Do lado do alimentando (representado pelo responsável)
- Comprovação detalhada das despesas ordinárias e extraordinárias (orçamentos, notas, recibos, mensalidades, convênios, medicamentos, transporte, moradia proporcional).
- Histórico de inadimplência do genitor, tentativas de cumprimento, eventual execução anterior e resultado (ex.: negativa por desemprego/insolvência).
- Elementos que indiquem a capacidade econômica dos avós (declarações de imposto de renda, contracheques, pro labore, aposentadoria).
Do lado dos avós
- Provas de sua capacidade/limitação: aposentadoria, gastos com saúde, dependentes, empréstimos e outras obrigações fixas.
- Indicação de que a obrigação dos pais é prioritária, requerendo que o juiz chame os genitores ao processo para distribuição equitativa (quando cabível).
1) Necessidade comprovada do neto (padrão de vida compatível e despesas essenciais).
2) Possibilidade do avô/avó sem violar o próprio sustento e saúde.
3) Proporcionalidade: todos os obrigados concorrem segundo as respectivas condições.
Como o juiz calcula a pensão avoenga
O magistrado aplica o binômio necessidade–possibilidade e considera a proporcionalidade entre os devedores. Na prática, o cálculo ocorre em duas etapas:
- Definição do quantum necessário ao alimentando (orçamento mensal básico + despesas específicas).
- Distribuição do encargo entre genitores (se presentes) e avós (quando a prova demonstrar necessidade de complementação), ponderando rendas e despesas fixas.
Processo e competência
Rito e foro
- As ações de alimentos seguem a Lei 5.478/1968 (Lei de Alimentos) e as regras do CPC aplicáveis.
- O foro competente é o do domicílio do alimentando (criança/adolescente), o que facilita o acesso à Justiça.
Pedidos usuais na inicial
- Fixação de alimentos provisórios (urgência) com base em prova sumária de renda e necessidade.
- Chamamento do(s) genitor(es) e dos avós, com pedido de divisão proporcional.
- Determinação de desconto em folha (quando for o caso) ou depósito em conta vinculada.
- Previsão de revisão (majorar, reduzir ou exonerar) diante de alterações supervenientes.
• Regra do CPC para execução de alimentos: possibilidade de prisão civil para as parcelas recentes e execução patrimonial para as pretéritas.
• Em pensão avoenga, como a obrigação é subsidiária, a jurisprudência costuma prestigiar a execução patrimonial quando há alternativas; mas, fixada judicialmente a obrigação e havendo inadimplemento atual, a prisão civil é admitida em tese, em caráter excepcional e conforme o caso concreto.
Divisão entre avós paternos e maternos
Quando constatado que ambos os ramos familiares têm condições de contribuir, os tribunais costumam ratear a obrigação entre avós paternos e avós maternos, sem exigência de paridade matemática. O critério é a proporção da capacidade econômica. Não há, como regra, litisconsórcio passivo necessário entre todos os avós; contudo, é recomendável incluí-los para permitir distribuição equânime e evitar ações múltiplas.
Revisão, exoneração e regresso
Revisão e exoneração
- Se o genitor retoma a capacidade contributiva (emprego, melhora de renda), a obrigação dos avós pode ser reduzida ou exonerada.
- Se os avós sofrem redução relevante de renda ou saúde (ex.: aposentadoria mínima, gastos médicos elevados), caberá revisão do valor.
- Na maioridade do alimentando, a pensão não cessa automaticamente; pode continuar se houver necessidade comprovada (universidade, saúde), mas, em geral, a obrigação se volta novamente aos pais, mantida a natureza subsidiária dos avós.
Direito de regresso
Quando os avós pagam na ausência ou insuficiência dos pais, podem buscar ressarcimento do que desembolsaram — diretamente em ação própria ou por via de chamamento ao processo nos termos do art. 1.698 do CC. Esse regresso observa a proporção da responsabilidade do genitor, que é o principal devedor.
Questões frequentes e casos-limite
Avós com renda modesta
Não há presunção de riqueza dos avós. A contribuição pode ser simbólica ou até inexistente se a renda for mínima e houver gastos de saúde que inviabilizam o aporte. O juiz pode orientar a busca de políticas públicas (assistência social, medicamentos, creches) paralelamente.
Genitor inadimplente e oculto
Se o genitor se oculta e não é localizado, o juiz pode suprir provisoriamente com alimentos avoengos, sem prejuízo de diligências e futura ação regressiva contra o pai/mãe.
Avós guardiões (quando a criança mora com eles)
Se os avós exercem guarda fática ou judicial, as despesas diretas já são elevadas; a ação adequada, em regra, é exigir pensão dos genitores. A pensão avoenga, nesse contexto, só fará sentido se outro ramo familiar puder equilibrar o orçamento e houver prova de que os genitores não têm condições.
Boas práticas para peticionar e defender
Para quem pede (representante do menor)
- Montar dossiê financeiro mensal com planilhas e comprovantes; separar fixas (aluguel, escola) de variáveis (saúde, transporte).
- Pedir alimentos provisórios em valor razoável e plausível desde a inicial.
- Requerer a inclusão de todos os avós e do(s) genitor(es) para o juiz ratear desde logo segundo as capacidades.
- Indicar conta bancária exclusiva para recebimentos e facilitar o desconto automático.
Para os avós (defesa responsável)
- Exibir com transparência rendas e despesas, especialmente as médicas, e propor valor dentro da sua realidade.
- Requerer a vinda do genitor aos autos e a divisão proporcional.
- Pedir que a obrigação seja, se for o caso, temporária e condicionada à reavaliação em prazo certo.
- Confundir pensão avoenga com “substituição automática” da pensão dos pais — não é; a obrigação é subsidiária.
- Deixar de comprovar a impossibilidade do genitor (ônus probatório essencial).
- Pedir valor descolado das possibilidades dos avós, o que gera indeferimento ou redução drástica.
Exemplo didático de distribuição (valores fictícios)
Moradia proporcional (R$ 700), alimentação (R$ 600), escola (R$ 950), transporte (R$ 250), saúde/medicação (R$ 300), lazer/vestuário (R$ 300).
Total: R$ 3.100
Mãe: renda R$ 3.200 → capacidade R$ 800.
Pai: renda irregular (bicos) → capacidade R$ 400.
Avós paternos: aposentadorias somadas R$ 6.000 → capacidade R$ 700.
Avós maternos: renda somada R$ 5.000 → capacidade R$ 600.
Rateio sugerido: mãe R$ 1.200 (inclui despesas in natura), pai R$ 400, avós paternos R$ 800, avós maternos R$ 700.
Conclusão
A pensão alimentícia avoenga é um mecanismo de proteção do menor que funciona como rede de segurança da família. Seu traço essencial é a subsidiariedade: primeiro se exige dos pais; comprovada a insuficiência, chamam-se os avós para complementar de modo proporcional. Para que a solução seja justa e eficaz, três pilares devem estar bem estabelecidos no processo: (i) prova concreta da necessidade do alimentando; (ii) transparência sobre as possibilidades de cada devedor; (iii) cláusulas de revisão para adaptar o encargo a mudanças de renda ou de saúde. Quando respeitados, esses elementos viabilizam uma prestação adequada, preservam a dignidade do menor e evitam a sobrecarga desproporcional dos idosos, reafirmando a solidariedade geracional que inspira o direito de família contemporâneo.
Base técnica (síntese legal e jurisprudencial)
- Código Civil — art. 1.694 (binômio necessidade–possibilidade); art. 1.696 (alimentos recíprocos e extensão a ascendentes); art. 1.698 (chamamento de parentes de grau imediato e divisão proporcional).
- Estatuto da Criança e do Adolescente — prioridade absoluta e proteção integral (alimentos como direito fundamental).
- Lei de Alimentos 5.478/1968 e CPC — rito de alimentos, alimentos provisórios, execução (prisão civil para parcelas recentes, execução patrimonial para pretéritas).
- Orientação consolidada dos tribunais superiores — obrigação avoenga de natureza complementar e subsidiária (entendimento dominante), com possibilidade de divisão proporcional entre avós paternos e maternos e preferência por chamamento dos genitores.
1. O que é pensão alimentícia avoenga?
A pensão avoenga é a obrigação excepcional em que os avós são chamados a contribuir com o sustento dos netos, quando os pais não têm condições financeiras de arcar integralmente com os alimentos. Tem natureza subsidiária e complementar, conforme os artigos 1.696 e 1.698 do Código Civil.
2. Os avós são obrigados a pagar pensão mesmo se os pais estiverem vivos?
Sim, desde que comprovada a impossibilidade total ou parcial dos pais em custear a pensão. Os avós só são chamados quando o dever dos genitores não pode ser cumprido adequadamente. É uma obrigação subsidiária, e não automática, conforme o art. 1.698 do Código Civil.
3. Como é calculado o valor da pensão avoenga?
O juiz aplica o binômio necessidade–possibilidade: avalia as despesas do neto e a capacidade financeira de cada avô. Quando ambos os ramos familiares têm condições, a obrigação pode ser dividida proporcionalmente entre avós paternos e maternos, segundo a jurisprudência consolidada do STJ.
4. O que acontece se os avós não tiverem condições financeiras?
Se os avós também não puderem arcar com a pensão sem prejudicar sua própria subsistência, o juiz pode negar o pedido ou fixar valor simbólico. A obrigação deve respeitar a proporcionalidade e o mínimo existencial do idoso, conforme os princípios da dignidade humana e da solidariedade familiar.
5. Quando a pensão avoenga pode ser encerrada?
A obrigação pode ser revisada ou extinta quando o genitor volta a ter condições de pagar, quando o neto atinge a maioridade e não comprova necessidade, ou quando os avós sofrem redução de renda significativa. A exoneração depende de decisão judicial fundamentada.
Base técnica e fontes legais
- Art. 1.694 a 1.698 do Código Civil – regulam o direito e o dever de prestar alimentos entre parentes e definem a ordem de responsabilidade (pais → avós).
- Lei nº 5.478/1968 – Lei de Alimentos, que estabelece o rito processual para ações de alimentos e fixação provisória.
- Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – art. 4º e 22: reforça o dever da família de garantir a subsistência e o desenvolvimento integral da criança.
- STJ, Súmula 596 – a obrigação dos avós é complementar e subsidiária, devendo ser comprovada a incapacidade dos pais.
- CF/88, art. 229 – consagra a solidariedade familiar e o dever de assistência recíproca entre pais e filhos, extensível aos ascendentes.