Inventário Internacional: Entenda as Regras, Procedimentos e Cuidados Essenciais
Inventário internacional: funcionamento e aplicabilidade
O inventário internacional é o procedimento utilizado para administrar e partilhar os bens de uma pessoa falecida que possuía patrimônio em mais de um país. Esse tipo de inventário é cada vez mais comum em razão da globalização, da mobilidade internacional e das novas formas de investimento no exterior. Ele exige o conhecimento das leis sucessórias de diferentes jurisdições e o uso de mecanismos de cooperação entre tribunais de países distintos.
No Brasil, o inventário é regulado pelo Código de Processo Civil e pela Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB). Contudo, quando há bens fora do território nacional, a sucessão passa a ser regida também pela legislação do país onde esses bens estão localizados. Por isso, é fundamental compreender os limites da jurisdição brasileira e a necessidade de homologar decisões estrangeiras.
Conceito e fundamentos legais
O inventário internacional é o conjunto de medidas judiciais ou extrajudiciais destinadas a apurar o patrimônio deixado por uma pessoa falecida que possuía bens em diferentes países. O objetivo é assegurar que cada jurisdição trate da sucessão apenas dos bens sob sua autoridade territorial. A Constituição Federal, o Código Civil e o CPC delimitam a competência da Justiça brasileira para os bens situados no Brasil, mesmo que o falecido fosse domiciliado no exterior.
Artigo 10 da LINDB: a sucessão é regida pela lei do domicílio do falecido, mas os bens situados no Brasil seguem a lei brasileira.
Artigo 23, II, do CPC: compete exclusivamente ao juiz brasileiro o inventário e a partilha dos bens situados no território nacional.
Quando o inventário internacional é necessário
O inventário internacional ocorre quando o falecido possuía:
- Bens imóveis ou contas bancárias em países diferentes;
- Investimentos internacionais, ações ou empresas no exterior;
- Residência habitual fora do Brasil, mas patrimônio também no país;
- Testamentos redigidos segundo as leis de outro país.
Nesses casos, cada país conduzirá um processo de inventário próprio, respeitando suas normas locais. Contudo, é possível que um dos inventários seja utilizado como referência para evitar duplicidades e acelerar a partilha global do patrimônio.
Etapas do inventário internacional
O procedimento varia conforme a legislação do país envolvido, mas geralmente segue uma sequência lógica:
- Levantamento de bens e dívidas em todos os países onde o falecido mantinha patrimônio;
- Apresentação do testamento e verificação de sua validade internacional;
- Homologação de documentos estrangeiros no Brasil, conforme a Convenção da Apostila de Haia;
- Abertura de inventário local no país onde há bens, nomeando inventariante e advogados locais;
- Partilha de bens conforme a legislação sucessória de cada país.
Dica prática: brasileiros com bens no exterior devem elaborar um testamento internacional ou um planejamento sucessório com validade transnacional. Isso evita litígios, custos elevados e demora na transmissão da herança.
Competência da justiça brasileira
A Justiça brasileira só é competente para julgar inventários relativos a bens situados no Brasil. Caso o falecido tenha patrimônio no exterior, o inventário estrangeiro não pode ser conduzido aqui, mas suas decisões podem ser reconhecidas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) mediante homologação de sentença estrangeira.
Exemplo: Um brasileiro que vivia em Portugal e possuía imóveis no Brasil e na França deixará dois inventários — um em Portugal, abrangendo seus bens no país e outro no Brasil, relativo aos imóveis brasileiros. As decisões portuguesas podem ser homologadas no Brasil para efeitos de reconhecimento de partilha.
Homologação de sentença estrangeira
Para que uma decisão de inventário estrangeira produza efeitos no Brasil, é necessário passar pelo procedimento de homologação de sentença estrangeira no STJ. Os requisitos incluem:
- Sentença final e válida no país de origem;
- Tradução juramentada para o português;
- Apostilamento de acordo com a Convenção de Haia;
- Respeito à ordem pública brasileira e à reciprocidade diplomática.
O procedimento de homologação permite que decisões estrangeiras sobre heranças tenham valor jurídico no Brasil, facilitando a transferência de bens, o registro em cartórios e o encerramento de inventários complementares.
Tributação e ITCMD em inventários internacionais
O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) incide sobre a transmissão de bens localizados no Brasil, ainda que o falecido tenha morrido no exterior. Cada estado possui regras próprias, mas a cobrança depende do local do bem. Quando há bens no exterior, pode ocorrer a dupla tributação, caso o outro país também exija imposto sobre herança.
Atenção: O STF decidiu que o ITCMD sobre bens localizados no exterior só pode ser cobrado se houver lei complementar federal regulamentando o tema — o que ainda não foi editado. Assim, a cobrança é, atualmente, inconstitucional.
Documentos necessários
Os principais documentos exigidos para um inventário internacional são:
- Certidão de óbito (original e traduzida);
- Certidões de bens e propriedades no Brasil e no exterior;
- Testamento (se houver), apostilado e traduzido;
- Documentos de identidade dos herdeiros e procuradores;
- Comprovantes de domicílio do falecido.
Todos os documentos estrangeiros devem ser apostilados e traduzidos por tradutor juramentado para que tenham validade no Brasil, conforme o Decreto nº 8.660/2016 (Apostila de Haia).
Desafios e soluções práticas
O principal desafio do inventário internacional é a coordenação entre diferentes sistemas jurídicos. Diferenças quanto à forma de partilha, à ordem de herdeiros e aos prazos processuais podem gerar atrasos e conflitos. A solução é adotar uma estratégia de cooperação jurídica internacional e, sempre que possível, realizar um planejamento sucessório preventivo em vida.
Ferramentas úteis: Apostila de Haia, acordos bilaterais, cartas rogatórias e testamentos públicos internacionais são instrumentos que facilitam a tramitação de heranças entre países.
Conclusão
O inventário internacional é um procedimento complexo que exige atuação coordenada de profissionais especializados em direito sucessório e internacional. A observância das regras locais, a regularização documental e a homologação de decisões são etapas essenciais para evitar litígios e garantir a segurança jurídica dos herdeiros. Planejar antecipadamente é o melhor caminho para reduzir custos, prazos e incertezas na sucessão internacional.
Guia Rápido: Como Funciona o Inventário Internacional
O inventário internacional é o procedimento necessário quando uma pessoa falece deixando bens em mais de um país. Ele é fundamental para garantir que o patrimônio do falecido seja partilhado corretamente entre os herdeiros, respeitando as leis de cada país envolvido. Esse processo exige atenção especial às regras de jurisdição, impostos, tradução de documentos e, em muitos casos, à homologação de decisões estrangeiras pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em termos simples, se o falecido tinha bens no Brasil e no exterior, será necessário abrir um inventário em cada país. No Brasil, o procedimento é regido pelo art. 23, II do Código de Processo Civil e pelo art. 10 da LINDB. Já no exterior, segue-se a legislação local. Para que as decisões de outro país tenham validade aqui, é obrigatória a homologação de sentença estrangeira.
Base Legal: O art. 10 da LINDB determina que a sucessão é regida pela lei do domicílio do falecido, mas os bens situados no Brasil devem seguir a lei brasileira. Isso significa que, mesmo que a pessoa viva fora, os bens brasileiros só podem ser partilhados segundo as normas nacionais.
Etapas principais do inventário internacional
As fases mais comuns do processo incluem:
- Levantamento do patrimônio global — identificação de todos os bens e dívidas no Brasil e fora dele;
- Apresentação do testamento — caso exista, é necessário validar sua autenticidade e aplicabilidade no exterior;
- Tradução juramentada — todos os documentos estrangeiros precisam ser traduzidos para o português e apostilados;
- Inventário local — abertura de processo judicial ou extrajudicial nos países onde há patrimônio;
- Homologação — decisões estrangeiras só produzem efeito no Brasil após homologação pelo STJ.
Atenção: se o falecido possuía contas bancárias, investimentos, imóveis ou empresas no exterior, os herdeiros devem buscar assessoria jurídica internacional para evitar perda de prazos, multas e cobranças indevidas de impostos.
Tributação e custos
No Brasil, o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) incide apenas sobre os bens localizados no território nacional. Entretanto, o STF decidiu que o imposto sobre herança de bens no exterior só poderá ser cobrado após a criação de lei complementar federal, o que ainda não ocorreu. Por isso, muitos estados não estão autorizados a tributar heranças externas no momento.
No exterior, as regras variam amplamente. Alguns países aplicam altas alíquotas de imposto sucessório e exigem o pagamento antes da partilha. Em situações de dupla tributação, é possível buscar acordos bilaterais ou medidas judiciais para evitar bitributação.
Documentos indispensáveis
- Certidão de óbito apostilada;
- Certidões de bens e registros públicos nos dois países;
- Identificação dos herdeiros e inventariante;
- Comprovantes de residência e documentos de propriedade;
- Tradução juramentada e apostila de Haia.
Dica prática: Mantenha todos os documentos organizados, apostilados e com cópias autenticadas. Isso evita atrasos na homologação e reduz custos cartoriais.
Resumo estratégico
O sucesso de um inventário internacional depende de planejamento prévio. Elaborar um testamento internacional, indicar procuradores locais e registrar bens de forma regular nos países envolvidos reduz significativamente a burocracia. Em casos mais complexos, pode ser necessário abrir inventários paralelos ou solicitar cooperação jurídica internacional entre tribunais. O apoio de advogados especializados em direito internacional privado é essencial para garantir que a partilha seja legítima e reconhecida em todos os países envolvidos.
Mensagem-chave: O inventário internacional é a ponte entre diferentes sistemas jurídicos. Ele protege o direito dos herdeiros, garante segurança patrimonial e assegura que a herança seja distribuída de forma justa e conforme a lei de cada país envolvido.
O que é um inventário internacional?
É o procedimento utilizado para administrar e partilhar os bens deixados por uma pessoa falecida que possuía patrimônio em mais de um país, seguindo as leis de cada jurisdição envolvida.
Quando o inventário internacional é necessário?
Quando o falecido possuía bens, contas, investimentos ou imóveis localizados fora do Brasil, exigindo a abertura de inventário em mais de um país.
O Brasil reconhece inventários feitos no exterior?
Sim. O inventário estrangeiro pode ser reconhecido no Brasil após a homologação de sentença estrangeira pelo STJ, que confere validade jurídica ao processo.
É possível fazer inventário internacional de forma extrajudicial?
Apenas o inventário dos bens localizados no Brasil pode ser feito em cartório. No exterior, o formato dependerá da legislação local e, em geral, exige procedimento judicial.
Quais documentos são exigidos no inventário internacional?
São necessários documentos como certidão de óbito, testamento, comprovantes de bens, documentos dos herdeiros, tradução juramentada e apostilamento de Haia.
Como ocorre a tributação de bens no exterior?
O ITCMD incide apenas sobre bens no Brasil. O STF declarou que não há base legal para cobrança sobre heranças no exterior até a criação de uma lei complementar federal.
É possível evitar a dupla tributação em inventários internacionais?
Sim, por meio de tratados internacionais de bitributação, acordos bilaterais ou medidas judiciais específicas em cada país envolvido.
O testamento estrangeiro tem validade no Brasil?
Sim, desde que seja homologado pelo STJ e respeite a legislação brasileira quanto à legítima dos herdeiros e à forma do ato jurídico.
Quem é competente para conduzir o inventário no Brasil?
O juiz brasileiro tem competência exclusiva para os bens situados no Brasil, conforme o art. 23, II, do Código de Processo Civil.
Como facilitar um inventário internacional?
A melhor forma é realizar um planejamento sucessório internacional, com testamento válido em vários países, assessoria jurídica especializada e documentação organizada.
Base técnica e fundamentos legais do inventário internacional
O inventário internacional é regulado no Brasil por um conjunto de normas que estabelecem a competência da Justiça nacional e as regras aplicáveis quando há bens em diferentes países. Ele se apoia em dispositivos constitucionais, civis e processuais, bem como em tratados internacionais que garantem o reconhecimento mútuo de decisões entre Estados soberanos.
1. Constituição Federal — artigo 5º, inciso XXXI
Define que a sucessão de bens de estrangeiros situados no Brasil será regida pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que esta for mais favorável. O princípio também se aplica, de forma análoga, às heranças de brasileiros com bens no exterior, resguardando o direito de seus herdeiros nacionais.
2. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) — artigo 10
Estabelece que a sucessão por morte é regida pela lei do domicílio do falecido, mas os bens situados no Brasil obedecem à lei nacional. Essa é a base principal que define a aplicação da lei brasileira a bens localizados em território nacional, mesmo que o falecido fosse domiciliado em outro país.
3. Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) — artigo 23, inciso II
Determina que somente a Justiça brasileira tem competência para julgar ações de inventário e partilha de bens situados no Brasil, ainda que o falecido seja estrangeiro ou resida fora do país. Esse dispositivo é essencial para delimitar a atuação do Judiciário brasileiro no contexto internacional.
4. Código Civil (Lei nº 10.406/2002) — artigos 1.784 a 1.829
Disciplina o processo sucessório, a transmissão da herança, a ordem de vocação hereditária e os direitos do cônjuge e dos descendentes. Esses artigos são aplicáveis aos bens situados no Brasil, mesmo quando o falecido possuía também bens no exterior.
5. Convenção da Apostila de Haia (Decreto nº 8.660/2016)
Regulamenta o reconhecimento de documentos públicos emitidos em países signatários. Testamentos, certidões e sentenças estrangeiras devem ser apostilados para terem validade no Brasil, dispensando a antiga legalização consular.
6. Recurso Especial nº 2.080.842/SP — Superior Tribunal de Justiça (STJ)
O STJ consolidou o entendimento de que bens localizados no exterior não integram o inventário brasileiro. Cada país deve conduzir o processo sucessório referente aos bens sob sua jurisdição. A decisão reafirma o princípio da soberania e da territorialidade.
7. Convenção Interamericana sobre Cartas Rogatórias (OEA)
Permite a cooperação jurídica internacional entre países signatários, viabilizando o envio e o cumprimento de atos judiciais relativos a heranças, notificações e citações entre jurisdições distintas.
Aplicação prática e reconhecimento de sentenças estrangeiras
Para que uma decisão estrangeira sobre partilha de bens tenha validade no Brasil, ela precisa ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Esse procedimento assegura que a sentença estrangeira não fira a ordem pública nacional nem viole direitos fundamentais dos herdeiros brasileiros. Após a homologação, o documento passa a ter os mesmos efeitos de uma decisão judicial brasileira e pode ser utilizada em cartórios e órgãos públicos.
Documentos exigidos para homologação no STJ:
- Sentença estrangeira final e definitiva;
- Prova da citação válida das partes;
- Tradução juramentada para o português;
- Apostila de Haia ou legalização consular;
- Comprovação de que não ofende a ordem pública brasileira.
Encerramento e conclusões
O inventário internacional representa um dos temas mais complexos do Direito Internacional Privado. Ele exige coordenação entre diferentes sistemas jurídicos, observância de regras de competência e respeito aos tratados internacionais. O Brasil, por meio da LINDB, do CPC e da Constituição Federal, estabelece limites claros para a atuação da Justiça nacional e garante a segurança jurídica necessária às famílias com patrimônio em múltiplos países.
Na prática, o êxito em um inventário internacional depende da regularização documental, do uso correto de mecanismos de cooperação internacional e da assessoria jurídica especializada. O planejamento sucessório em vida, a elaboração de testamentos com validade internacional e o cumprimento dos requisitos de apostilamento e tradução juramentada são medidas indispensáveis para evitar litígios e garantir a rápida transmissão da herança aos herdeiros.
Fontes legais e de referência:
- Constituição Federal de 1988 — art. 5º, XXXI;
- Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro — art. 10;
- Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) — art. 23, II;
- Código Civil (Lei nº 10.406/2002) — arts. 1.784 a 1.829;
- Decreto nº 8.660/2016 — Convenção da Apostila de Haia;
- Convenção Interamericana sobre Cartas Rogatórias — OEA;
- Recurso Especial nº 2.080.842/SP — STJ.