Autorização de Serviço Público: Conceito, Quando Usar e Como Funciona
Autorização de serviço público: conceito, natureza e quando usar
A autorização de serviço público é o instrumento pelo qual a Administração Pública autoriza um particular a executar, em seu nome e sob sua fiscalização, uma determinada atividade de interesse coletivo que não exige o mesmo grau de estabilidade, investimentos e rigidez contratual das concessões e permissões. Na tradição do Direito Administrativo, a autorização figura como um ato administrativo unilateral, de natureza discricionária e precária, normalmente personalíssima e, via de regra, intransferível. A prática contemporânea, contudo, mostra cenários setoriais em que a autorização se contratualiza por meio de um termo de autorização, com deveres, metas e sanções, mantendo a essência de maior flexibilidade e menor densidade regulatória em comparação aos demais modelos de delegação.
Base normativa e posição da autorização no sistema
Constituição e leis setoriais
A Constituição prevê a prestação de serviços públicos diretamente ou mediante delegação, com ênfase em concessão e permissão (art. 175). A autorização aparece como figura atípica de delegação em alguns setores (p. ex., telecomunicações, transportes, radiodifusão e atividades específicas de energia), onde as leis setoriais legitimam a outorga por autorização, geralmente com procedimento simplificado, sem exclusividade e com obrigações proporcionais ao risco.
Natureza jurídica
A autorização é, classicamente, um ato administrativo que faculta ao particular o exercício de uma atividade de interesse público, quando compatível com a conveniência e oportunidade administrativas. Embora a Administração possa formalizá-la por termo contendo encargos, não se confunde com a concessão (contrato complexo, prazo longo, matriz de riscos detalhada) nem com a permissão (contrato de adesão, também precedido de licitação). A autorização não gera direito subjetivo de continuidade, e pode ser revogada por motivo de interesse público, com motivação e observância da continuidade do serviço.
Concessão → contrato robusto, prazo longo, investimentos intensivos, tarifa + contraprestação;
Permissão → contrato de adesão, maior flexibilidade, serviços locais capilarizados;
Autorização → ato (ou termo) precário, discricionário, sem exclusividade, adequado a serviços pulverizados e dinâmicos.
Características essenciais da autorização
Discricionariedade e precariedade
A Administração avalia conveniência e oportunidade para autorizar, manter, ajustar ou revogar a outorga, desde que motivado e respeitada a continuidade do serviço. A precariedade não autoriza arbitrariedade: aplicam-se devido processo, contraditório (quando cabível) e proporcionalidade nas medidas.
Personalíssima e, em regra, intransferível
A autorização liga-se às condições pessoais do autorizado (capacidade técnica, idoneidade, requisitos específicos). A transferência de titularidade, quando admitida pela lei ou pelo termo, exige anuência do poder autorizante.
Sem exclusividade e com menor densidade regulatória
É comum a coexistência de múltiplos autorizados em um mesmo território, sem monopólio e com entrada e saída mais ágeis que nos regimes concessórios. As obrigações são moduladas para não onerar excessivamente a atividade e estimular a competição e a inovação.
Procedimento de outorga: como ocorre na prática
Chamamento, credenciamento e seleção simplificada
Na autorização, a Administração pode optar por chamamentos públicos ou credenciamentos com requisitos objetivos (técnicos, operacionais, de segurança e de regularidade fiscal). Em setores mais sensíveis, adota-se processo seletivo competitivo, ainda que não necessariamente uma licitação clássica. O foco é garantir isonomia, transparência e capacidade mínima dos operadores, com custo transacional reduzido.
Termo de autorização e fiscalização
O termo descreve objeto, área/rota, prazo (quando houver), condições de operação, indicadores mínimos (qualidade, segurança, tempo de resposta), preços ou tarifas (se houver), sanções e hipóteses de extinção. A fiscalização é exercida pela Administração ou por agência reguladora, com relatórios periódicos e canais de atendimento ao usuário.
• Diagnóstico do serviço e da demanda;
• Requisitos de segurança e qualificação do operador;
• Indicadores mínimos e plano de atendimento ao usuário;
• Critérios de revogação e plano de continuidade;
• Mecanismos de transparência e controle social.
Aplicações típicas da autorização
Telecomunicações (regime privado)
Muitos serviços de telecom são prestados mediante autorização (p. ex., banda larga fixa), com metas e obrigações proporcionais. A multiplicidade de autorizados estimula a concorrência, reduz barreiras de entrada e acelera a expansão de redes.
Transportes e mobilidade
Algumas modalidades de transporte coletivo não exclusivas e de fretamento podem operar por autorização, com cadastro, requisitos de segurança, monitoramento e possibilidade de reordenamento de oferta pela autoridade.
Radiodifusão e serviços afins
Certos serviços de radiodifusão local e complementar admitem outorga por autorização, com atenção a limites técnicos, finalidade e interferências. A autorização, nesses casos, facilita a capilarização informativa.
Energia (atividades específicas)
Determinadas atividades de geração ou autoprodução, bem como aproveitamentos de menor porte, podem ser viabilizadas por autorização (a depender do marco). O objetivo é destravar projetos com menor impacto sistêmico, mantendo padrões de segurança e conexão.
Direitos e deveres do autorizado
Direitos básicos
- Exercer a atividade autorizada nos limites e condições do termo;
- Acesso a processo motivado em caso de revogação ou sanção relevante;
- Tratamento isonômico e transparência regulatória;
- Possibilidade de pedido de revisão de condições em hipóteses objetivas (ex.: alteração normativa relevante).
Deveres principais
- Atender padrões de qualidade e segurança definidos;
- Manter regularidade fiscal e trabalhista e seguro (quando exigido);
- Informar incidentes, interrupções e alterações relevantes;
- Respeitar usuários (SAC, canais de reclamação) e normas de acessibilidade e proteção de dados;
- Submeter-se à fiscalização e às sanções.
Comparativo com concessão e permissão
Para orientar a escolha do gestor, o quadro abaixo resume diferenças materiais que afetam risco, investimento e governança.
| Critério | Autorização | Permissão | Concessão |
|---|---|---|---|
| Natureza | Ato/termo discricionário, precário, sem exclusividade | Contrato de adesão; precária, mas com mais densidade | Contrato robusto; estável, prazo longo |
| Procedimento | Chamamento/credenciamento; pode haver seleção simplificada | Licitação obrigatória | Licitação obrigatória (concorrência/diálogo competitivo) |
| Investimentos (CAPEX) | Baixo/médio | Médio | Alto |
| Remuneração | Preço/tarifa simples; sem exclusividade | Tarifa; regras de revisão simplificadas | Tarifa + contraprestação; revisões complexas |
| Extinção | Revogação motivada, renúncia, anulação | Revogação motivada, caducidade, anulação | Encampação, caducidade, anulação, advento do prazo |
Indicadores e metas mínimas (modelo)
Ainda que a autorização seja menos densa, convém adotar um núcleo mínimo de indicadores de desempenho, transparência e proteção do usuário:
- Qualidade/continuidade: disponibilidade do serviço, tempo de recomposição, taxa de falhas;
- Atendimento: tempo de resposta, índice de reclamações procedentes, NPS;
- Segurança/compliance: incidentes reportados, auditorias, conformidade sanitária/técnica;
- Preço/tarifa: regras de reajuste objetivo quando houver preço regulado;
- Dados abertos: publicação de indicadores agregados e mapeamento de cobertura.
Gráfico comparativo (densidade regulatória x investimento x flexibilidade)
O gráfico a seguir ilustra, de forma indicativa, a posição relativa da autorização frente à permissão e à concessão. Quanto maior a barra, maior o nível do atributo.
Riscos, sanções e extinção
Riscos regulatórios
Como a autorização é mais flexível, o principal risco do operador é a alteração de condições por reordenação do serviço ou revogação motivada. Para mitigar, recomenda-se: requisitos objetivos de entrada, indicadores claros, cronogramas de adaptação e transparência nas mudanças.
Sanções
O termo pode prever advertência, multa, suspensão e cassação da autorização, observando gradação, contraditório e motivação. Em casos graves (risco à vida, fraude, dano ambiental), prevê-se medida cautelar com suspensão imediata e processo subsequente.
Extinção
As hipóteses usuais são: revogação por interesse público, anulação por ilegalidade, cassação por descumprimento de condições, renúncia do autorizado, caducidade (quando prevista) e vencimento do prazo nos casos em que a autorização é temporária. Em qualquer cenário, a Administração deve planejar a continuidade do serviço e comunicar os usuários.
Boas práticas para estruturar autorizações
- Mapeamento de mercado e demanda, com dados públicos;
- Chamamento transparente, requisitos objetivos e prazos realistas;
- Indicadores mínimos (qualidade, segurança, atendimento) e sanções graduadas;
- Plano de continuidade para revogações e reordenações;
- Publicação periódica de dados (cobertura, queixas, incidentes) para controle social;
- Integração com políticas setoriais (mobilidade, inclusão digital, sustentabilidade);
- Respeito a LGPD e acessibilidade;
- Canal de participação do usuário (ouvidoria, consulta e audiência públicas quando pertinente).
Estudos de caso (exemplos ilustrativos)
Banda larga local por autorização
Municípios com baixa cobertura podem fomentar a entrada de pequenos provedores autorizados, exigindo padrões de qualidade, SLAs e transparência de preços. A multiplicidade de autorizados reduz o risco de descontinuidade e acelera a expansão.
Transporte sob demanda/fretamento
O ente regulador estabelece requisitos de segurança, rastreamento, seguro e atendimento, com possibilidade de reordenar rotas e quantitativos conforme demanda sazonal. O modelo autoriza múltiplas empresas, evitando exclusividade e preservando a oferta.
Uso especial de bem público
Quiosques, terminais e pequenas estruturas de apoio podem ser objeto de autorizações com condições urbanísticas, ambientais e de higiene, além de taxa de uso, com possibilidade de revogação para requalificação do espaço.
Conclusão — por que e quando optar pela autorização
A autorização de serviço público não substitui a concessão ou a permissão; ela complementa o repertório do gestor para situações em que a rapidez, a capilaridade e a liberdade de reorganização são cruciais. Seu valor está em permitir a entrada de múltiplos operadores com custos transacionais reduzidos, enquanto a Administração mantém ferramentas ágeis de ordenação, sanção e revogação. Para que produza bons resultados, é indispensável fixar requisitos objetivos, indicadores mínimos, mecanismos de transparência e um plano de continuidade capaz de proteger os usuários diante de eventuais mudanças. Em suma: quando o serviço é não exclusivo, de baixo/médio CAPEX e depende de ajustes frequentes, a autorização tende a ser o instrumento mais eficaz — desde que tecnicamente desenhada e responsavelmente fiscalizada.
Guia rápido — o que é e quando usar a autorização de serviço público
A autorização é o instrumento mais flexível e ágil de delegação de serviços públicos, sendo usada quando a Administração deseja permitir que particulares executem certas atividades de interesse coletivo sem criar vínculo contratual estável como nas concessões ou permissões. É um ato administrativo, e não um contrato, o que significa que o poder público tem liberdade para conceder, modificar ou revogar a autorização conforme o interesse público. Contudo, deve sempre agir de forma motivada e transparente.
Principais características
- É um ato administrativo unilateral, não um contrato;
- Tem natureza discricionária (depende de conveniência do poder público);
- É precária (pode ser revogada a qualquer momento, desde que motivada);
- Não garante direito adquirido à continuidade do serviço;
- Geralmente é personalíssima e intransferível;
- Pode ser usada com vários operadores simultaneamente (sem exclusividade);
- Visa estimular a concorrência e a inovação no mercado público.
Quando optar pela autorização
- Quando o serviço é não exclusivo e admite vários operadores ao mesmo tempo.
- Quando o investimento é baixo e a oferta precisa ser ajustada rapidamente (ex.: transporte fretado, internet regional, quiosques públicos).
- Quando o objetivo é experimentar modelos antes de formalizar uma concessão.
- Quando há necessidade de desburocratizar a prestação, mantendo controle público e padrões mínimos.
Etapas básicas para implantação
- Diagnóstico do serviço: identificar a necessidade, o público e o impacto social da atividade.
- Chamamento público: divulgar as regras para que interessados se cadastrem (credenciamento).
- Emissão do termo de autorização: documento que estabelece deveres, metas, fiscalização e hipóteses de extinção.
- Fiscalização contínua: garantir qualidade, segurança e cumprimento das normas técnicas.
- Revisão e revogação: o poder público pode ajustar, renovar ou revogar a autorização conforme o interesse público.
Diferenças centrais em relação à concessão e à permissão
- Concessão → contrato formal, investimentos altos, prazos longos e exclusividade parcial.
- Permissão → contrato de adesão, licitação simplificada, estabilidade moderada.
- Autorização → ato administrativo simples, curta duração, flexibilidade e múltiplos operadores.
Erros comuns a evitar
- Tratar a autorização como contrato e impor obrigações incompatíveis com sua natureza.
- Revogar sem motivação formal ou sem assegurar continuidade mínima do serviço.
- Falta de transparência nos chamamentos ou ausência de critérios técnicos objetivos.
- Não definir indicadores de desempenho e planos de contingência.
FAQ — Autorização de serviço público (acordeão)
1) O que é autorização de serviço público? conceito
É um ato administrativo, de natureza discricionária e precária, pelo qual a Administração permite a um particular executar determinada atividade de interesse coletivo, em regra sem exclusividade e com possibilidade de revogação motivada.
2) Precisa de licitação para conceder autorização?
Normalmente não se exige a mesma licitação típica das concessões. Porém, é boa prática e frequentemente obrigatório realizar chamamento público/credenciamento com critérios objetivos para garantir isonomia e transparência.
3) Qual a diferença para permissão e concessão?
A autorização é ato unilateral e precário; a permissão é contrato de adesão também mais flexível; a concessão é contrato robusto, com prazo longo e forte matriz de riscos, adequada a investimentos intensivos.
4) A autorização dá direito adquirido de continuidade?
Não. Por ser precária, pode ser revogada por interesse público, com motivação, respeito ao devido processo quando cabível e cuidados com a continuidade do serviço aos usuários.
5) A autorização é transferível ou pode mudar de titular?
Em regra é personalíssima e intransferível. Transferência somente se prevista na norma/termo e mediante anuência expressa do poder autorizante.
6) Como funciona a remuneração do autorizado?
Conforme o setor, pode haver preço/tarifa regulado, com regras simples de reajuste. Em muitos casos, há concorrência simultânea entre vários autorizados, sem monopólio nem contraprestação pública.
7) Quais são as obrigações mínimas do autorizado?
Cumprir padrões de qualidade e segurança, manter regularidade fiscal, observar normas técnicas e de acessibilidade, atender usuários (SAC/ouvidoria), permitir fiscalização e reportar incidentes.
8) Quais as sanções e formas de extinção?
Advertência, multa, suspensão e cassação. A autorização pode terminar por revogação motivada, anulação, renúncia do autorizado, caducidade (se prevista) ou término do prazo.
9) Em quais setores a autorização é mais usada?
Telecomunicações (serviços em regime privado), transportes/fretamento, atividades específicas de energia, radiodifusão local e uso especial de bens públicos (ex.: quiosques/terminais).
10) Quais boas práticas o gestor deve adotar ao autorizar?
Realizar chamamento público, definir requisitos objetivos, estabelecer indicadores de desempenho, prever plano de continuidade para revogações, publicar dados e assegurar motivação dos atos.
Encerramento técnico e referências legais
Base constitucional e legal
A autorização de serviço público encontra fundamento indireto no artigo 175 da Constituição Federal, que prevê a delegação de serviços públicos por concessão ou permissão, sempre mediante licitação. Embora a autorização não esteja expressamente mencionada, a doutrina e a jurisprudência reconhecem seu uso em situações específicas, desde que observados os princípios constitucionais da administração pública (art. 37, caput, CF/88).
- Lei nº 8.987/1995 — Estabelece as normas gerais sobre concessão e permissão, servindo como base analógica para autorizações, principalmente quanto às cláusulas contratuais e garantias de continuidade do serviço.
- Lei nº 9.074/1995 — Complementa a Lei 8.987/1995, trazendo dispositivos aplicáveis a autorizações em setores de energia elétrica e telecomunicações.
- Lei nº 9.472/1997 (Lei Geral de Telecomunicações) — Define o regime de autorização para serviços de telecomunicações em caráter não exclusivo, estabelecendo obrigações de qualidade, universalização e continuidade.
- Lei nº 14.133/2021 — Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, aplicável subsidiariamente aos processos seletivos e chamamentos públicos usados para outorgar autorizações.
Autorização — Ato precário, discricionário, sem exclusividade e de curta duração.
Permissão — Contrato de adesão, licitado, flexível e com estabilidade moderada.
Concessão — Contrato formal, licitado, de longo prazo, com matriz de riscos e investimentos elevados.
Jurisprudência relevante
- STF — Reafirma a validade da autorização como instrumento legítimo de delegação para atividades não exclusivas e de menor impacto econômico, desde que o poder público motive os atos e garanta a continuidade do serviço essencial.
- STJ — Entende que, embora precária, a autorização exige processo administrativo formal para revogação, assegurando o contraditório quando houver prejuízo ao autorizado.
- TCU — Recomenda que as autorizações sejam precedidas de chamamento público e contem com indicadores de desempenho e planos de contingência para evitar descontinuidade.
Instrumentos complementares
Além das leis gerais, há regulamentações específicas editadas por agências reguladoras (como ANEEL, ANTT e ANATEL), que disciplinam autorizações em seus respectivos setores. Essas normas tratam de requisitos técnicos, de segurança, fiscalizações, sanções e critérios de extinção da autorização.
- Formalizar o ato em termo de autorização com cláusulas claras;
- Garantir motivação e publicidade em todas as decisões de outorga e revogação;
- Estabelecer indicadores de qualidade e regras de fiscalização contínua;
- Adotar planos de continuidade para evitar interrupção de serviços essenciais.
Conclusão técnica
A autorização de serviço público é um instrumento que proporciona celeridade, flexibilidade e descentralização na gestão de atividades públicas, sem afastar o controle estatal. Seu uso é adequado para serviços de baixo investimento e alta dinamicidade, permitindo que o poder público atue com agilidade regulatória diante das demandas sociais e tecnológicas. Entretanto, sua aplicação exige planejamento jurídico e observância dos princípios constitucionais da legalidade, publicidade, motivação e eficiência. Assim, a autorização se consolida como uma ferramenta estratégica de governança pública moderna, equilibrando liberdade de iniciativa e proteção do interesse coletivo.
