Teletrabalho e Home Office na Nova CLT: contrato, jornada/produção, reembolso e ergonomia
Teletrabalho e home office: o que a CLT diz hoje (definições, alcance e prioridades legais)
Na CLT atual, teletrabalho (ou trabalho remoto) é a prestação de serviços fora das dependências do empregador, podendo ser preponderante ou não — isto é, o modelo híbrido continua sendo teletrabalho. A ida ao escritório, ainda que habitual para tarefas específicas, não descaracteriza o regime remoto. Essas balizas foram positivadas a partir da MP 1.108/2022 e consolidadas pela Lei 14.442/2022. 0
Capítulo II-A da CLT (arts. 75-A a 75-F) — pilares práticos
- Contrato escrito: o regime deve constar expressamente no contrato, com descrição das atividades remotas e regras de infraestrutura/ferramentas. Alterações pedem aditivo. 1
- Horas de trabalho: se o remoto for por produção/tarefa, não se aplica o capítulo da CLT sobre duração do trabalho (sem controle de jornada). Nos demais casos, a empresa pode (e em geral deve) controlar horas via sistemas, com extras e descansos quando devidos. 2
- Infraestrutura e despesas: quem compra/equipa, quem mantém e como reembolsa devem estar no contrato (art. 75-D). Essas utilidades não integram salário. 3
- Saúde e ergonomia: valem as diretrizes da NR-17 (Ergonomia) — cadeira/mesa, pausas, organização do trabalho e prevenção de fadiga. 4
- Prioridade legal: empregadores devem priorizar o teletrabalho para pessoas com deficiência e para empregados com filhos/criança sob guarda judicial até 4 anos, quando a atividade permitir. 5
Teletrabalho transnacional
Se o empregado foi admitido no Brasil e presta teletrabalho do exterior, a regra geral é aplicar a legislação brasileira (salvo norma específica ou acordo entre as partes). A lei também esclareceu que custos de retorno ao presencial não são do empregador quando o trabalhador se mudou para localidade diversa por opção própria, salvo ajuste contratual. 6
Competência territorial em litígios
Na prática forense recente, a Justiça do Trabalho tem admitido que o trabalhador remoto ajuíze a ação no local em que reside/prestou serviços, sobretudo quando toda a relação se desenvolveu à distância. 7
Home office x teletrabalho
“Home office” é termo coloquial para o trabalho em casa; juridicamente, quando há estrutura estável fora da empresa e uso de TICs, estamos diante de teletrabalho. Se a execução se dá pontualmente fora da empresa (ex.: um dia ou projeto esporádico), em regra não se aplica o regime do Capítulo II-A — mas, ocorrendo controle de jornada, valem as regras de horas/descansos.
Mensagem-chave do Bloco 1
A nova CLT flexibilizou a forma (híbrido conta como remoto) sem abrir mão dos padrões de proteção: contrato escrito, definição de jornada (ou de produção/tarefa), ergonomia e prioridade a grupos protegidos. Dominar esses pilares reduz risco jurídico e melhora a gestão do trabalho à distância.
Como implementar teletrabalho/home office com segurança: cláusulas essenciais e gestão diária
1) Arquitetura contratual (checklist do art. 75-C/75-D)
- Objeto/atividades remotas: descreva a natureza das tarefas, metas e entregáveis, inclusive se o regime é por jornada ou por produção/tarefa. 8
- Local de execução: indique endereço predominante (residência/coworking) e política de alternância para idas ao escritório (não descaracteriza teletrabalho). 9
- Ferramentas/infra: defina quem fornece equipamentos, mobiliário, internet/energia e como será o reembolso (valor fixo, despesa real ou mista). Explicite que tais verbas não têm natureza salarial. 10
- Segurança e ergonomia: anexe guia NR-17 (postura, pausas, iluminação) e termo de ciência; preveja vistoria virtual e canal para adequações. 11
- Dados e confidencialidade: política de LGPD, sigilo, uso de VPN, bloqueios de mídia removível, proibição de compartilhamento doméstico.
- Alteração/reversão: regra e prazo para converter remoto ↔ presencial (aditivo, aviso prévio razoável, exceções emergenciais). 12
- Teletrabalho do exterior (se houver): legislação aplicável, fuso, seguridade, custos de retorno presencial e foro. 13
2) Jornada e controle (onde as ações costumam nascer)
- Por jornada (remoto comum): implemente controle eletrônico (login/logout, app, timesheets) e respeite intervalos, 11h interjornada e DSR; extras geram adicional. Direito à desconexão: defina canais/horários de contato e rondas de alerta para excesso de mensagens.
- Por produção/tarefa: não se aplica o capítulo de duração do trabalho (sem controle formal de horas). Evite “meio-termo”: se há metas de horário, reuniões fixas e alertas de presença, a execução deixa de ser puramente por tarefa. 14
- Híbrido: mantenha a mesma política de registro em casa e no escritório; eventuais ajudas de custo podem variar por dia de presença, mas sem descaracterizar o remoto. 15
3) Despesas e benefícios
- Internet/Energia/Mobiliário: reembolsos/documentos ou auxílio home office mensal. Atenção: cláusula clara evita litígio sobre quem arca com custos do negócio. 16
- Retorno presencial: se o empregado mudou-se por conta própria para local distante e o contrato previu teletrabalho, a lei indica que os custos de retorno não são do empregador (salvo acordo). 17
- Auxílio-alimentação e benefícios: seguem a política/ACT aplicável; o regime remoto por si só não suprime direitos previstos em norma coletiva ou contrato.
4) SST (Saúde e Segurança do Trabalho) em casa
- Treinamento inicial (postura, pausas, ergonomia, arranjo do posto) + autodeclaração fotográfica do ambiente.
- Checklist NR-17: altura de cadeira/mesa, apoio de pés, iluminação, ruído, pausas visuais/cognitivas; registro de inconformidades e plano de ação. 18
- CAT e acidentes: mantenha canal e protocolo para comunicação imediata de incidentes no ambiente remoto; avalie nexo e adote medidas de prevenção.
5) Inclusão e prioridades
- Preveja processo interno para priorizar PCD e responsáveis por crianças até 4 anos quando houver vagas/possibilidade de remoto, registrando as decisões. 19
6) Cláusulas-modelo (copie e ajuste)
- Atividades e regime: “O empregado prestará serviços em teletrabalho, executando as atividades descritas no Anexo I. O regime será por [jornada/produção].”
- Equipamentos e despesas: “A empresa [fornecerá/e reembolsará] os itens listados no Anexo II. O auxílio não possui natureza salarial.” 20
- Jornada/Desconexão: “Comunicações ocorrerão entre [horário], resguardados intervalos e descansos. Demandas fora desse período exigem autorização.”
- Saúde/Ergonomia: “O empregado seguirá o Guia NR-17, reportará desconfortos e permitirá vistoria remota quando necessário.” 21
- Reversão/Local: “A reversão de regime observará aviso mínimo de [X] dias e o disposto na Lei 14.442/22.” 22
Mensagem-chave do Bloco 2
Teletrabalho seguro = contrato detalhado + jornada bem definida (ou produção/tarefa) + política de reembolso e ergonomia executadas no dia a dia. O resto é gestão: medir, ajustar e registrar.
Cenários práticos, dúvidas críticas, playbook e checklist para operacionalizar sem passivo
Cenários que mais geram dúvidas (e como resolver)
- Híbrido com reuniões fixas 3x/semana: é teletrabalho; controle normal de jornada nos dias remotos e presenciais; defina horário-núcleo e política de mensagens fora do expediente. 23
- Remoto 100% por tarefa: contrato indica produção/tarefa, sem controle de horas; evite impor metas horárias que descaracterizem o modelo. 24
- Empregado mudou-se para outra cidade/país: ajuste contratual; custos de retorno não são do empregador se a mudança foi opção e isso estiver pactuado. 25
- PCD/filho pequeno e duas vagas remotas: registre o critério de prioridade e a compatibilidade da função com trabalho remoto. 26
- Acidente doméstico no expediente: receba a comunicação, avalie nexo (atividade/local/horário), emita CAT quando devido e aplique plano de prevenção (NR-17). 27
- Litígio de remoto “puro”: empregado ajuíza a ação no seu domicílio (onde prestou serviços). Considere a competência local. 28
FAQ relâmpago
1) Posso alternar remoto e presencial livremente?
Sim, desde que o contrato preveja essa dinâmica. A presença no escritório não tira a natureza de teletrabalho. 29
2) Preciso controlar a jornada no remoto?
Se o regime for por jornada, sim (ponto/app, logs, políticas). Apenas no modelo por produção/tarefa a CLT afasta o capítulo de duração do trabalho. 30
3) Quem paga internet, energia e cadeira?
O contrato define (art. 75-D). Boas práticas: auxílio fixo ou reembolso contra recibo; esclarecer que não é salário. 31
4) Pode teletrabalho fora do Brasil com contrato brasileiro?
Pode, observadas lei brasileira (como regra), fuso e questões fiscais/previdenciárias. Combine por escrito. 32
5) Há prioridade legal para quem?
Para PCD e para empregados com filhos/criança sob guarda até 4 anos, quando a atividade for compatível. 33
Playbook (RH/Jurídico em 10 passos)
- Escolha o regime: jornada vs. produção/tarefa.
- Minuta contratual com atividades, local, reembolso, dados e reversão. 34
- Política de jornada (ponto/app, desconexão, escalas híbridas). 35
- Ergonomia NR-17: guia, treinamento, check de posto. 36
- Ajuda de custo/reembolso com natureza indenizatória. 37
- LGPD e segurança: VPN, classificação da informação, acesso mínimo.
- Prioridades legais: fluxo para PCD e pais/responsáveis (até 4 anos). 38
- Teletrabalho cross-border: cláusulas de lei aplicável, foro, fuso e retorno. 39
- Governança: relatórios mensais de horas, reembolsos e ergonomia; KPIs de produtividade/saúde.
- Auditoria anual: revisão de contratos, políticas e ergonomia; reciclagem de treinamentos.
Checklist final (salve e use)
- Contrato/aditivo com atividades, local, jornada ou tarefa, reembolso e reversão. 40
- Política de ponto/desconexão ou, se por tarefa, vedação a metas horárias. 41
- Guia/registro de NR-17 e canal de ergonomia. 42
- Fluxo de prioridade (PCD e crianças até 4 anos). 43
- Cláusulas para teletrabalho internacional e retorno. 44
- Arquivamento de registros (ponto, reembolsos, treinamentos) por 5 anos.
Conclusão operacional
Teletrabalho bem feito combina base legal (contrato e políticas alinhadas à CLT/Lei 14.442), gestão de jornada coerente com o modelo escolhido, ergonomia viva e prioridades observadas. Assim, o remoto entrega produtividade sem passivo — e o home office vira vantagem competitiva, não risco.
